sábado, 31 de dezembro de 2016


Válvula K e Evolução

 

                            No Livro 7 falei da Válvula K, vá ler. O K é de Arthur Koestler (húngaro naturalizado inglês, 1905-1983, 78 anos entre datas, se suicidou, mas fez coisas formidáveis), que falou dos hólons (no grego, holo, todo, e on, parte, todoparte ou partodo, pois cada conjunto é parte de outro, e é composto de seções).

                            A questão então era perguntar sobre os cimentos, as colas que ligam o inferior e o superior, impedindo o retorno ao nível pretérito. Por exemplo, como é que os replicadores dentro da célula não retornam à liberdade, como é que eles devem suportar e aceitar a igualdade, trabalhando juntos para um nível mais alto de liberdade?

                            Como é que homem e mulher se juntam na sociedade denominada casamento, se ela é boa e ruim ao mesmo tempo? Como parte boa propiciaria uma união momentânea, mas cada um herda a parte ruim e permanece sustentando-a. Como é que famílias se agrupam?

                            E assim é para toda a micropirâmide (campartícula fundamental, subcampartículas, átomos, moléculas, replicadores, células, órgãos e corpomente), toda a mesopirâmide (indivíduos, famílias, grupos, empresas, municípios/cidades, estados, nações e mundo), toda a macropirâmide (planetas, sistemas estelares, constelações, galáxias, aglomerados, superaglomerados, universos e pluriverso).

                            Observe que há uma FITA DE HERANÇA, FH, digamos o ADRN, para comparar, na qual é armazenado o info-controle que permite e estimula a transação das ondas, no sentido da construção dos níveis cada vez mais complexos. Qual é a FH do próprio cimento, da cola? Pois há uma cola entre os indivíduos dentro de uma família. Essa cola é formestrutural, composta de formas e estruturas, digamos gestos e palavras, respectivamente. Quais gestos e quais palavras? Que gestos e que palavras mantém unidas as famílias? Como é que as famílias herdam essas colas? Sabemos que é pela educação, as chamadas Escola da Vida, prática, e a Vida da Escola, teórica, a prateoria da Vida-racional. Quantos tipos de colas existem? Quantas são as formestruturas das colas familiares, em especial?

                            De quantos modos universais e em quantas variações locais podem as famílias se produziremorganizarem? Pela Psicologia familiar (figuras ou psicanálises familiares; objetivos ou psico-sínteses familiares; produções ou economias familiares; organizações ou sociologias familiares e geo-histórias ou espaçotempos familiares) a Família (em maiúscula, conjuntos ou famílias ou grupos ou universais ou arquétipos ou idéias), inserida num tempespaço particular e geral, produz-e-organiza.

                            Ora, se existe, como existe, uma válvula KF (K da Família), uma cola F, um cimento F, como é ele, como pode ser melhorado, como pode ser atacado, como pode ser fragilizado, como pode ser fortalecido, como pode ser melhorado, como pode ser democratizado, como pode ter acesso a maior liberdade sem prejudicar a igualdade (e vice-versa)? Como a Kola F pode ser trabalhada? Em primeiro lugar, deveríamos conhecer seus componentes, suas partes, seus elementos, para então compor deles um modelo interpretativo segundo os modos do Conhecimento (Magia/Arte, Teologia/Religião, Filosofia/Ideologia, Ciência/Técnica e Matemática).

                            Como se deu a evolução das válvulas? Como é que as válvulas ajudaram a estabelecer a evolução, trancando cada revolução num patamar imediatamente acima e criando novas oportunidades de predação? Como é que uma empresa pode lidar com sua própria válvula K, a KE (cola empresarial)? Como é que os trabalhadores podem entender melhor e usar esse novo poder? Como é que os sete níveis políticos (povo, lideranças, profissionais, pesquisadores, estadistas, santos/sábios e iluminados) contribuem para colar ou descolar os processos? Vê quantas perguntas novas há para fazer e responder?

                            Imaginou quantas emoções novas?

                            Vitória, quarta-feira, 02 de outubro de 2002.

Tupiniquins

 

                            Por um tipo de resistência qualquer à presença corporal e mental do estrangeiro no Brasil, desde 1500, deram de nos chamar de civilização tupiniquim, um orgulho, uma tolice às avessas.

                            Não somos tupiniquins, nem tupinambás, nem gês, nem só indígenas de qualquer tribo. Não somos negros africanos, nem brancos europeus, nem amarelos asiáticos. A dificuldade dessa gente é aceitar que sejamos aquele povo mestiço novo de Darci Ribeiro. A dificuldade maior é aceitar a novidade, que não tem parecença ou semelhança com nada anterior, que tem realmente no âmago uma novidade que precisa se afirmar totalmente.

                            É fácil regredir.

                            É fácil retornar à segurança do passado, que já é grandemente (mas não totalmente) conhecido.

