quarta-feira, 7 de junho de 2017


Tecnociência dos Filmes


 

                            Faz décadas que venho pensando intermitentemente na razão de os filmes brasileiros não emplacarem, não caírem no gosto do público ou da crítica e cheguei a várias conclusões que estão retratadas aqui e acolá, não vou abordá-las de novo. Comentando com Gabriel, eis o que ele ajuntou.

                            GABRIEL VÊ OS FILMES (o que ele apontou)

·        Quem vai ao banheiro anuncia antes, quem vai sair de casa diz onde vai;

·        Se alguém segue num ônibus fica-se meia hora mostrando todos os rangidos, todo o percurso, todas as coisas ditas, uma infinidade de inutilidades.

A razão profunda que ele põe é dupla, é espaçotemporal.

A INADEQUAÇÃO ESPACIAL DOS FILMES BRASILEIROS

·        Há linearização, compressão do espaço e do plano em linha, aprisionamento dentro do linear – indicando um ponto, convergência focal ou pontual que delimita tudo que a personagem pode fazer (isso mata as iniciativas compreensivas do espectador – ele não pode dilatar-se no enredo, fica comprimido, imprensado pela vontade do diretor);

A INADEQUAÇÃO TEMPORAL DA CINEGRAFIA BRASILEIRA

·        A lentidão temporal impede que o espectador se solte e dê vôos de imaginação com a rapidez do derrame dos venenos químicos aceleradores ligados à emoção empática, de resposta ao que se passa na tela.

Ambas as diretivas cinematográficas brasileiras dizem respeito à mesma posição cultural ou nacional de fundo, ao dirigismo, ao excesso de direção que faz questão de cada olhar, sem dar liberdade nenhuma ao intérprete ou ator e pós-tela ao espectador. O espectador é tratado com criança, como imbecil; tudo isso fala do imperialismo brasileiro, da direção que sempre vem do Céu, remete-nos às consciências manietadas, amarradas, apertadas por essas elevadíssimas vontades das elites dirigentes de em tudo mandar, de tudo vigiar, de controlar completamente, ditatorialmente o povo, ao contrário da civilização anglo-saxã, que é por enquanto libertária e deixa livre tanto atores quanto espectadores. Portanto, Gabriel foi fundo, identificando perfeitamente, embora sem saber explicar. E eu, que fiquei tanto tempo esperando explicações adicionais, pude tê-las porque Gabriel, meu filho de 18 anos, pensou, falou e foi ouvido (o que nos remete a ouvir todos e cada um dos jovens).

Doutra parte está o trabalhar para além do magicartístico, rumo ao tecnocientífico, à tecnociência de fazer filmes. Tradicionalmente tecnocientistas não tem pesquisado & desenvolvido teórica & praticamente os filmes e tudo que os envolve. Do mesmo modo nos demais pólos do Conhecimento (Magia/Arte, Teologia/Religião, Filosofia/Ideologia, Ciência/Técnica e Matemática), quase ninguém se interessa, por pensarmos que é terreno e tempo exclusivo dos mágicos e dos artistas. De modo algum, tudo é obrigação de todos e cada um.

Se os tecnocientistas se tivessem obrigado a olhar melhor os filmes teriam apurado muito a racionalidade inerente, coibindo as falhas gritantes e nos dando uma tecnarte à prova de furos clamorosos e grosseiros, como esses que o cinema brasileiro comporta ainda, como qualquer um de terceiro mundo, atrasado e até retrógrado (porque não é um instrumento de apuro socioeconômico e psicológico).

Vitória, terça-feira, 06 de abril de 2004.

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