domingo, 1 de janeiro de 2017


Complexidade do Concorde

 

                            Vi uma reportagem contando o fracasso de vendas que se tornou o Concorde, o consórcio anglo-francês que pretendeu destronar a Boeing e sua liderança mundial.

                            Por fora o Concorde tinha aquela forma aparentemente aerodinâmica, com o nariz inclinando-se, como uma agressiva águia. Portanto, agradaria, em princípio, um dos dois pólos do par polar oposto/complementar formestrutural – o lado da forma. Era “ocidental”, reto, agressivo, enquanto os 747 são bojudos, arredondados, com uma crista em cima, dando sentido de poder contido, de uma enorme massa bruta.

                            Por falta de planejamento a audácia do lançamento, com aquele furor de voar acima da barreira do som e o aparente atrevimento conceitual, planejou vender 600 ou mais unidades, depois baixou a expectativa para 100 e finalmente vendeu algumas dezenas.

                            Na prática gastava tremenda quantidade de combustível, fazia um barulho terrível e a falta de manutenção das poucas unidades vendidas acabou por derrubar vários. Fracasso extraordinário, cuja geo-história ainda não está bem contada. Que sirva de lição a todos.

                            Depois, mostraram que por dentro a aviônica não era de última geração, era da década dos 1960 cheirando a avanços da década dos 1940. Onde os aviões americanos tinham muita computação embarcada, os Concorde tinha centenas de botões, sobrecarregando a memória dos pilotos, cansando-os tremendamente.

                            Toda firma deveria ler não apenas as GH de sucessos, mas principalmente as dos fracassos, porquanto isso nos prevenirá contra esse orgulho, essa tolice exposta ou sutil que faz avançar contra a corrente da GH mais rápida e potencialmente lucrativa, o minimax (máximo com o mínimo), o sentido de enxugamento socioeconômico total. Não ter procurado simplificar ao máximo, dentro do conceito de simplexo (o máximo de simplicidade possível requerida pela complexidade mais extremamente útil) derrotou o Concorde e todo um modo europeu de ser e estar. Como os americanos se colocaram na frente neste particular, foram depois derrotados provisoriamente pelos japoneses na questão dos carros, dos televisores, das máquinas fotográficas e de filmar, dos walkman, etc.

                            Na realidade essas geo-histórias de fracassos acabam por ser valiosas lições para toda a humanidade. Acho-as maravilhosas. Deveriam estar sendo repetidas até a náusea nas salas de aula, desde o pré-primário até o pós-doutorado. Ouvi-las talvez evite que façamos outros Concordes no futuro, que cheguemos a esses tremendamente vistosos fracassos.

                            Por outro lado, podemos procurar enquadrar os sucessos sob a ótica daquele enxugamento socioeconômico da maior potência, aquela espantosa vivacidade e integridade de fazer com todos os mínimos possíveis render o máximo. É disso que a humanidade precisa sempre.

                            Vitória, segunda-feira, 21 de outubro de 2002.

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