                            É fácil optar pelo conforto do já sabido, em vez de caminhar para o futuro, para o desconhecido, para nossa auto-afirmação. Não queremos estar acima, porém também não queremos estar abaixo.

                            Esse nativismo é inoportuno, porque o futuro não é tupiniquim.  Tupiniquem? É o Brasil como um todo que está caminhando para frente, que deseja, que necessita participar da luta pela sobrevivência do presente mais apto. Afirmar só os negros é deixar de fora os brancos, os amarelos e os vermelhos. E assim para cada afirmação solitária.

                            Mas, afirmar a totalidade da brasilidade é levar todos e cada um. A invenção desse futuro total, que é quadripartite, essa é MUITO MAIS difícil, verdadeiramente obra de gigantes. Afirmar só os tupiniquins, ainda por cima uma de todas as tribos, é voltar à tribalidade, é excluir a Ásia, a África, a Europa, é apostar na trivialidade, na banalidade, numa qualquer partição em nome da revolta contra o estrangeiro. Pois, veja, os tupiniquins eram estrangeiros também, de 12 mil anos atrás, esses que sucederam os de 15 mil anos atrás, e quem sabe mais quantos.

                            A grande luta – como se vê, conosco mesmo, como disse Milton Nascimento – é para aceitar a grandeza de aceitar a todos.

                            Vitória, quinta-feira, 19 de setembro de 2002.

Experimentalismo

 

Experimento é aquilo de que necessitamos.

Experimentalismo é excesso, é doença mental da superafirmação do experimento a todo instante: como disse alguém de outra forma, aquele que tem martelo quer que tudo mais seja prego. ISMO é a doutrina da supressão do direito alheio de pensar diferente, ISTA é o doutrinador, aquele que abraça e prega ardentemente a doutrina de eliminação dos demais, exceto seus parceiros, que superafirmam na mesma linha.

A DIFERENÇA ENTRE UM E OUTRO

Resultado de imagem para curva do sino
Experimentalismo.
Experimento.
Média.
Sapiência.
Sapientismo.
2,5 % e associados.
90,0 %.
2,5 % e associados.

A gente vê os cantores jovens querendo conseguir seu lugar no chamado “palco da vida” – projetar-se, evidenciar-se. E então, toca experimentalismo, o exagero de experiências com voz, cenários e instrumentos, não uma e outra vez, mas o tempo todo, o que fica enjoado. Qualquer destaque numa Terra tão cheia de gente, tão absurdamente complexa, não é propriamente fácil de conseguir, daí eles ficarem impingindo a toda gente esses abusos.

Se não houver experimento, como mudaremos?

Contudo, se houver só experimento o tempo inteiro, como memorizaremos e teremos chance de destacar os elementos de topo?

Por conseguinte, esperamos que o experimentalismo se restrinja aos 2,5 % ou 1/40 de tudo e não passe disso. Não é à toa que a tradição é apreciada.

Vitória, sábado, 31 de dezembro de 2016.

GAVA.

Tirania Computacional

 

                            De repente eu soube de uma notícia maravilhosa, sobre um avanço tecnológico que acabará com a tirania computacional dos EUA, Europa e Japão sobre os supercomputadores. Em Campinas, São Paulo, creio, reuniram 20 microcomputadores, desses que temos em casa, juntaram um roteador qualquer e fizeram um supercomputador caseiro, terceiro-mundista, o que soa como o dobre de finados do domínio americano, em todos os sentidos, em particular no campo da informática.

                            É que, pense só, em vez de pagar US$ dois milhões, agora 6,6 milhões de reais, esse conjunto ficará por 200 mil reais, 1/33 daquele valor. As implicações são formidáveis. Ninguém mais dependerá de o Congresso americano se reunir para votar a venda/compra de um SC. Se cada micro custa agora mil dólares, 20 deles ficam por US$ 20 mil, 66 mil reais, um terço daqueles 200 mil, o resto sendo processos de conexão.

                            Não se trata mais de a Nicarágua dispor de 33 vezes tanto quanto, nem de depender de julgamento americano, europeu ou japonês para liberar as máquinas. DE REPENTE, assim do nada, surge essa notícia extraordinária, a que quase ninguém deu bola. A Nicarágua pode ter, pelo mesmo preço, 33 supercomputadores para suas universidades, seus institutos, seus órgãos de governo, suas empresas. Um salto revolucionário, o mais importante de que tenho notícia, algo que promete mesmo mudar a geo-história do terceiro mundo e do planeta inteiro.

                            Porque, veja, os computadores estão dando saltos contínuos. O primeiro que compramos, há apenas seis anos, era um de 400 megas de memória, 66 MHz, ao passo que agora, pela metade do preço, podemos obter um de 40.000 megas (40 gigas), 2.000 MHz, ou seja, 100 x 30 = três mil vezes tanto quanto. Em outros seis anos, se multiplicar por três mil novamente, em doze anos terão dado um salto de nove milhões. Enquanto a arquitetura dos supercomputadores do primeiro mundo é fechada, a da reunião daqui é aberta, pode ser continuamente melhorada, apenas reunindo as peças. O conserto dos de lá depende de enviar a máquina inteira à matriz ou da vinda de tecnocientistas de hora caríssima até aqui, ao passo que a assistência daqui está a poucos passos, basta saber consertar os micros, e para isso há técnicos em cada esquina.

