A Língua como Alma
Nietszche
disse que a língua é a alma de uma nação, do que podemos derivar muitas coisas.
Por
exemplo, se é alma nacional é alma de cada estado, cada município/cidade, cada
empresa, cada grupo, cada família e cada indivíduo. É alma de aglomerados
urbanos gigantes, como a Grande São Paulo, ou de minúsculas cidades, como Rio
Bananal, ES - e que grandes distâncias perceptivas mais separam que unem tais
cidades, opostas antes que complementares!
É a mesma
alma de negros e brancos, de mulheres e homens, de velhos e moços, de ricos e
pobres. Não obstante ela não é com o mesmo favor composta dos vocábulos de
origem negra-africana que de origem branca-européia. Então, para começar, é
alma distorcida, ferida das impropriedades da segregação. Da segregação geral:
das raças, das idades, dos sexos, das riquezas.
Se
é alma é alma humana, de psicologia humana, comportando figuras ou psicanálises
humanas, objetivos ou psico-sínteses humanos, produções ou economias humanas,
organizações ou sociologias humanas, espaçotempos ou geo-histórias humanas.
Sendo tal, comporta as doenças ou deslocações-de-média humanas. Vê como a
humanidade vê, sente como a humanidade sente, pensa como a humanidade pensa. É
humana para os erros e os acertos. Não vê fora da janela humana de visão, não
percebe fora do quadro humano de percepção. Exclui coisas, que se tornam então
imperceptíveis. Na Economia particiona-se como alma agropecuária/extrativista,
como alma industrial, como alma comercial, como alma de serviços, como alma
bancária.
Por
ser alma geo-histórica, evolui, revolui, re-evolui; avança, dá saltos,
re-avança. Segue os trâmites geo-históricos: foi alma ou língua escravista, foi
alma ou língua feudalista, é alma ou língua de terceira onda capitalista.
Possui
dimensões que o Conhecimento lhe empresta: alma mágica/artística, alma
teológica/religiosa, alma filosófica/ideológica, alma científica/técnica e alma
matemática.
É
alma das 6,5 mil profissões. Da costureira, do varredor de rua, do engenheiro
mecatrônico, do escritor.
É
alma com 215 mil retalhos-palavras que constam no Houaiss, servindo desde a
mais fina elaboração até a mais rude delas, dentro do mesmo corpomente
nacional. É alma maltratada pela sobreposição de vocábulos ou almas
estrangeiras, dominada, diminuída, enxovalhada. É alma retalhada, como uma
alma-de-retalhos. É alma nobre em potência e vil na realidade, como a
portuguesa no Brasil. É alma suja, enegrecida dos desleixos, abandonada, de
gente que se julga inferior. Assume as colorações que a força ou fraqueza dos
viventes do tempolugar lhe emprestam. No caso brasileiro é alma chinfrim, de
acovardados.
Vitória,
quinta-feira, 03 de outubro de 2002.
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