Exasperação Corporal
Além do ator Van
Damme, que disse ser seu corpo seu templo (razão pela qual podemos ver que ele
reza a seu corpo e não a Deus), podemos visualizar uma enormidade de gente que
vai a um restaurante como a um templo e venera vinhos e alimentos.
De épocas de
simplicidade corporal passamos a verdadeira alucinação sobre-afirmadora de tudo
que diz respeito ao corpo. Está certo que tudo é ciclo e à ausência de cores do
período vitoriano deveria suceder-se o contrário, a superafirmação delas (gosto
de cores, é tudo muito lindo mesmo), mas creio que estamos exagerando. Os
restaurantes fazem propaganda como se indo lá tivéssemos chegando ao paraíso.
As pessoas falam de receitas, de viagens e do que comeram lá, de bebedeiras
como se fosse uma epifania, uma revelação explosiva e súbita, um deslumbramento
capital. Eu bebia par ficar com os amigos; agora é o contrário: levam os amigos
para ficar com a bebida.
Que gente esquisita!
Por toda parte que
olhemos há superfixação nas superfícies, nos embrulhos das mercadorias, na
supervalorização das imagens, dos aspectos das coisas e das coisas mesmo, não
mais dos seres racionais que são o cristal da ponta da lança da Criação e sim
daquilo que as encobre e dos objetos que as servem. É a volta ao culto dos bezerros
de ouro, dos deuses de ouro. Não do que é leve, do que é espiritual e flutua,
mas do que é pesado e afunda. Caímos no materialismo mais abjeto e quase tudo
agora é veneração da coisa. Não se mora mais na casa, a casa é que mora nas
preocupações das pessoas. Não se usa mais o carro, é o carro que usa a pessoa
para perpetuar-se, obter continuidade.
Ai, que doideira.
Vitória,
quinta-feira, 23 de outubro de 2003.
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