Filosofia Brasileira
Às vezes alguns perguntam: para
quê serve a filosofia? O que fazer com a filosofia? Fico espantado demais da
conta, como diz o povo da minha terra. Pois se o Houaiss se gaba de oferecer
215 mil palavras à meditação de cada um! Assim como os outros modos de
conhecimento, a Filosofia pode se dedicar a estudar CADA UMA DAS PALAVRAS, não
só superficialmente como profundamente, terminalmente. A filosofia serve para
investigar. O que posso fazer com a filosofia é investigar para saber mais e
melhor.
Como
uma determinada palavra aparece quando falada por pessoas (indivíduos,
famílias, grupos e empresas) nos ambientes (municípios/cidades, estados, nações
e mundos)? Como dedicação é lida nas regiões brasileiras, ou nos países
da América Latina? E apego? Qual é a razão de a imprensa brasileira
escrever “duas vezes mais” (três vezes tanto quanto) quando quer dizer o dobro?
Porque escreve “piso mínimo” e “teto máximo”, e comete tantos vícios de
linguagem? Por quê há essa rejeição da língua portuguesa, com tanta veneração
da língua inglesa (como antes foi da francesa, da romana, etc.)? O que
significa o “jeitinho brasileiro”? Alguns já tentaram interpretar, mas foi
insuficiente. Por quê tentaram passar (Sérgio Buarque de Holanda) essa história
de “brasileiro é povo cordial”? Porque os políticos e governantes não se
convencem da utilidade de prestar bons serviços, abandonando de vez a prática
disseminadíssima do “caixinha”? Por quê tradicionalmente os inventores não
foram estimulados no Brasil? Há tantas perguntas a serem feitas!
Por
quê a filosofia brasileira demorou tanto a se assumir enquanto filosofia e mais
ainda como brasileira, de interesse local descolado ou independente dos
estrangeirismos? Por quê a robótica não pode ser instalada para produzir coisas
mestiças? Por quê a mídia não desenha programas de interesse de negros, de
índios, de asiáticos – só de brancos europeus? Por quê não há programas de TV
mirando os países da América do Sul e da América Latina, ou sobre Portugal e os
países de língua portuguesa, sobre os países latinos? Vê, quantos assuntos
pulsantes, vibrantes, entusiasmantes?
Se
a filosofia brasileira é deprimida, debilitada, aviltada, degradada não será
por falta de assunto. É porque, ao copiar os estrangeiros, encontra-os sempre
na frente, POR DEFINIÇÃO. Pois, se é cópia, que originalidade pode haver nisso?
Se vamos falar do Ser e do Tempo, Sartre já falou. Quanto podemos acrescentar
repisando os assuntos que os europeus já abordam há dois mil e quinhentos anos?
Nosso
caminho deve ser outro.
A
Filosofia não é uma lista de pensamentos permitidos, é GOSTAR-DE-SABER. De
saber tudo, e cada coisa em particular. Como a figura pensante, a pessoa, está
no Brasil, é com o ar, a água, a terra/solo, o fogo/energia, a Vida e a Vida-racional
daqui que ela lida. O ar não é universal senão na aparência; ele tem nuances,
pequenas diferenças que o fazem brasileiro, capixaba, de Vitória.
Se
eu não assumir minha própria bandeira, minha própria língua, o meu ser e estar,
quem o fará por mim? Se eu não cuidar de raciocinar sobre minhas condições
locais de vida não será um austríaco que o fará. Então, filosofia brasileira
deve ser GOSTAR-DE-SABER sobre o Brasil. E pode acreditar, meu caro, minha
cara, quanto a isso o assunto é verdadeiramente inesgotável.
Vitória, sexta-feira, 04 de outubro de
2002.
Nenhum comentário:
Postar um comentário