O Acúmulo do Mal
O
mal que fazemos é como acumular numa represa de hidrelétrica, atrás da qual vai
se juntando o mal em milhões de metros cúbicos. Cada um faz um pouquinho. Uma
palavra displicente com um filho, aspereza com um colega de trabalho, pessoas
que são abandonadas pelos governantes, roubos, furtos, juros, telefones
grampeados, drogas, álcool, sexo exposto no TV às crianças, um milhão de modos
de fabricar a dissolução.
Depois, nós
reclamamos.
Todos aqueles
infinitos pequenos gestos, aos quais pouca ou nenhuma importância damos.
O certo seria a
gente agir sempre com o coração puro, pensando em fazer o bem a outrem, como os
santos, e mesmo assim haveria uma carga residual, pois não somos
verdadeiramente isentos. No entanto essa carga mínima seria tão pequena que a
soma contínua de mal chegaria a ser o Mal, mal absoluto, muitos séculos ou
milênios depois. Porém, do jeito que a humanidade está acumulando tão rápido,
poucas décadas já levam ao rompimento da represa.
Então as pessoas e
ambientes, as pessoambientes, os governempresas políticadministrativos vão
providenciando remendos aqui e acolá, de modo a aumentar a base da represa, sua
resistência ao extravasamento. Quanto tempo isso pode durar, se o peso
acrescentado acaba por ser demais para a base?
Vem um iluminado ou
muitos e muitos santos que conseguem com seu sacrifício esvaziar a represa, às
vezes até quase o chão, para logo em seguida ela ser cheia de novo pelas
perversidades humanas. Lá vai a carga extraordinária da humanidade sendo entupida
até a borda.
Quem são os que,
tipicamente, enchem e esvaziam?
Seria preciso
estudar, em teses de mestrado e doutorado, cientificamente. Há o preenchimento
passivo, por descuido, por desleixo, por apatia, e o enchimento ativo, o mal
orientado como tal. Há o mal que é pago e há o gratuito, há o infantil e o
adulto, o masculino e o feminino, há todo tipo de mal.
Se o mal só
beneficia a quem o pratica ou o teoriza, o custo dele é coletivo, é geral, é
para todo o conjunto dos seres humanos, tanto para pessoas (indivíduos,
famílias, grupos e empresas) quanto para os ambientes (municípios/cidades,
estados, nações e mundo).
Os iluminados
forneceram regras de vida, listas de bem-aventuranças, de verdades nobres, de
modos e posturas adequadas à mente e ao corpo, que nós não seguimos. Está
chegando um tempo em que não mais poderemos nos esquivar, porquanto o poder
dado a todos e a cada um excedeu a sustentação autônoma da vida. Pode-se, com
uma praga biológica sintética, destruir toda a existência, como antes as bombas
nucleares ameaçaram fazê-lo. A diferença é que para fazer isso com elas, antes,
era preciso toda uma coletividade trabalhando, feitos os EUA e a URSS, ao passo
que agora qualquer bio-arquiengenheiro pode, com a recombinação genética, criar
uma nova forma letal de vírus em casa mesmo, comprando os materiais pelos
Correios.
Havendo muito mais
chance de degeneração mental de uns e outros, o perigo se tornou intolerável.
Se devemos fazer algo para pacificar definitivamente a humanidade, é agoraqui
que devemos fazê-lo.
Vitória, domingo, 14
de julho de 2002.
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