quinta-feira, 12 de janeiro de 2017


Eternidade

 

                            Muitas vezes ouvimos gente pedindo para viver para sempre, mas quando assistimos a morte de um ente querido só podemos pensar que alguém assim deve ser um cretino. Quem vive mais sofre mais perdas. Como não há realmente jeito mesmo com a Via Óctupla de Buda de deixar de gostar totalmente (nem faria o mínimo sentido, sobre essa ausência ser uma tortura ainda maior), o apego fatalmente vai produzir dilacerante dor acumulada.

                            Fora Deus, que é o único que de fato pode ser eterno, é bom que a ninguém caibam tais dores. E Deus, com toda certeza, deve ter um modo de fazer sobreviver seus gostos até a dissolução da memória, se é que Deus esquece de algo alguma vez. Isso, com toda certeza está fora da nossa capacidade de raciocínio, escapa ao nosso tirocínio.

                            Quanto aos demais, até mesmo gente muito idosa, e MUITO que nem tivesse sentido aos olhos humanos, haveria de achar essa dádiva um peso insuportável ao pensar que as dores de desaparecimento de agora seriam renovadas fatalmente em algum futuro. Quem poderia gostar de uma existência assim? Se nós suportamos a perda de pais e mães, de amigos e de outros, é porque temos a certeza de que morreremos também, e há a remota chance anunciada pelos religiosos de uma outra vida, mais a vaguíssima esperança que seja de voltarmos a encontrá-los em consciência. De outro modo, como suportar tal pressão? Acho que seria demais, talvez castigo em lugar de benefício. Vida eterna, tá, mas até as mansões de Hollywood podem ser chatas depois de um tempo. Até a vida de Bill Gates pode ser enjoada, década após década fazendo crescer a Microsoft.

                           Vitória, segunda-feira, 09 de dezembro de 2002.

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