sexta-feira, 6 de janeiro de 2017


O Vício das Palavras

 

                            Quando eu disse que comer era um vício implantado na gente principalmente pelas mães, um certo e falecido JW, que trabalhava para o Ministério da Fazenda no PF Amarílio Lunz, em Pedro Canário, divisa com a Bahia, riu, achou que era brincadeira.

                            Não era.

                            De fato, é um vício, e um vício que leva alguns a doenças variadas, entre as quais a obesidade, de que padecem 25 % dos brasileiros e 50 % ou mais dos americanos – para se ter idéia da gravidade de tal vício.

                            Mas, o vício das palavras atinge quase 100 % da humanidade, se não a todos. Nós falamos obsessivamente. Para quem pensa que não, lembre-se que ouvimos rádio, vemos/ouvimos TV, lemos jornais, revistas, Internet, livros. Quando não, como eu, estamos escrevendo. Dialogamos. Falamos sozinhos em som alto ou em nossas cabeças (dizemos “com nossos botões”). Nós falamos o tempo todos, pelo menos 16 horas por dia ¾, 75 % do nosso tempo, e às vezes também dormindo, quando estamos parcialmente livres da prisão das palavras.

                            Como se diz do gene, poderíamos dizer num exagero idealista que a palavra é egoísta; construiu o ser humano para que fosse falada. Na Bíblia se diz que “No princípio era o Verbo”. Não só no princípio, no meio e no fim também, pois a palavra se dirige à total abstração, à Tela Final, onde Deus, um só, compreende e integra tudo. Lá, na abstração total, a Palavra não precisa mais dos seres corpóreos.

                            A palavra é tão poderosa que quando Tim Tones tirou aqueles infelizes à palavra pelo suicídio coletivo nas Guianas, houve um clamor mundial. Todo suicídio é suspeito, a eutanásia é condenada, tudo que tire o ser humano à escravidão da palavra. Quando, mais vastamente, os seres humanos fogem à civilidade pela agressão sociopática ou psicopática, é a palavra da Lei que estão negando, e, como denunciou Foucault, são vigiados e punidos. Isso rende milhares de teses de mestrado e doutorado.

                            Poucos fogem ao poder excessivo da palavra e somente conseguem isso se escondendo em selvas, em desertos, ou no Ártico ou na Antártica. Entretanto, levam consigo o poder da palavra, porque dentro de suas cabeças continua (m) ressoando uma ou mais línguas. E onde quer que se leve um comunicador ou um (a) companheiro (a) humano (a), lá estará a palavra.

                            Inescapável, viciante palavra.
                            Vitória, terça-feira, 12 de novembro de 2002.

Nenhum comentário:

Postar um comentário