quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017


O Veneno de Chicago

 

                            Fomos, meu filho Gabriel e eu, ver Chicago, o filme que finalmente ganhou cinco ou seis estatuetas do Oscar, inclusive de melhor filme, que é noir, é negro, é escuro, é tangivelmente carregado na falta proposital de cores, exceto na sobreafirmação do feminino.

                            Por sinal, coincidentemente, a figura de Catarina Zeta-Jones foi tirada da capa de uma revista em quadrinhos, American Flagg! (Bandeira Americana), Reuben e os Piratas, número 1, “estes são os homens da lei”, de Howard Chaykin, 1985 nos EUA, dezembro de 1990 no Brasil. “Cagada e cuspida”, como diz o povo, ou seja, cravada e esculpida. Cabelo, roupa íntima, o corpo mais cheio, tipo gostosona, tudo mesmo.

                            Em si mesmo o filme é um lamento do Cinema americano, um pedido de socorro. Pois é sabido que os cineastas, os atores e as atrizes não morrem de amores pelos advogados de lá (“que são doze advogados no fundo do mar? ”, “um bom começo”), mas no filme diz-se abertamente que a Lei nos EUA não vale mais nada, basta um grande circo nos tribunais para tirar de lá impunemente qualquer um, desde que se possa pagar. Ora, isso é o fim do Judiciário americano, que é o último bastião do Estado (veja o artigo deste Livro 27, Os Três Poderes), desde quando eles zombam do Legislativo e do Judiciário faz tempo. Claro, o povo demorará a acordar, sem falar que as elites estão desde faz muito compromissadas com esse colapso institucional – foram elas que o desejaram, planejaram e executaram.

                            Então os mágicos e os artistas, sempre mais sensíveis, estão se lamentando primeiro, porque vêem mais longe, que vem vindo desde o futuro a falência total, a demência absoluta. Então, eles denunciam, através de um filme que, à primeira vista, tinha tudo para ser desequilibrando, até a entrada de Richard Gere, que é a grande tônica (ele não é especialmente brilhante ali, mas seu personagem diz tudo que é relevante – e, afinal de contas, pouco talento não basta para compor o personagem) da fita.

                            O resultado é chocante anúncio DE DENTRO: os EUA entraram na fase final da bancarrota cultural, na mesma semana, conforme Gabriel me mostrou, em que a Veja apresenta os Estados Unidos como “mastodôntica” cultura ou nação. Deveriam ter assistido a película.

                            Vitória, terça-feira, 25 de março de 2003.

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