É um lugar-comum
dizer que vivemos tempos em que transformações dos mais variados tipos
ocorrem em grande velocidade. A globalização e a revolução tecnológica nos
ensinaram isso na prática. O mundo permanentemente conectado – os posts
políticos no Facebook, o poder de ferramentas como WhatsApp, as crises de
mercado interligadas, os 140 caracteres sobre qualquer coisa no Twitter, as
notícias, minuto a minuto, e nossas fotos no Instagram – permite que, em
certo sentido, estejamos em toda parte o tempo todo. São mudanças que
começaram nos grandes mapas da política e que vieram parar na palma de nossas
mãos, em nossos smartphones e tabletes. Do desaparecimento de imponentes
impérios políticos ao surgimento de tremendas oportunidades de
desenvolvimento, tudo pode ocorrer em poucos meses hoje em dia. A velha
sensação de que os grandes marcos históricos eram produto de longos e
demorados processos políticos é hoje uma simples lembrança do passado: as
novidades não esperam mais para acontecer; sua hora é agora.
Eu sei disso. O mundo dos negócios exige que todos nós
saibamos disso. Simplesmente abrir um jornal ou acompanhar a educação de
nossos filhos nos faz saber disso. E mesmo assim, sou obrigado a confessar
meu espanto com uma transformação que se deu de modo tão intenso e tão veloz
que ninguém previu: a transformação que o Brasil viveu desde outubro de 2014
até maio de 2016. Foram pouco mais de 18 meses, é verdade, mas o fato é que
nesses três semestres o Brasil passou por mudanças tão impactantes que nossas
opiniões e impressões anteriores acerca da sociedade em que vivemos ficaram
obsoletas. Em grande medida, penso eu, isso se deve justamente ao fato de que
essas mudanças partiram da sociedade e de algumas poucas instituições
prestigiadas e apoiadas pela sociedade.
Foi assim que uma investigação da Polícia Federal, iniciada em
Curitiba, tornou-se um marco das aspirações de um novo Brasil. Foi assim que
instituições públicas que, em geral, não tinham nenhum apelo midiático e
popular se consolidaram como razões de orgulho para os brasileiros. Foi assim
que um movimento apartidário e nascido longe dos berços da política
tradicional brasileira – o Vem Pra Rua – ganhou as ruas do país, com milhões
de cidadãos de todas as classes, de todas as idades.
Talvez minha surpresa com tudo o que aconteceu nesse período
seja partilhada pelos leitores desta análise, que é também um depoimento.
Talvez não. Independentemente disso, tenho certeza de que muitos se
reconhecerão nas ilusões e desilusões, nas convicções e nas frustrações que relato
neste texto. Elas são importantes para entendermos o que aconteceu conosco –
e também o que ainda está por vir.
Origens: a desilusão é o limite
O Brasil não é para amadores”, segundo uma frase famosa. É
verdade. Aquelas dificuldades todas que vemos na política (“por que aprovaram
uma lei absurda como essa? ”, “como é que aceitam que essas práticas ilegais
sejam corriqueiras?”), os entraves todos que enfrentamos para fazer negócios
(a burocracia, a irracionalidade e a falta de incentivo) e a sensação permanente
de que as mudanças de que necessitamos não chegam nunca comprovam, ao menos
em parte, a verdade que vai contida naquela frase. Mas, como todos os
brasileiros sabem, não é apenas na política e no governo, nas leis e no
mercado de trabalho, que sentimos esse cansaço do inaceitável, essa desilusão
das coisas como elas são. Para mim, como para milhares de outros cidadãos, é
no nosso dia a dia, na nossa vida cotidiana, mesmo, que o cansaço vira
desilusão. E a desilusão é uma espécie de limite.
