quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017


A Morte do Meu Pai

 

                            Um dos nossos amigos diz que é personalismo falar de nossas coisas nos escritos, do que discordo, me parece mais uma lição de vida que tomei em primeira mão.

                            Meu pai morreu em 1978, 13 de outubro.

                            Dias antes caiu do telhado da casa de praia em Conceição da Barra, ES, sofreu uma concussão na cabeça, o sangue se espalhou, ele mergulhou na inconsciência. Eu o tinha na mais alta conta, pois caminhoneiro que era na minha infância, viajava, ficava muitos dias fora, voltava com a barba por fazer, me afagava e passava-a em mim, o que provocava cócegas. Essa intimidade sempre foi profundamente gratificante e eu me sentia próximo demais dele. Um dia, no mês de setembro anterior brigamos lá mesmo no balneário, eu já tinha 24 anos e tinha fracassado em tudo que as pessoas prezavam.

                            Ficou preso ao leito hospitalar em Linhares um tempão, no Hospital Beneficente Rio Doce, até os médicos idiotas recomendarem a remoção a Vitória, onde foi operado para a retirada do sangue no Hospital da Vila Rubim, sofrendo uma parada cardíaca. Em minha mente eu desejei atear fogo no local. Lá em Linhares demoraram demais para se renderem à sua incapacidade de tratá-lo, quando o cérebro dele já estava comprometido, e aqui foram de uma imperícia a toda prova, o que me fez desconfiar dos médicos e da Medicina para sempre. Bem sei que salva vidas e é conforto para tantas famílias, mas fica a lição de que devemos manter os médicos e a Medicina sob rédeas curtíssimas, de extraordinária exigência, pois eles e ela mexem com as nossas almas. Seria preciso criar um Fórum Mundial de Imperícia Médica, contando todos os casos, dos mais brandos aos mais estarrecedores. Não se trata do meu pai, trata-se do Pai geral, em maiúscula os pais de todos os seres humanos.

                            Vitória, domingo, 02 de março de 2003.

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