domingo, 28 de maio de 2017


Institucionalmente Desplugado

 

                            Na década dos 1960 no programa Flávio Cavalcanti na antiga TV Tupi ele apresentava a então novidade dos programáquinas tocadores de música como potencial perigo, dizendo que ou não iria “colar”, não iria funcionar, desapareceria, ou se o fizesse deixaria muitos músicos desempregados. Como vimos, não desapareceram, aprimoraram-se cada vez mais; os músicos não perderam seus empregos, ao contrário, muitos mais foram criados e hoje os músicos não podem viver sem tais instrumentos. De fato, tornaram-se tão presentes, onipresentes mesmo, que criaram o novo verbo des-plugar, tirar do plugue, do soquete de energia o fio que fornece potência a tais aparelhos. Seria oposição ao novo verbo PLUGAR, colocar no plugue, fornecer força. Diz-se desplugado também quem não segue o veio principal, a média, a moda, o comum, o trivial; aquele que está fora da corrente. Tão plugados ficaram quase todos que para valorizar os violões que não têm fiação falam de VIOLÕES ACÚSTICOS, que dependem somente da acústica natural para funcionar, ainda trabalham com ressonância própria.

                            O fato foi que despluguei, saí do plugue universal que conduz a quase todos. Como sempre a soma zero 50/50 diz que foi bom e foi ruim. Bom porque pude investigar uma quantidade de coisas que não teria sequer notado caso estivesse preso à responsabilidade de respostas institucionais de programas e paradigmas, a métricas socioeconômicas. Pude seguir meus instintos e investigar tudo que achasse remotamente interessante. Não recusei quase nada. Por outro lado, a falta de apoio institucional evitou que houvesse propulsão, elevação das minhas investigações, o que acontece com tantos artigos sem qualquer interesse prático ou teórico apenas porque são desta ou daquela universidade ou instituto e a fama própria dela ou dele eleva todo e qualquer um a patamares artificiais de fama. Exposição natural até de idiotas. E, não estando colado a elas, procuraram me derrubar o tempo todo, evitando que as coisas chegassem a amplo conhecimento público. Bom e ruim ao mesmo tempo, soma zero.

                            Em todo caso, o que há de bom de estar institucionalmente desplugado é isto: posso investigar TODO e qualquer assunto sem o mínimo remorso de estar seguindo algo institucionalmente duvidoso, mesmo se não recebo aplausos automáticos que a claquete de média aciona. Isso é uma dádiva impagável, de satisfação associada de certo modo incurável.

                            Vitória, domingo, 14 de março de 2004.

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