As
Consciências-Alvéolo e a Decisão Dolorosa que é a Heterodoxia
Como vimos em vários
textos antes, e neste Livro 86 em Casas
Dentro das Cavernas, em Buscando as
Cidades Alveolares e em A Expansão
das Cidades Alveolares, as casas-alvéolo ou
casulos ou células que nasceram nas cavernas saíram pela boca para o
mundo afora, prosperaram, transformaram-se em imensas construções com centenas
de casas e finalmente se desprenderam, tornando-se independentes ou separadas
das cavernas, por fim esquecendo-as, como pessoas que vão para outros lugares e
olvidam os parentes. Finalmente as cidades foram para tão longe que nem se
lembravam mais que tinham tido pais e mães tão pequenos e apertados, enquanto
os filhos e filhas se tornaram gigantescos.
Em todo caso, no
início as casas estiveram sempre grudadinhas, amontoadas todas, umas sobre as
outras até, sempre pegadas sem quaisquer ruas entre elas. DEVE SER
NECESSARIAMENTE assim, pois isso vem de uma consciência-alvéolo, a idéia firme
de que só podia ser deste modo, de que só desse jeito estava certo; por
milênios antes de Jericó e mesmo depois continuaram a construir dessa forma e
deve ser possível encontrar exemplares por toda parte do mundo. Construir
diferente parecia inconveniente, censurável, doentio mesmo; só pervertidos
poderiam pensar em separar-se do umbigo do grupo. Só os solitários,
os-que-não-convivem, os sem-centro é que pensariam em tal perversidade.
Os primeiros
heterodoxos que se separaram do grupão devem ter provocado um choque tremendo,
um abismo de dor e extravagância, constituindo tal atitude uma ameaça que ainda
deve poder ser rastreada nos pesadelos. Os primeiros só devem ter feito isso
porque estavam tão longe do centro, onde ficavam os bons e os puros, todos os
que contavam para o poder de então, que se lançar foi um gesto de salvação em
relação a uma dor de negação ainda maior. A audácia deve ter significado
repúdio quanto ao abandono. Os primeiros que foram devem ter voltado, mas ficou
o exemplo, e cada vez mais os rejeitados e os jovens ousaram construir
separado. Depois que foram os primeiros e a seguir outros que não voltaram,
depois de ter ido uma centena e um milhar nasceram as ruas e as praças (que,
sob a ótica antiga constituiriam uma violência, um espaço aberto no coração da comunidade,
dizendo que ela não tinha centro conexo, tinha um buraco na criação). É preciso
modelar em computação gráfica essa condição de amontoamento, porque saberemos
através dela mais sobre nós e sobre aquilo de que realmente dependemos:
proximidade.
Vitória, sábado, 10
de julho de 2004.
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