domingo, 1 de janeiro de 2017


Recolhimento da Liberdade

 

                            No dicionário o par oposto/complementar igualdade/liberdade existe mesmo. Liberdade das elites e igualdade do povo. A presença absoluta de uma é a ausência absoluta da outra. Mas as duas podem conviver e ser ampliadas indefinidamente.

                            Raciocinando sobre pobreza e riqueza vi que riqueza é relativa, enquanto pobreza é absoluta: não se tendo uma lapiseira é-se pobre dela, mas a riqueza nunca termina, há sempre uma acima e uma abaixo, nem que seja potencial, isto é, mesmo para um ser isolado, sozinho. Do mesmo modo desconhecimento é absoluto e conhecimento é relativo. E deve-se dizer o mesmo de igualdade e liberdade. A igualdade é absoluta, não há nem acima nem abaixo, todos se situam no mesmo nível, enquanto que podemos ser ricos, médios-altos, pobres e miseráveis de liberdade. Existem até os riquíssimos em liberdade. Com isso os pares poderão ser enfileirados, como duas listagens, de relativos e de absolutos. É questão de tempo poder enfileirar os dois grupos, com o quê nosso conhecimento dará saltos formidáveis.            

                            Ora, acontece que Deus (do par oposto/complementar Natureza/Deus, Ela/Ele, ELI), como a parte consciente da díade, é, por definição, totalmente livre, absolutamente livre (enquanto a Natureza é absolutamente contingenciada), com o que, se há só Deus não há qualquer gênero de igualdade POR DEFINIÇÃO. Isto é outro modo de dizer que ninguém é igual a Deus, nem de longe (o último que tentou foi condenado a danação eterna, como se sabe).

                            Porém, sem liberdade não haveria mundo, não haveria manifestação no plano do real dos seres todos e de cada um. SE segue que Deus “renuncia” à sua liberdade, enquanto o mundo existir, para dá-la aos seres, que assim passam a gozar de livre-arbítrio, de livre-escolha, de caminho por decidir nas encruzilhadas da Vida geral.

                            Evidentemente quem é absolutamente livre, quem é omnisciente, onisciente (todo conhecedor), quem é omnipotente, onipotente (todo potente), quem é omnividente, onividente (tudo vê), não precisa de provas construídas. Só pode mesmo ser por amor, porque o lado do ódio já é conhecido também. O ódio, como falta, é absoluto, enquanto que o amor é relativo, pode-se ter ou não. É-se rico de amor, etc. Se Deus dá liberdade (e pode tirá-la), o que ele deseja? O que ele pode desejar dos seres é a opção pela igualdade, pelo aumento da igualdade (sem renúncia à liberdade) – É A OPÇÃO CONSCIENTE pela igualdade. Sem essa opção não faz sentido o mundo existir! Daí que, quando das desobediências, Deus recolhe a liberdade, quando os seres não conseguem dar provas consistentes de seu empenho pela igualdade. Segundo as lendas fez isso uma vez e depois firmou pacto, deixando o arco-íris como sinal de aliança, isto é, reunião com a humanidade. No entanto, o que temos visto é que uma parte grande da humanidade quer liberdade só para si, dando provas inequívocas de sua estupidez.

                            Deus já conhece tudo de liberdade, não é preciso ensinar-lhe nada. Pelo contrário, está sempre disposto a ver e ouvir, e de um modo geral perceber, receber as provas de igualdade (porque, por definição, todos os seres humanos são iguais perante Deus – e nem poderia ser de outra forma, dado que a infinitude de Deus cancelaria, levaria a zero qualquer ser, por maior que fosse). É com grande tristeza que vejo que a humanidade deseja justamente o que não pode ter, a liberdade como absoluto.

                            Com resultado indireto deste texto podemos fazer duplo alinhamento inicial:

                            ABSOLUTOS                RELATIVOS

                            Natureza                                     Deus

                            Pobreza                                       riqueza

                            Desconhecimento                    conhecimento

                            Igualdade                                    liberdade

                            Ódio                                              amor

                            Daí que, para os que têm fé, a privação faça todo o sentido, como prova de devoção total. Mas, Deus propõe que os seres TODOS caminhem e possam caminhar para Si, para a riqueza de todos, o conhecimento completo, a liberdade máxima que se pode conseguir, o amor que em estado de perfeição seria aquele incondicional, de Deus. Aquela liberdade de todos que seria a mais perfeita igualdade. Que eleva a liberdade com elevação simultânea da igualdade. Infelizmente os atos humanos não apontam, em geral, salvo as honrosas exceções de sempre, para tal.

                            Vitória, quarta-feira, 16 de outubro de 2002.

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