Afinal, quando percebemos que nossas vidas precisam ser
vividas com a sensação de permanente perigo, cercamo-nos de muros cada vez
mais altos, aumentamos as tropas de seguranças privadas que nos protegem
(quando temos a sorte de poder pagar por isso) e achamos, por algum tempo,
que isso é “normal”. Quando não ficamos tranquilos com a ideia de nossos
filhos poderem ir à escola ou a qualquer tipo de local público em segurança,
usando serviços de transporte público ou simplesmente caminhando pelas ruas
em que vivem, passamos a achar normal não termos direito a isso. Talvez tenha
sido assim que, pouco a pouco, acabamos achando normal as gritantes
diferenças sociais no nosso país. Talvez tenha sido assim que, pouco a pouco,
ficamos indiferentes às grandes injustiças que testemunhamos dia após dia,
ano após ano, em um país tão cheio de possibilidades. Talvez, enfim, tenha
sido assim que nos acostumamos – os que tiveram sorte – a achar que a solução
era a “redoma de vidro”: os condomínios cada vez mais fechados, as seguranças
cada vez mais reforçadas, os passeios públicos cada vez mais privados.
Nem sempre foi assim. Alguns leitores talvez não se lembrem,
mas houve um tempo em que íamos à escola a pé, encontrando os amigos e
colegas da vizinhança pelo caminho, sem nenhum medo que não o da lição de
casa eventualmente malfeita (havia consequências!). Houve um tempo em que não
imaginaríamos perigos em nossas aventuras nas ruas de nossa cidade que não a
derrota em uma partida de bete (taco) ou em uma pelada.
Quantos de nós já não perceberam que, assim como abrimos mão
de coisas simples e básicas como essas, também fomos aceitando,
gradativamente, tornando normais, padrões de convivência que não deveriam
nunca ter criado raízes entre nós? Brasileiro que sou, mas filho de pais estrangeiros,
posso dar testemunho da importância que certos valores têm ou podem vir a ter
na formação de nossos padrões de convivência. Lembro-me bem que meu pai
estranhava – e reclamava! – que os vizinhos da nossa casa, num bairro de
classe média de uma cidade do interior paulista, varriam suas calçadas sem se
importar com a da casa ao lado. “Como você pode ter sua calçada limpa e a
calçada vizinha estar horrível? ”. Nosso senso de comunidade, aquele
sentimento de que fazemos parte de algo maior do que simplesmente nossa
existência individual ou familiar, sempre foi muito baixo. O que sempre me
pareceu mais grave, no entanto, é o fato de que não deixamos de desenvolver
um senso comunitário porque somos individualistas modernos, pensando apenas
no bem próprio: as sociedades capitalistas desenvolvidas, Estados Unidos e
Inglaterra à frente, sempre souberam combinar, em graus variados, o interesse
do indivíduo e o bem da comunidade. No nosso caso, parece-me antes que, por
omissão e conformismo, abdicamos do bem próprio e do bem comum e aceitamos
apenas o “deixe tudo como está”. Essa atitude nos prejudica como indivíduos e
como comunidade.
Chegou um momento em que pensei que minha alternativa a esse
estado de coisas seria mudar do Brasil. Deixar o país, simplesmente, e viver
onde meus filhos pudessem ir à escola ou sair para trabalhar sem que eu
julgasse isso o equivalente a um passeio por um campo minado. Muitos
brasileiros cogitam essa possibilidade. Alguns partem, de fato. Outros, não.
Eu não parti. Não porque minha desilusão não fosse enorme, mas porque toda
desilusão tem um limite, e a minha tinha chegado ao seu. Era chegada a hora
de fazer alguma coisa.
Despertando a sociedade anestesiada
E fizemos. Esse plural é importante, pois assim como eu nunca
estive sozinho em minha desilusão ou em minhas cogitações de “exílio”, pois
muitos também pensaram ou sentiram as mesmas coisas, também nunca estive
sozinho no desejo de efetivamente fazer algo para mudar o Brasil. E o fato de
que um número muito expressivo de pessoas estava disposto a fazer alguma
coisa foi decisivo para uma grande virada, para uma transformação nos padrões
de comportamento político absolutamente espetacular que aconteceu na
sociedade brasileira. Se ela vai criar raízes, se será duradoura, isso
somente o tempo dirá; que o que ocorreu, no entanto, foi algo totalmente
inesperado e positivo, isso é coisa certa.
