A Parte Mais
Desagradável
Em Asimov, p. 244,
ele diz:
“Mesmo se os colonos
quisessem deixar os pontos de liberação ou mesmo se estivessem na Lua e
quisessem deixá-la, não haveria necessidade do forte impulso inicial de
aceleração que é indispensável para lançar um foguete da superfície da Terra,
submetida a grande força gravitacional. Apenas isso já remove de imediato a
parte mais desagradável da viagem espacial”.
A parte mais
desagradável não é essa. Embora nos primitivos lançadores de hoje o grande
empuxo signifique a pressão de retaguarda da queima de milhares de quilogramas
de combustível líquido, com a possível morte em caso de falha (o que não
haveria quase nunca no espaço vazio e seria muito menos significativo na Lua ou
em Marte), a parte mais desagradável das viagens no vazio é a extrema solidão,
as pessoas não podendo se tocar (como fazemos isso o tempo todo na Terra, não
valorizamos, assim como não o fazemos com o ar puro e sem odor, exceto quando
ele passa a feder, perto de um mangue), só tendo acesso a conversas metálicas,
transmitidas por rádio e reconvertidas (ouvir o telefone é fácil, porque pouco
falamos nele, mas pense em ouvir sempre, lembrando-se ainda de como é a VIVA
VOZ para a qual não ligamos agora, o chiado fonográfico), com o perigo
constante de o traje ser furado por micrometeoritos, ou a penetração constante
no cérebro por partículas cósmicas perfurantes, a chance de vômito, ou qualquer
dos inúmeros problemas que podem ocorrer.
De fato, passaríamos
a sentir saudade de nossos problemas terrestres, dos quais pensamos que
queremos nos livrar. Como disse um jardineiro japonês num filme: “às vezes o
que você já tem é melhor do que o que você quer ter”.
Projetando de agora
não vemos o que já temos. Quando uma pessoa que reclama de seu próprio país vai
viver no estrangeiro as coisas miudinhas, que ele detestava ou às quais não
dava atenção e ridicularizava, acabam por tornar-se ícones para ela, objetos de
desejo.
Como diz o povo, só
que tem o calo sabe onde ele dói.
Vitória, domingo, 22
de junho de 2003.
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