A Liberdade Diminuída
Em seu livro, Água
(como o uso deste precioso recurso natural poderá acarretar a mais séria crise
do século XXI), Rio de Janeiro, Ediouro, 2002, Marc de Villiers diz, página 32:
“E talvez a questão mais difícil de todas: em todo ecossistema, além de um
ponto crítico dentro de um espaço finito, a
liberdade diminui à medida que os números crescem. Isto é tão
verdadeiro para os seres humanos em relação aos espaços finitos do ecossistema
planetário quanto para os elefantes do Okavango ou as moléculas de gás em um
frasco vedado”, grifo e negrito meus.
Antes do modelo a
gente aceitaria isso como: 1) afirmação do autor, 2) declaração de autoridade,
3) verdade presumida.
O modelo não
secundou a dúvida metódica cartesiana, porque faz restrições a ela, mas
rejeitou como inadequadas as afirmações unilaterais, por a soma é zero, quer
dizer, 50/50. Assim, diz ele, A LIBERDADE TANTO DIMINUI QUANTO AUMENTA À MEDIDA
QUE OS NÚMEROS CRESCEM.
Ela diminui PORQUE
um número maior de pessoas, PARA OS MESMOS RECURSOS, conduzirá ao estreitamento
do uso potencial dos recursos reais, quer dizer, sua transformação em riqueza
unilateral, pessoal (indivíduos, famílias, grupos e empresas).
Ela aumenta PORQUE
esse número acrescido traz maior conhecimento, maior e melhor aproveitamento
dos recursos atuais e descobertas de outros, mais oportunidades, dilatação do
SER e de sua rede de apoios ou amparos. Não somos unilateralmente menos livres
agora que temos seis bilhões de pessoas, do que quando éramos 100 milhões, há
dois mil anos. Quantas coisas estão disponíveis no presente tempespaço que não
estavam há 20 séculos?
Mas, de fato, ela
diminui PORQUE estamos todos mais apertados, não podemos sair correndo pelos
campos, já que tudo está cercado pela idéia capitalista de propriedade,
atributo do ser-burguês, domínio de classe, conveniência da exploração,
predicado dos terra-tenentes, etc.
Contudo, ela aumenta
PORQUE, desse jeito organizados, podemos multiplicar nossas forças e
capacidades, colecionando objetos dos quais nunca saberíamos, com conhecimento
mais baixo e menos gente.
Logo, o modelo vê
com extrema desconfiança esse tipo de declaração. E pergunta: a quem interessa
tal afirmativa? A Psicologia refaz a pergunta em vários índices: 1) a quais
figuras (pessoais, como vistas, e ambientais: municípios/cidades, estados,
nações e mundo) interessam estas postulações?; 2) quais os objetivos por trás
delas?; 3) a quais economias/produções elas atendem preferencialmente?; 4) que
sociologias/organizações as estão fazendo?; 5) que geo-história ou espaço
tempo, ou seja, que dominância políticadministrativa a torna imperativa?
Veja que antes os
países ricos não a faziam e foi um avanço considerável começarem a ver o
perigo, através do movimento ecológico, na realidade de sustentação
sócio-econômica.
Como se sabe, esse é
o neo-malthusianismo, a sobreafirmação de Malthus (economista e demógrafo
britânico, 1766-1834, 68 anos entre datas), o capitão das forças antipopulares,
de todos os que querem o seu pirão primeiro.
É
lógico que é preocupante, é evidente que devemos fazer alguma coisa para deter
a destruição. A questão central é: o quê? Ela se dividiria, democraticamente,
numa consulta geral, universal, de todos os elementos de psicologia, ou seja,
todas as pessoambientes, e não apenas aos dominantes de agora, os países
centrais, ditos pós-industriais.
Se disserem só um
lado da sentença (“a liberdade diminui”), então estão servindo a um só lado da
humanidade, no caso os que acham que mais gente significa redução da liberdade.
Liberdade de quem (figuras)?
Liberdade para quê (objetivos)?
Liberdade com quê
(economia/produção)? Liberdade como
(sociologia/organização)? Liberdade quando
e onde (espaçotempo ou geo-história, ou dominação políticadministrativa ou
governempresariado)?
O quê? Eis a
pergunta fundamental.
Não podemos aceitar
as posições dos escritores do primeiro mundo como se fossem o supra-sumo da
sabedoria.
Elas atendem,
evidente e cruelmente, às suas necessidades, conscientes ou inconscientes.
Isso nem diz
respeito à legítima preocupação do autor, e à sua felicidade de fazer esse
apontamento crucial. Diz respeito à moralidade humana, de não usar dois pesos e
duas medidas. Quando interessava aos centrais crescer, era plenamente
justificável fazê-lo. Quando deixou de interessar, criminosos eram os outros.
Claro que andar para frente, na menor distância entre dois pontos, é
importantíssimo até que se chegue à borda do precipício. Neste instante mais do
mesmo levaria ao desastre e à morte.
Contudo, devemos ter
cuidado.
Como disseram eles,
o preço da liberdade é a eterna vigilância.
Vitória,
terça-feira, 21 de maio de 2002.
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