Falei acima que nossa sociedade parece ter uma queda pela
omissão e pelo conformismo. Seja na dimensão política, seja na dimensão de
nossa vida pessoal, vamos aceitando condições cada vez mais penosas e
absurdos sem protestar, sem agir para mudar as coisas. Essa situação foi se
agravando muito nos últimos anos, o que coincidiu com um sentimento
generalizado de degradação de nossa sociedade e de parte das nossas
instituições. A verdade é que nossa sociedade parecia estar anestesiada.
Se não, como explicar que tenhamos aceitado sem mais os
sucessivos e progressivos escândalos de corrupção e má gestão da coisa
pública que foram se acumulando ao longo dos anos no Brasil? Não é preciso
ter ilusões quanto a um passado ideal, em que os políticos brasileiros eram
honestos e puros – isso nunca existiu – para reconhecer que, ao menos em
algum nível, o padrão moral dos políticos e dos agentes públicos decaiu. Houve
momentos em que uma simples declaração desastrosa, mesmo que não envolvesse
nada de ilegal ou de ilegítimo, era suficiente para forçar ministros a se
demitirem. Aliás, era um tempo em que ministros pediam, eles mesmos,
demissão. Especialmente ao longo dos anos da administração do Partido dos
Trabalhadores no governo federal, no entanto, fomos testemunhas e vítimas de
esquemas de corrupção que ultrapassaram em muito o ilegal e o ilegítimo, e,
mesmo assim, a sociedade brasileira parecia um corpo anestesiado, incapaz de
reação.
Basta dizer que passamos por um escândalo como o do Mensalão
(2005), chamado às claras pelos ministros do Supremo Tribunal Federal de
“quadrilha” e de “organização criminosa”, explicitamente descrito no
julgamento do STF como uma ação que visava à subordinação de nossa democracia
aos interesses criminosos de um grupo no poder, e não fomos às ruas, não nos
mobilizamos como sociedade. Nossa omissão e nosso conformismo eram tais que o
mesmo grupo político, a despeito do Mensalão e de inúmeros outros casos de
menor escala, mas de mesma natureza, continuou no poder e venceu três
eleições consecutivas (2006, 2010 e 2014).
Dos pequenos encontros aos grandes eventos
O ano de 2014 nos guardava surpresas, no entanto. Mais do que
as manifestações ocorridas em junho de 2013, que começaram como
reivindicações por menores tarifas de transporte público e se transformaram
em grandes demonstrações populares de insatisfação com a política e com os
governos, foram os sinais que o ano eleitoral trouxe, que garantiram que o
despertar de 2013, difuso, vago e mais simbólico do que efetivo, ganhasse
corpo, adquirisse massa crítica para se transformar no que viria a ser o Movimento
Vem Pra Rua e formasse o pano de fundo das transformações de 2015 e 2016.
O feliz encontro de algumas pessoas, que se aproximaram pelas
razões mais aleatórias do mundo, possibilitou o surgimento daquilo que viria
a ser o embrião do movimento. Alguns encontros, muitas expectativas
compartilhadas, insatisfações semelhantes e muita vontade de mudar o “que
estava ali”. Uma unanimidade.
Foi assim que, no dia 7 de outubro de 2014, depois do primeiro
turno das eleições presidenciais e diante da real possibilidade de derrotar a
continuidade de um governo que mergulhava o Brasil em caos econômico, irracionalidade
administrativa e em corrupção colossal, veio a decisão de sair às ruas contra
a reeleição de Dilma Rousseff (PT). O evento “Vem Pra Rua Dia 16”, criado no
Facebook, denunciava a corrupção – já iam avançadas, então, as investigações
da Operação Lava Jato, em Curitiba – e defendia a saudável alternância de
poder na política brasileira. Não eram bandeiras inocentes: o que eu estou
considerando aqui neste artigo como a grande transformação brasileira nesse
curtíssimo espaço de tempo foi justamente a consolidação, na sociedade
brasileira, de um sentimento contrário à corrupção. Percebemos que era
absolutamente necessário combatê-la na prática; que era uma obrigação de cada
um de nós tornar pública nossa rejeição dos corruptos, dos corruptores e dos
seus atos; que deveríamos traduzir isso em ações concretas. E, para isso era
preciso, entre outras coisas, mudar o poder político.
