sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017


Ah, a Felicidade!

 

                        No livro As Fontes do Paraíso, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1980 (original de 1979), o autor Arthur C. Clarke (Inglaterra, 1917, ainda vivo em 2003, 86 anos) coloca a ação no ano de 2142, 163 anos depois de quando escreveu.

                        Como reside em Colombo, capital do Sri Lanka, colocou a ação lá. Ficando no equador, como tantas terras, inclusive o Brasil, Clarke faz necessário no livro ancorar lá o elevador celeste (Elevador Espacial ou Torre Orbital, como chama), um aparato de 72 mil quilômetros de comprimento (tanto quando seis vezes o diâmetro da Terra), metade para cada lado, a partir de um ponto geo-estacionário a 36 mil quilômetros acima do equador, exatamente sobre as Fontes do Paraíso, que o rei Kalidasa teria construído naquele local lá pelo ano 100 de nossa era.

                        O engenheiro autor da proeza seria Vannevar Morgan, que já havia feito a Ponte Suprema sobre o Estreito de Gibraltar, que tem realmente 14 km de largura (tanto quanto a ponte Rio-Niterói), com três quilômetros de altura, o que é a surpresa da proposta, só para mostrar como a Engenharia do século 22 é superior, e preparar o terreno da aventura, sem falar no Oleoduto Antártico, “construído para bombear carvão fluidificado dos vastos depósitos polares”. Assim, o Dr. V. Morgan é o que há de melhor na época.

                        Vamos à notícia: “Cápsulas para passageiros, cargas e combustível subiriam e desceriam pelos tubos a uma velocidade de vários milhares de quilômetros por hora. Estações de energia de fusão, a intervalos, proporcionariam toda a energia necessária. Uma vez que cerca de 90 % dessa energia seria recuperada, o custo por passageiro seria de apenas alguns dólares. Pois quando as cápsulas caírem em direção à Terra novamente, seus motores atuarão como freios magnéticos, gerando eletricidade. Ao contrário das naves convencionais, não desperdiçarão toda a energia aquecendo a atmosfera e provocando estrondos supersônicos; essa energia será bombeada novamente para o sistema. Podemos dizer que os trens de descida serão os propulsores dos trens de subida. De modo que, mesmo fazendo-se a estimativa mais pessimista possível, o elevador será cem vezes mais eficiente do que qualquer foguete”.

                        É impressionante ver como o futuro resolve todos os problemas, é ou não é? Falta energia: eis aí a fusão nuclear controlada. É difícil ir ao espaço, eis o elevador celeste de Clarke. E assim por diante.

                        Mas você há de convir que um homem só dar fama a uma nação inteira é bastante coisa, hem? Se não fosse por Clarke nós no Ocidente saberíamos onde fica o Sri Lanka? É uma ilha ao largo do sudeste da índia, tendo de área 65.610 km2 (por comparação com 45.597 km2 do Espírito Santo, não mais que 1,5 vez nosso território) e 19,1 milhões de habitantes em 2001 (3,2 milhões, quase seis vezes o tanto de gente daqui), PIB de apenas US$ 20 bilhões em 1999. O Kalidasa que aparece na Barsa eletrônica foi escritor que viveu entre os séculos IV e V, na corte hindu do imperador Chandragupta II. Quem se interessaria, fora do Oriente, por qualquer Kalidasa?

                        Tendo escrito mais de 60 livros (dos quais tenho vários), vendeu mais de 50 milhões de exemplares, vá ler a biografia dele, é muito interessante. Vá ter imaginação assim lá longe! Que plasticidade! Que filme empolgante daria!

                        Aliás, é impressionante terem filmado tão poucos de seus livros e é de se perguntar a razão de não terem começado as filmagens desse livro em particular. Seria uma emoção incomparável, até porque constituiria, nem que seja na imaginação, uma obra de megaengenharia, além de dar idéia de continuidade da exploração espacial, tão fundamental para a humanidade.

                        Descontando as soluções gerais dos problemas podemos dizer que seria mesmo um arrebatamento de felicidade ver os livros de Clarke filmados.

                        Vitória, domingo, 08 de junho de 2003.

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