quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017


Comodidades

 

                            Do mesmo Juan Enriquez, p. 151, temos: ”(...) Exportação de produtos com valor agregado/Exportação de commodities. Se a taxa resultante for maior que um, o país exporta mais produtos baseados no conhecimento do que matérias-primas. Se for menor que um, a economia permanece vulnerável aos ciclos das commodities. (...) Se você não exporta conhecimento, você não fica rico”, negrito meu.

                            Por exemplo, eu produzo conhecimento (novo) e exporto, mas até pouco tempo atrás não tinha pensado em cobrar, porisso não ficava rico. Não basta produzir, nem exportar, deve-se cobrar pelo conhecimento exportado.

                            Até através da maquiagem, como fazem os tigres e dragões asiáticos, pode-se agregar valor. Acontece que tudo isso se reduz à regra clássica da oferta e da procura, que é a explicação de fundo: se TODOS estivessem oferecendo conhecimentos, quer dizer, se houvesse GRANDE OFERTA, eles se tornariam comodidades. Se houvesse baixa procura seu preço cairia. O fato de os conhecimentos serem tão lucrativos se deve a GRANDE DEMANDA ter se reunido de fato a BAIXA OFERTA relativa. Não há tantos inventores assim, no mundo, para tamanhas necessidades.

                            Oferecer ortodoxia também não resolve. Ninguém dará muita bola para quem ofereça soluções para equações quadráticas, resolvidas há 700 anos. Nem para recém-fabricados, novíssimos computadores de segunda geração.

                            Então, devemos concluir que os conhecimentos buscados são OS NOVOS, que ESTEJAM EM USO (soluções para Marte ou Vênus terão pouca procura, pois não podemos ir lá), que tenham grandes desdobramentos socioeconômicos. Até conhecimentos podem se transformar em comodidades. Evidentemente, como o mundo precisa de soluções, isso não tem acontecido. Além disso, o que seria matéria-prima? Esse conceito é como o de semi-elaborado, conceito transitivo. O conhecimento que serve de base para elaboração de outro é matéria-prima dele, de forma que matéria-prima é realmente um conceito inútil, enquanto separador. A América Latina não ganha pouco porque exporta matérias chamadas primas, primeiras, mas porque, pela grande oferta e baixa demanda relativa os preços diminuem. O petróleo é matéria-prima, mas como energético tem preços relativos altos. Quando tinha preço baixo e a OPEP, Organização dos Países Exportadores de Petróleo, promoveu a elevação artificial dos preços na década dos 1970, ele se tornou uma comodidade de preço alto. A América Latina e a África não conseguem preços altos porque não conseguem se unir para exportar preços altos, só por isso, e não porque, magicamente, classificamos este ou aquele produto como comodidade. Esse é um conceito fantasma e traiçoeiro, com o qual devemos tomar cuidado, porque isso pode nos levar a cair na acomodação mental, de aceitar “o que é, porque é”, as tautologias que suprimem o raciocínio. Se a América latina se unisse para diminuir a produção de açúcar pela metade o preço pelo total do peso exportado dobraria, não é?

                            Enfim, quando não se raciocina o perigo é fazer anúncios QUE PARECEM CERTOS para aqueles que também não raciocinam. Isso é uma comodidade, seguir as ortodoxias.
                            Vitória, sexta-feira, 28 de março de 2003. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário