sexta-feira, 3 de março de 2017


Vasco, o Herói Assassino

 

                            Do livro de Hart já citado, p. 476, onde ele fala de Vasco da Gama (os portugueses e espanhóis sempre colocados por último, aliás), 86º da lista de 100, ele diz: “Seu comportamento nessa expedição foi absolutamente implacável. Ao largo da costa da Índia tomou um navio árabe que passava e, depois de retirar-lhe a carga, mas não os passageiros, queimou-o no mar. Todos a bordo – várias centenas de pessoas, inclusive mulheres e crianças – morreram”.

                            Não que os americanos, os ingleses e os povos europeus em geral fossem melhores. Não que os orientais, sejam chineses, japoneses ou outros fossem melhorem. Considerando tudo, listando detalhadamente todos os assassinatos, todas as atrocidades, todas as perversidades, todas as canalhices geo-historicamente praticadas, acho que os povos quase todos foram mais perversos que os portugueses. Se você começar a fazer o levantamento, provavelmente concluirá que os portugueses foram um dos povos mais compassivos.

                            Contudo, ainda será um dos mais assombrosos fatos que ao lado da coragem exigida pela projeção do heroísmo tenham os heróis essa capacidade de destroçar, de matar, de aleijar impiedosamente as almas e os corpos, na busca da realização de seus propósitos, acolhendo as ordens alheias como eixos das metas de enriquecimento, de fama, de glória – ao contrário dos santos e sábios, que estão acima deles e que, sistematicamente, apenas morrem, depois de atingido o estágio de santidade.

                            O que é que faz de um lado da figura a face heróica e do outro essa horripilante face feroz de Vasco de Gama, de Francisco Pizarro, de Hernán Cortez e de tantos outros? Assim, para nos lembrar nossa natureza falível e como nós mesmos poderíamos ter tido as mesmas atitudes, nas mesmas situações, devemos construir uma estátua de dupla face, de um lado rejeitando e de outro recebendo de braços abertos os venenos.

                            De um lado tão alto e do outro tão baixo e rastejante!

                            Vitória, quinta-feira, 03 de julho de 2003.

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