Ato suprapartidário, mas não apolítico; democrático, mas não
aleatório; voluntário e organizado; assim teve início o Vem Pra Rua, em meio
a uma tensa campanha eleitoral – que teve direito até à queda de avião e
morte de presidenciável, como todos lembramos e lamentamos. No dia 16 de
outubro de 2014, o movimento saía às ruas pela primeira vez, o que ocorreu em
São Paulo, no Largo da Batata, mas também em Brasília, Belo Horizonte e em
Teresina. Firmes em nossa convicção de que as melhores garantias para a
continuidade da Operação Lava Jato e do curso da Justiça estavam nas mãos da
oposição ao PT, fomos às ruas novamente nos dias 22 e 25 de outubro, antes da
fatídica data do segundo turno, em apoio à candidatura oposicionista de Aécio
Neves (PSDB) reunindo, ao todo, mais de 60 mil pessoas nas duas datas em São
Paulo. Ao todo, as manifestações ocorreram em mais de 240 cidades.
Essas saídas ajudaram a fazer emergir na sociedade brasileira
uma nova realidade. Não é verdade que a população não se preocupava com a
corrupção, apenas não conseguia canalizar essa preocupação. Não conseguíamos
nos mobilizar – foi assim desde 1992 e as passeatas contra o então presidente
Fernando Collor –, confirmando o que parecia ser omissão imperdoável. No
entanto, quando parcelas das instituições brasileiras deram mostras de que
estavam funcionando – a Polícia Federal e o Ministério Público, por exemplo –
em favor do povo brasileiro; quando valores como a defesa da ética na
política e do fim da impunidade se impuseram como expressão real de cidadãos
de todas as classes, não foi difícil perceber que começava ali a grande
transformação que varreria o país nos meses seguintes.
Derrota eleitoral, vitória nas ruas
A eleição de 2014 foi, de fato, vencida pela continuidade de
Dilma Rousseff e do PT. E isso representava a continuidade da corrupção
sistemática praticada pelo partido que misturava sociedade, governo e Estado
com os interesses dos líderes de uma legenda partidária. Mas, o sentimento da
sociedade foi outro: apesar de uma parcela da sociedade ter sido
escandalosamente vitimada pelo estelionato eleitoral praticado pela campanha
governista de Dilma e do PT, apesar de os instrumentos de intimidação e de
ameaça aos mais pobres terem sido úteis à candidatura oficial, a verdade é
que se não fossem a mentira e os muitos milhões de reais desviados dos cofres
públicos que, agora se sabe, irrigaram a campanha do PT, a realidade
eleitoral teria sido outra, pois a vontade da sociedade era outra.
A prova desse sentimento novo dissociado da vitória eleitoral
do PT aparece já no fato de o Vem Pra Rua ter se mobilizado, com não pouca
expressão, no simbólico 15 de novembro de 2014, na Avenida Paulista, para
manifestar total apoio às investigações do Petrolão, para exigir a punição
dos culpados e para condenar diversas práticas inaceitáveis do governo então
reeleito (do uso político dos Correios na campanha até sua aliança com
governos autoritários na América Latina).
Quando seria possível imaginar que a sociedade brasileira, que
a tudo parecia assistir passivamente, estaria se mobilizando nas redes
sociais e nas ruas pouco mais de duas semanas após um segundo turno de
eleição presidencial? Quando teríamos imaginado que a sociedade que assistiu
ao Mensalão e às três eleições petistas que se seguiram, agora, era capaz de
manter um forte interesse no nosso destino político, vigiar os desmandos e
desvios dos políticos e, sobretudo, efetivamente fazer alguma coisa? Pois
bem: foi o que aconteceu. Os inúmeros grupos de amigos nas redes sociais e de
compartilhamento de mensagens, como Facebook, Twitter e WhatsApp, passaram a
ser veículo de troca de informações, notícias, links e opiniões sobre
política; a sensação de que era preciso manter-se mobilizado, dando continuidade
ao que havia acontecido no segundo turno das eleições era clara; o Vem Pra
Rua começava a se consolidar nas redes sociais e nas ruas de um modo que
seria absolutamente inédito na vida política brasileira.
