quinta-feira, 19 de janeiro de 2017


Cientificamente Analfabeto

 

                            Num de seus textos o há alguns anos falecido astrofísico e divulgador científico americano Carl Sagan falou dos que não são cientificamente alfabetizados. Outrora, antes do modelo, eu teria ficado irritado com essas pessoas, porque me parecia que elas se assentavam no mundo e não se davam ao trabalho de conhecer, bastando-se a si próprias e desprezando o saber. Agora minha percepção é mais completa, creio.

                            Pois, veja, no Conhecimento (Magia/Arte, Teologia/Religião, Filosofia/Ideologia, Ciência/Técnica e Matemática) geral a Ciência é só um nono (1/9). Uma pessoa cientificamente alfabetizada pode ser magicamente analfabeta. Olhe ainda que a Ciência é composta de Física/Química, Biologia/p.2, Psicologia/p.3, Informática/p.4, Cosmologia/p.5 e Dialógica/p.6. A Dialógica se abre na Lógica geral e na Dialética geral. Só a Física já é um mundo, separada (no modelo) em sete teorias, quatro verdadeiras, duas montadoras e uma central. Uma pessoa pode ser fisicamente alfabetizada e informaticamente analfabeta.

                            Por quê castigar os “cientificamente analfabetos”? Qual a razão de a ignorância em Ciência ser tão repudiada e as outras não?

                            Veja que podemos estabelecer uma progressão: péssimo, muito ruim, ruim, médio, bom, muito bom, excelente – sete níveis de conhecimento. Seja de 1 a 7, ou percentualmente de 1 a 100, ou ainda 20 = 1, 27 = 128 para cada um. Então, como são nove conhecimentos diferentes, (27)9 = 9.1018, para abarcar o Conhecimento TODO em nível de excelência. Ninguém conseguiria chegar nem perto. Resumindo, somos todos ignorantes, estúpidos mesmos. O que há é essa “douta ignorância” de que falavam os filósofos da Idade Média.

                            Se contarmos apenas 1 a 7, teremos 7 x 9 = 63.

                            De quaisquer raciocínios que possamos ter se seguirá sempre que somos, todos e cada um, ignorantes. Porque zombar dos “cientificamente analfabetos”, ou dos “informacionalmente analfabetos”, ou de qualquer analfabetismo? Como não zombamos mais dos anões, nem dos deficientes físicos e mentais, nem de tantas coisas preconceituosas de antes, há também esse preconceito a vencer. Por quê seria útil, em meio a tantas atividades e problemas da vida das pessoas (indivíduos, famílias, grupos, empresas) e ambientes (municípios/cidades, estados, nações e mundo), ser cientificamente alfabetizado? Ninguém consegue sequer compreender as urgências da vida e do trabalho, de sustentação da família e de si - quanto mais penoso seria ser alfabetizado em qualquer dos modos do Conhecimento!

                            Isso é de alguma urgência? É fundamental? Vale a pena as tensões que irá criar no meio? Vale os conflitos dos pessoambientes, das políticadministrações, dos governempresas? Não seria melhor um tratamento mais brando? Não fazer exigência forte nenhuma? Imagine cada um dos nove modos de conhecer, cada um com seis níveis ou tratamentos diferenciados, cada um dos quais com seis teorias, cada teoria com seus laboratórios ou práticas associadas: quem teria condições de mesmo minimamente abarcar sequer uma fração disso tudo?

                            Vemos que a solicitação de Sagan e outros é descabida, querendo chamar atenção excessiva para seu particular modo de conhecer.

                            As pessoas não podem ser pressionadas assim. Aliás, se forem, caberá aos outros modos fazer exigências também, quer dizer, os filósofos poderão exigir que todos sejam “filosoficamente alfabetizados”. E do mesmo modo os religiosos – até os ateus deveriam se submeter a alfabetização religiosa, porque isso poderia avançar por pressão à condição de lei ou obrigatoriedade ou tolhimento da liberdade. Como disse o TAO quem faz muitas leis é porque não sabe governar.

                            Você já imaginou o cenário de guerra?

                            Vitória, domingo, 29 de dezembro de 2002.

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