terça-feira, 6 de junho de 2017


Escavando Lagos

 

                            Como vimos no artigo ou podemos raciocinar a partir de O Corredor Canadense e o que as Ilhas Denunciam, Livro 74, os lagos falam do levantamento de continentes, de antigos braços de mar que se tornaram lagos salgados, da decantação dos sais, da morte de peixes e animais marinhos em geral, sua queda no fundo, sua cobertura pelo lodo e transformação em fósseis, a mudança dos lagos salgados em lagos de água doce, o fim destes, sua sombra vista por satélites e finalmente a escavação generalizada.

                            Assim, lagos são coleções ou álbuns de fotografias também. Tudo é, mas lagos são máquinas fotográficas especiais, porque cortando a altura de água para o passado, quando era maior, o lago mais fundo, podemos na cota dele ir obtendo estratogramas ou fotografias-de-estrato de terra/solo, mostrando-nos o passado. Quer dizer, se virássemos os lagos ao avesso e os víssemos como montanhas, elas ficariam mais altas (os lagos mais fundos) conforme fôssemos recuando no tempo. No ponto extremo teríamos a formação do lago de água doce, de água salgada, do canhão de mar, do próprio fundo do mar quando ele começou a nascer.

                            Assim, lagos são muito interessantes, mais que qualquer coisa, porque dão retratos restritos, não misturados. Cada um dos L(i) lagos, para qualquer i de 1 a n, é um mundo em si, delimitado, um bioma privilegiado, e a união deles em perspectiva racional pelos pesquisadores pode nos ensinar muito. Lagos são máquinas de aprofundar o pensamento dos racionais, no presente caso, dos humanos. Pense em cortes que vão descendo da superfície de água atual 10, 20, 40, 80, 160, 320, 640 metros ou o que for, em lâminas, que podem também ser de um metro, tanto qualidade quanto quantidade: você veria o presente ir recuando para o passado e, postas as lâminas num documentário, seria interessante ver o passado aparecendo. Teríamos notícia da vida lacustre como era há um, dois, quatro, oito, dezesseis ou mais milhões de anos, e de quando tivesse havido a transição da vida marinha. Veríamos como a vida marinha foi se ausentando com a diminuição da salinidade.

                            Não é tão interessante?

                            Quem diria que um lago ofereceria tanto num espaço tão restrito, não é? Mas é dos menores lagos que vem os melhores perfumes.

                            Vitória, quinta-feira, 01 de abril de 2004.

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