Tecnociência
dos Filmes
Faz décadas que
venho pensando intermitentemente na razão de os filmes brasileiros não
emplacarem, não caírem no gosto do público ou da crítica e cheguei a várias
conclusões que estão retratadas aqui e acolá, não vou abordá-las de novo.
Comentando com Gabriel, eis o que ele ajuntou.
GABRIEL VÊ OS FILMES (o que ele
apontou)
·
Quem
vai ao banheiro anuncia antes, quem vai sair de casa diz onde vai;
·
Se
alguém segue num ônibus fica-se meia hora mostrando todos os rangidos, todo o
percurso, todas as coisas ditas, uma infinidade de inutilidades.
A razão profunda que
ele põe é dupla, é espaçotemporal.
A
INADEQUAÇÃO ESPACIAL DOS FILMES BRASILEIROS
·
Há
linearização, compressão do espaço e do plano em linha, aprisionamento dentro
do linear – indicando um ponto, convergência focal ou pontual que delimita tudo
que a personagem pode fazer (isso mata as iniciativas compreensivas do
espectador – ele não pode dilatar-se no enredo, fica comprimido, imprensado
pela vontade do diretor);
A INADEQUAÇÃO TEMPORAL DA CINEGRAFIA BRASILEIRA
·
A
lentidão temporal impede que o espectador se solte e dê vôos de imaginação com
a rapidez do derrame dos venenos químicos aceleradores ligados à emoção
empática, de resposta ao que se passa na tela.
Ambas as diretivas cinematográficas brasileiras dizem
respeito à mesma posição cultural ou nacional de fundo, ao dirigismo, ao
excesso de direção que faz questão de cada olhar, sem dar liberdade nenhuma ao
intérprete ou ator e pós-tela ao espectador. O espectador é tratado com criança,
como imbecil; tudo isso fala do imperialismo brasileiro, da direção que sempre
vem do Céu, remete-nos às consciências manietadas, amarradas, apertadas por
essas elevadíssimas vontades das elites dirigentes de em tudo mandar, de tudo
vigiar, de controlar completamente, ditatorialmente o povo, ao contrário da
civilização anglo-saxã, que é por enquanto libertária e deixa livre tanto
atores quanto espectadores. Portanto, Gabriel foi fundo, identificando
perfeitamente, embora sem saber explicar. E eu, que fiquei tanto tempo
esperando explicações adicionais, pude tê-las porque Gabriel, meu filho de 18
anos, pensou, falou e foi ouvido (o que nos remete a ouvir todos e cada um dos
jovens).
Doutra parte está o trabalhar para além do
magicartístico, rumo ao tecnocientífico, à tecnociência de fazer filmes.
Tradicionalmente tecnocientistas não tem pesquisado & desenvolvido teórica
& praticamente os filmes e tudo que os envolve. Do mesmo modo nos demais
pólos do Conhecimento (Magia/Arte, Teologia/Religião, Filosofia/Ideologia,
Ciência/Técnica e Matemática), quase ninguém se interessa, por pensarmos que é
terreno e tempo exclusivo dos mágicos e dos artistas. De modo algum, tudo é
obrigação de todos e cada um.
Se os tecnocientistas se tivessem obrigado a olhar melhor
os filmes teriam apurado muito a racionalidade inerente, coibindo as falhas
gritantes e nos dando uma tecnarte à prova de furos clamorosos e grosseiros,
como esses que o cinema brasileiro comporta ainda, como qualquer um de terceiro
mundo, atrasado e até retrógrado (porque não é um instrumento de apuro
socioeconômico e psicológico).
Vitória, terça-feira, 06 de abril de 2004.
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