quinta-feira, 30 de março de 2017


O Assassinato do Suicida

 

                            No livro de Francisco Daudt da Veiga, O Aprendiz de Liberdade, São Paulo, Cia. das Letras, 2000, p. 143, há esta passagem: “(...) e só o superego nos ameaça o bastante para que a gente prefira se matar! ”

                            Bom, é necessário investigar essa afirmação sob a ótica do modelo, que é de pares polares opostos/complementares, de pronto superego e não-superego (que se dividiria então em dois: ego e id, que formam outro par polar). O superego é tudo que está fora. Dos AMBIENTES (municípios/cidades, estados, nações e mundo) e das PESSOAS (indivíduos, famílias, grupos e empresas) só o indivíduo está dentro, é não-inimigo por definição (mas mesmo assim sofre paranóias e demências que colocam sua mente contra seu corpo e, conseqüentemente, contra todo ele, dado que se o indivíduo se mata ele mata tanto o corpo quanto a mente – ambos param de funcionar ao mesmo tempo).

                            Assim, a favor estão 1/8 - desde quando estávamos quase sozinhos há milhões de anos atrás, ou éramos poucos, há 50 mil anos, quando apareceu nossa espécie - e contra 7/8, na presente situação de evolução. A pressão desses 7/8 de antiliberdade relativa (pois é antiprisão também, dado que amplia nossa liberdade incomensuravelmente) é tremenda e se a pessoa mergulha naquilo que há três décadas ou mais venho chamando de POÇO DE IMPROBABILIDADES (quando se afigura improvável algum caminho) e mais fundo no POÇO DE IMPOSSIBILIDADES (quanto TODOS se afiguram improváveis), então ela está caminhando para o suicídio, o que poderia ser medido por graduação daquele caminho.

                            Daí que o suicida é seu próprio executor 1/8 e é assassinado 7/8. Contudo, devemos levar em conta que o exterior está próximo de nós, ou seja, está introjetado, só uma fração, e eu tendo a acreditar que haja soma zero 50/50 entre interior e exterior, mesmo considerando a presença racionalizada do exterior, que muda o Gerador de Autoprogramas, GAP, para torná-lo circuito cada vez mais fechado.

                            Devemos, então, ver que os ambientes e as outras pessoas matam o suicida, fornecendo-lhe motivos por vezes imperiosos.

                            Se os ambientes fornecem esses motivos, são co-autores, e podemos dizer que os superegos ambientais e os superegos pessoais são tanto mais culpados quanto relativamente à população geral os suicidas sejam mais numerosos. Deve haver uma lista de países, de estados ou províncias, de municípios/cidades que coloca alguém em primeiro, digamos a Noruega, que deve porisso se a nação mais restritiva, embora não pareça, pois há restrição POR PRESENÇA e restrição POR AUSÊNCIA, quer dizer, devido à falta de amor e lig/ação, ato permanente de ligar. Diz-se desses lugares que são “frios”, distantes, não são próximos e “quentes” como os tropicais e mediterrâneos e latinos.

                            Enfim, que ambientes e pessoas matam os suicidas?

                            Quem pula da ponte ou do prédio, quem toma veneno, quem se joga diante do trem, quem corta os pulsos ou comete qualquer das modalidades corriqueiras ou mais elaboradas de suicídio é o suicida mesmo, o indivíduo na ponta da ação, mas há um agente remoto geral 7/8.

                            Vai daí que o Daudt Veiga não esteja totalmente certo: o superego empurra-nos 7/8 ou 50 %, mas o suicida vai por conta própria 1/8 ou 50 %. Assim, o tratamento para cura deve ser tanto dos ambientes e das pessoas outras quanto do indivíduo.

                            Vitória, domingo, 02 de novembro de 2003.

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