Complexidade do Concorde
Vi
uma reportagem contando o fracasso de vendas que se tornou o Concorde, o
consórcio anglo-francês que pretendeu destronar a Boeing e sua liderança
mundial.
Por
fora o Concorde tinha aquela forma aparentemente aerodinâmica, com o nariz
inclinando-se, como uma agressiva águia. Portanto, agradaria, em princípio, um
dos dois pólos do par polar oposto/complementar formestrutural – o lado da
forma. Era “ocidental”, reto, agressivo, enquanto os 747 são bojudos,
arredondados, com uma crista em cima, dando sentido de poder contido, de uma
enorme massa bruta.
Por
falta de planejamento a audácia do lançamento, com aquele furor de voar acima
da barreira do som e o aparente atrevimento conceitual, planejou vender 600 ou
mais unidades, depois baixou a expectativa para 100 e finalmente vendeu algumas
dezenas.
Na
prática gastava tremenda quantidade de combustível, fazia um barulho terrível e
a falta de manutenção das poucas unidades vendidas acabou por derrubar vários.
Fracasso extraordinário, cuja geo-história ainda não está bem contada. Que
sirva de lição a todos.
Depois,
mostraram que por dentro a aviônica não era de última geração, era da década
dos 1960 cheirando a avanços da década dos 1940. Onde os aviões americanos
tinham muita computação embarcada, os Concorde tinha centenas de botões,
sobrecarregando a memória dos pilotos, cansando-os tremendamente.
Toda
firma deveria ler não apenas as GH de sucessos, mas principalmente as dos
fracassos, porquanto isso nos prevenirá contra esse orgulho, essa tolice
exposta ou sutil que faz avançar contra a corrente da GH mais rápida e
potencialmente lucrativa, o minimax (máximo com o mínimo), o sentido de
enxugamento socioeconômico total. Não ter procurado simplificar ao máximo,
dentro do conceito de simplexo (o máximo de simplicidade possível requerida
pela complexidade mais extremamente útil) derrotou o Concorde e todo um modo
europeu de ser e estar. Como os americanos se colocaram na frente neste
particular, foram depois derrotados provisoriamente pelos japoneses na questão
dos carros, dos televisores, das máquinas fotográficas e de filmar, dos
walkman, etc.
Na
realidade essas geo-histórias de fracassos acabam por ser valiosas lições para
toda a humanidade. Acho-as maravilhosas. Deveriam estar sendo repetidas até a
náusea nas salas de aula, desde o pré-primário até o pós-doutorado. Ouvi-las
talvez evite que façamos outros Concordes no futuro, que cheguemos a esses
tremendamente vistosos fracassos.
Por
outro lado, podemos procurar enquadrar os sucessos sob a ótica daquele
enxugamento socioeconômico da maior potência, aquela espantosa vivacidade e
integridade de fazer com todos os mínimos possíveis render o máximo. É disso
que a humanidade precisa sempre.
Vitória,
segunda-feira, 21 de outubro de 2002.
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