A Língua Mais Apta
Se,
como vimos em A Língua como Alma, neste livro, a língua de cada nação é
sua alma, no dizer de Nietszche, ENTÃO, como tudo evolui, se segue que a língua
ou alma nacional também evolui, buscando deixar descendência no futuro - por assim
dizer ela coloca seus ovos no presente para que eles sejam levados e
depositados no futuro. Várias línguas morreram, foram incompetentes na luta
pela sobrevivência da língua mais apta.
Na
luta pela sobrevivência não tiveram competência para levar-se ao futuro.
Deixaram seus esqueletos à margem da geo-história e nem sequer podemos
visitá-las em museus.
Que
tipo de luta é essa?
Não
é natural, biológica/p.2, é psicológica/p.2, trava-se artificialmente dentro
das pessoas que são portadoras dos vetores-palavras. O ciclo de reprodução é o
da vida humana, cada uma delas, e o que lhe dá sustentação é a socioeconomia
das pessoas (indivíduos, famílias, grupos, empresas) e dos ambientes
(municípios/cidades, estados, nações e mundos). No nosso caso o que dá sustentação
à língua ou alma portuguesa-brasileira é o Brasil e seus subconjuntos.
Assim
sendo, a língua portuguesa-brasileira é tão forte quanto a S/E o é no Brasil e
sobreviverá enquanto a S/E brasileira o fizer. Se a S/E brasileira se deixar
dominar e subjugar, o mesmo estará acontecendo com a língua portuguesa no
Brasil. Por quantas evoluções passou? Quantos saltos revolucionários deu?
Quanto diferenciou da língua portuguesa em Portugal e no resto do mundo?
Obviamente, com as incorporações das cores africana, indígena e até asiática
ela mudou, não é mais “portuguesa pura”, ao contrário do que Houaiss dizia.
A
língua também adquire as colorações regionais, de inserção continental, com os
interesses locais e mundiais do país. Mas, embora vindo de uma raiz latina, a
fala brasileira agregou feições africanas, americanas de origem, asiáticas, ou
o fará no futuro, quanto termine ou diminua a segregação a tal ponto.
Enquanto
alguém faz sua casa, compra seu carro, luta sua vida, sua língua-alma faz,
compra, luta batalha diária que nunca cessa e agora se dá de fora para dentro e
de dentro para fora em 170 milhões de habitantes-frentes de luta, no Brasil.
Luta contra o dominante externo e o seu representante postiço interno, o
subjugado convencido de que as almas estrangeiras são melhores.
Há
primeiras-línguas, segundas-línguas, terceiras-línguas e quartas-línguas, como
os mundos. Há almas apuradíssimas, com as mais avançadas tecnociências, e há
almas atrasadíssimas, no limiar do desaparecimento.
Há
gente que faz a profilaxia de sua alma, que cuida diariamente dela, que a
venera, que a eleva a patamares de transcendência, e há gente que a trata com o
maior descaso, desprezo, desdém, desrespeito, desconsideração. Há gente que
vibra com sua alma, ao passo que há gente que se envergonha dela. Como base
nessas células-pessoas e nessas células-ambientes a língua-alma vai prosperando
ou definhando, até que nalguma linha de tempo estão apenas as línguas ou almas
que sobreviveram aos desacertos dos falantes, de sua visão grandiosa ou
mesquinha de vida.
Como
disse Fernando Pessoa, tudo é grande quando a alma não é pequena; ou, ao
contrário, tudo é pequeno quando a alma não é grande. Trocando alma por língua
ou nação ou povelite, podemos fazer outras leituras. E daí entender que, quando
a nação não é grande as chances de sua língua ou alma sobreviver são pequenas.
Vitória,
quinta-feira, 03 de outubro de 2002.
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