Mega manifestações
Após inúmeros atos pontuais como um ”faxinaço” na sede da
Petrobras, uma vigília na frente do PGR em Brasília, um “panelaço” na frente
da casa do Ministro da Justiça, “panelaços” toda vez que a presidente
aparecia em rede nacional ou publicamente, organizamos, junto a outros movimentos,
como Revoltados On-line e Movimento Brasil Livre, a primeira megamanifestação.
Essa novidade tornou-se evidente e inquestionável quando, no dia 15 de março
de 2015, com apenas três meses do segundo mandato de Dilma, os brasileiros
foram às ruas protestar contra os cada vez mais surpreendentes casos de
corrupção que vinham sendo revelados, contra a fraude eleitoral perpetrada
pela campanha de Dilma Rousseff e contra a calamidade econômica que vinha se
instalando no país aos poucos, e que parecia fugir do controle artificial que
o governo mantinha. Somente em São Paulo, foram mais de 1 milhão de pessoas
na Avenida Paulista: a maior manifestação política da história do Brasil
democrático; a maior demonstração de uma vontade popular desde os comícios da
campanha das Diretas Já!, em 1984. Ao todo, mais de 2 milhões de brasileiros
foram às ruas, em centenas de cidades de todo o país. O chamado “Vem Pra Rua”
acabara de ganhar toda uma nova dimensão, todo um novo significado: a
população brasileira demonstrava, assim, que aquela suposta passividade e que
aquele suposto conformismo podiam ser vencidos, deixados para trás e
substituídos por uma nova consciência crítica, uma nova forma de cidadania.
A novidade, no entanto, não estava apenas na capacidade de mobilização,
ou no número de pessoas dispostas a ir às ruas: estava na forma e no conteúdo
que marcaram essas mobilizações. Ao longo de 2015, mais três grandes atos
ainda ocorreriam, mostrando que a disposição do brasileiro para defender a
Operação Lava Jato e as investigações da Justiça brasileira, para combater um
governo corrupto e para salvar a nação da bancarrota total era muito mais
forte do que se imaginava. Organizações rápidas e espontâneas, muitas delas
começando nas redes sociais; conexão com outros movimentos sociais de
inclinações políticas diferentes; independência em relação aos partidos
políticos e à política tradicional: os grandes números de compartilhamentos
de uma postagem no Facebook agora se traduziam em muitos milhares de pessoas
nas ruas.
Essa integração das plataformas virtuais das redes sociais com
a sociedade viva e pulsante tomando conta das grandes ruas e avenidas do país
foi decisiva para que despertássemos da condição anestesiada que descrevi
acima. Porém, ainda mais importante para rompermos com o conformismo e com a
omissão em face dos descalabros que assolavam o país foi a nossa capacidade
de congregar, em um conjunto muito simples de ideias, uma agenda nova para o
Brasil.
Agenda para o Brasil
Essa crescente participação política somente foi possível
graças a diversos fatores. Os avanços da sociedade brasileira com as
condenações dos culpados no julgamento do mensalão, os desdobramentos das
investigações da Lava Jato, a seriedade do trabalho do juiz Sergio Moro, da
equipe de procuradores de Curitiba, da Polícia Federal, as prisões e as
primeiras condenações de grandes figurões da política e do meio empresarial
envolvidos em escândalos de corrupção foram elementos que contribuíram para
uma permanente mobilização da sociedade brasileira no período de outubro de
2014 a abril de 2016. As flagrantes mentiras de Dilma na campanha eleitoral
que a reconduziu ao cargo e sua incapacidade total e absoluta para tirar o
país da crise que ela e seu partido criaram no país mantiveram o brasileiro
atento em sua indignação.
Mas, foi a convicção de que era preciso manifestar essa
indignação com a classe política como um todo, a certeza de que era preciso
resgatar a esperança que havia sido sequestrada pela corrupção e a
necessidade de impor um regime de eficiência e transparência na administração
da coisa pública que garantiram que os brasileiros não deixassem mais as ruas
até o desfecho que, hoje, conhecemos bem. A rejeição ao governo do PT era
maior do que simplesmente uma crítica à corrupção e à ineficácia. Por isso
mesmo, era uma rejeição da quase totalidade da classe política. O brasileiro
que foi às ruas – e que imensa transformação foi essa! – quer poder viver
dignamente do suor do seu trabalho e quer protagonizar a construção de um
país próspero. O brasileiro que foi às ruas quer que os serviços públicos
prestados pelo Estado tenham qualidade e sejam eficientes, e não acredita
mais que para isso ele deva pagar ainda mais impostos.
