A Voz da Casa
Desde quando percebi no
Modelo da Caverna que homens e mulheres constituem duas espécies
opostas/complementares dentro da espécie única homulher, vi que há duas línguas
ou pelo menos dois falares da mesma língua humana: a Língua da Mulher e a
Língua do Homem. É da lógica que mulheres falem mais, com mais abundância de
substantivos e de tudo, porque sua experiência foi inicialmente maior e mais
variada, de espaço e de plano da coleta, que a masculina, de linha e de ponto
da caça. Assim, embora ambos tenham vozes, propriamente denominaremos Voz, em
maiúscula, a dominância, que é neste setor da mulher.
Ora, sempre me intrigou
que nos descasamentos haja estranheza quanto ao homem que fica só, mas não
quanto à mulher. Uma parte da estranheza vem de todos começarem a pensar se o
fulano está se tornando veado, homossexual, ao passo que outra parte remanescia
inexplicada. Agora vejo que na ausência de mulher as outras mulheres deixam de
ter acesso ao lar, não podem conversar com as outras cavernas, sentem-se cegas,
inadmitidas a uma seção do ser humano, a masculina.
Miguel Pinto Lobo era um
colega fiscal que dizia: “segredo não se conta a homem casado/ ele conta para a
mulher/ que espalha para o povoado”. Ou seja, contou à mulher todos vão saber, é
uma COMUNIDADE DE INFORMAÇÕES. Ter empregada doméstica, raciocinamos Gabriel e
eu, é ter um JORNAL DAS EMPREGADAS, porque tudo percorre o coletivo, todos
ficam sabendo de nossas coisas, de tudo mesmo que chegar ao ouvido dela.
Agora penso que os
homens que por qualquer motivo não se casam de novo ofendem o correio feminino,
porque ficam retirados das fofocas, do manuseio da vida alheia, abstraem-se do
conhecimento público – e constituem, porisso mesmo, uma ameaça a todas e cada
uma, porque inacessíveis e incontroláveis. Elas acabam passando isso aos
maridos e aos filhos, o que causa tremendas dificuldades de relacionamento.
Vejo agora que re-casar
é apenas manter a sanidade social.
Vitória, segunda-feira,
27 de outubro de 2003.
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