O Ser de Duas Cabeças
Mais e mais fico
convencido de que o ser humano é um tipo de gênero com duas espécies, HOMEM e
MULHER, cuja soma faz o ser único homulher, que tem duas cabeças e em geral
dois corpos, isto é, dois corpomentes, portanto duas mentes, cujo ligeiro
deslocamento em termos de ótica de percepção do mundo é um poderoso instrumento
de sobrevivência, dando-lhe sobre-aptidão na luta pela solução mais apta dos
problemas que proporcionam futuro ou sobrevivência.
O Modelo da Caverna que
adotei depois e cuja origem está Desmond Morris, com seu O Macaco Nu, que é de 1967, nos diz de uma mulher coletora e de um
homem caçador, o que criou DUAS MENTES, duas formas notáveis de raciocinar. Fui
me conscientizando que isso, a vivência da mulher na caverna e suas
proximidades, a fez criar todo ou quase todo índice inicial de civilização.
Como as peles e outras interposições que nos protegem das agressões ambientais
e pessoais, a caverna constitui um SUPERÚTERO que nos abriga quando saímos do
útero materno.
As cavernas,
constituindo-se uma supercapa, criaram esses dois cérebros, a
inteligência-caçadora e a inteligência-coletora, a primeira do homem e a
segunda da mulher, como já coloquei. Interessante, sobretudo, é como se dá a
conversão do menino em homem, renunciando aos valores femininos e passando a
valorizar (apressadamente, digo, pois é preciso vencer o “tempo perdido”). As
meninas não fazem essa conversão e seriam porisso menos interessantes, se
outras coisas não estivessem em curso, pois, lembre-se, é uma grande renúncia,
a da rejeição da presença dos garotos, significando uma retração, um
encolhimento que precisa ser compensado, além do quê logo os antigos amigos
devem ser tratados como inimigos e potenciais predadores, que colocam ovos (os
espermatozóides) que vão crescer no corpo da hospedeira. Por outro lado, os meninos
devem também renunciar, porém são compensados pelo que acreditam ser (e é de
fato) um mundo novo de audácias e arrojos. Como já disse, os meninos devem
passar da LÍNGUA-DAS-MULHERES para a LÍNGUA DOS HOMENS, ao passo que as meninas
nunca adquirem a versão masculina – aqui estamos pensando nos tempos
primitivos.
Essa inteligência
feminina, como já visto, é de um tipo diferente da do homem, o que provocou
sempre através da geo-história essa “guerra dos sexos” que é na realidade
guerra de percepções diferentes, é guerra de inteligências distintas. Entrementes,
ter sido possível a convivência, ainda que baseada nas pulsões incontroláveis
dos hormônios, é o dado significativo.
Como essas duas
inteligências aprenderam a conviver, se os objetos de que tratavam e, portanto,
as psicologias que montaram eram diversas? Se a mulher vê o universo de um
jeito e o homem de outro como aprenderam a conviver e a se suportarem, sendo no
restante estrangeiros racionais um para o outro? São irmãos siameses colados
pelo corpo e separados pela cabeça.
O nome da reunião é,
como sabemos, família = casamento, o que foi pouco investigado, em face da
importância da instituição. O casamento ou família é a sociedade mínima do par
fundamental através da qual podem ser trocadas ou co-respondidas aquelas visões
ligeiramente separadas. Essa sociedade tão surpreendente, cujo distanciamento é
mínimo entre os animais, resguardou a humanidade de sofrimentos maiores, porque
o que um não via a outra proporcionava, e vice-versa.
Contudo, como são,
terminalmente, essas duas cabeças? O que elas vêem, o que enxergam, quão
diferentes são?
Vitória, sábado, 01
de novembro de 2003.
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