Quem foi às ruas quer, isso sim, o fim da corrupção que drena
o dinheiro público, quer o fim da impunidade que solapa as condições de
justiça e quer um Estado eficiente e desinchado – e que grande transformação
foi ver a população dizer, sem meias palavras, que quer preservar e estimular
a liberdade econômica, o empreendedorismo e a livre iniciativa, verdadeiras
fontes geradoras de riqueza! Foi com esse alinhamento de valores que o Vem
Pra Rua foi realizando, ao longo dos últimos três semestres, as grandes
manifestações que se tornaram símbolo de uma transformação sem igual no
cenário político brasileiro: da apatia e da perplexidade às mega
manifestações de rua, culminando com o processo de impeachment de Dilma
Rousseff.
O Impeachment e o futuro
Eu comecei este artigo dizendo que mesmo diante das mais
notáveis e velozes transformações do mundo contemporâneo ainda me espantava
com as transformações que tínhamos vivido em pouco mais de 18 meses com o Vem
Pra Rua. Foi o tempo necessário para o despertar da sociedade brasileira. Foi
o tempo necessário para aglutinar pessoas nas redes sociais e nas ruas, e em
escala nunca antes imaginada. Foi o tempo necessário para romper com as
falsas polarizações da política partidária brasileira e escolher o nosso
lado: o de um Brasil justo, ético e eficiente. Isso tudo já bastaria para que
ficássemos surpresos com nossas conquistas, mas fomos além.
Nosso engajamento se traduziu na consolidação do Vem Pra Rua como
uma referência na organização da sociedade civil de maneira legítima,
espontânea e sempre respeitando a lei, a Constituição e o Estado de Direito.
Foi assim que depois da façanha de levar mais de 2 milhões de pessoas à
Avenida Paulista, em 15 março de 2015, o Vem Pra Rua, ao lado de outros
movimentos, levou mais de 6 milhões, em 13 de março de 2016, na maior
manifestação política da sociedade brasileira em toda sua história. As
pequenas manifestações que começaram, 18 meses antes, em defesa das
investigações do Petrolão, culminaram com o apoio firme e convicto ao pedido
de impeachment de Dilma Rousseff, tal como formulado pelos juristas Hélio
Bicudo, Miguel Reale Jr. e Janaína Paschoal. A organização de uma passeata
contra a candidatura governista – um simples evento do Facebook criado em 7
de outubro de 2014 – culminou em mais de 6 milhões de pessoas nas ruas do
Brasil, em 13 de março deste ano. A mobilização de grupos de WhatsApp que
trocavam informações políticas se transformou em uma das mais inovadoras
ferramentas tecnológicas na política brasileira: o Mapa do Impeachment
(www.mapa.vemprarua.net), site pelo qual o usuário tem acesso a toda sorte de
informação sobre cada parlamentar, podendo contatá-lo de diversas formas,
exercendo a verdadeira pressão política: a do desejo do eleitor. Exercendo a
cidadania.
Deu certo? Pense o leitor nas mobilizações espontâneas que
eclodiram em diversas capitais do Brasil, em 16 de março deste ano, quando
áudios revelaram que Lula e Dilma tramavam contra a Lava Jato, com a nomeação
dele para um ministério. E isso apenas três dias após as maiores
manifestações da história do país, lá estavam os brasileiros, novamente, nas
ruas, exigindo ética, gritando contra tanta desfaçatez. Considere o leitor a
mobilização em centenas de cidades brasileiras para pressionar o Congresso
pelo impeachment de Dilma Rousseff. E pense, agora, no Brasil que descrevi no
início deste artigo. O Vem Pra Rua foi ou não um veículo decisivo de
manifestação da indignação do brasileiro? O brasileiro passou ou não a ser
agente da transformação política no Brasil?
Minha resposta só pode ser positiva, como deve ser positivo o
nosso espanto, firme nossa indignação e constante nossa vigilância.
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