                            Poucos podem pagar 6,6 milhões, ao passo que MUITAS firmas do ES podem gastar 200 mil para ter uma inigualável capacidade de computação.

                            Então, expanda sua mente para cada ramo do conhecimento humano, desde computação gráfica, CAD/CAM, Autocad, tudo, e pense nas possibilidades que essa oportuníssima invenção abriu para todos os que estão atualmente sob as botas dos tiranos informacionais.

                            Eis aí uma significativa encruzilhada geo-história que reposiciona todos os atores do jogo tático-estratégico mundial. Bem debaixo do nosso nariz está acontecendo uma alteração GH das mais importantes, fundamental mesmo.

                            Vitória, quinta-feira, 19 de setembro de 2002.

Projetando um Novo Vestibular

 

                            Muitas vezes os alunos não conseguem pegar bem as matérias, mesmos nas melhores escolas, com os professores mais cuidadosos; sempre pairam dúvidas. Ademais, há alguns professores melhores que outros, de pedagogia mais apurada, de dicção melhor, com mais recursos. E não há ninguém que possa fazer ao vivo melhor que poderia fazer com tempo muito mais longo, com mais espaço, com mais recursos humanos e outros.

                            Um laboratório cinematográfico, como o da Globo e outros, recursos de modelação computacional, pesquisa & desenvolvimento teórico & prático, a busca das universidades, pilhérias, brincadeiras, piadas, documentários, refilmagens, todo tipo de ajuda poderiam compor as mais primorosas aulas para terceiros anistas do segundo grau, quer dizer, vestibulandos. Dúzias e até centenas de profissionais enquadrando cada segundo.

                            Como são 210 dias letivos por ano e há cinco aulas por dia, cada uma de cinquenta minutos, 210 x 5 x 50 = 52,5 mil minutos/ano; em horas 875 aulas/ano. Digamos 800 num programa padrão comprimido para matemática, física, química, língua (inglês, francês, espanhol), português, biologia, geografia, história – mais para umas que para outras. Com sobrecarga ou alternativas nos pontos unanimemente difíceis, sabendo-se por pesquisas. A Globo já tem o Telecurso primeiro e segundo graus, que é gratuito, e já publica em papel, de modo que compor um novo sistema não deve ser difícil.

                            Segundo o Almanaque Abril 2000 o número de alunos matriculados no ensino médio foi de 7,8 milhões em 1999, enquanto o AA 2002 diz que em 2001 foi de 8,4 milhões, crescimento de 7,7 % em dois anos, taxa muito alta. Do total de 1999 vemos que a rede particular tinha 1,2 milhão, 16 %, enquanto a rede pública ficou com 6,6 milhões, 84 %. Entretanto, as escolas particulares ficaram com 75,3 % das vagas do vestibular, três quartos do total. Sendo a relação pública/particular 84/16 = 5 quanto a frequentadores do segundo grau, os que passam aos terceiro grau ficam na relação de 1/3, então a relação é negativa em relação ao estudo nas públicas na base de 15/1 (5 x 3). Como as privadas tinham (na suposição de que sejam três terços, um para cada ano do segundo grau) 0,4 milhão em 1999 e 75 % passaram, suas ficaram sendo cerca de 300 mil vagas. Se a faculdade for feita em quatro anos, o 1,545 milhão de vagas de 1999 em todo o ensino superior dividido por quatro nos daria cerca de 390 mil vagas/ano, o que quer dizer que menos de 100 mil vagas pertencem por direito torto aos filhos do proletariado.

                            Esses dados precisam ser apurados por pesquisadores com convenientes bancos de dados, mas já nos permitem ter uma ideia da coisa. Agora, se existem aqueles 6,6/3 = 2,2 milhões de estudantes a cada terceiro ano tentando o vestibular vindos das escolas públicas e só 100 mil vão passar, a relação é 2.200/100 = 22/1, o que quer dizer que pais aflitos, para melhorar as condições de seus filhos, quererão alugar as fitas ou DVD ou CD-ROM, ao que os pais das classes médias alta e baixa, e os ricos desejarão com ainda maior força. Os médio-altos e ricos alugarão por si, as prefeituras e estados para os das públicas.

                            Lembremos que são 800 aulas, cada uma a 3,5 (para fita) ou 4,5 (para DVD) reais, no total, no ES, 2,8 a 3,6 mil reais POR ALUNO, e são milhões no país todo, fora os que já saíram das escolas e continuam tentando. Isso poderia ser muito apurado, mas não tenho os dados e eles são apenas parcialmente apresentados pelos almanaques.

                            Se tomarmos 10 % das 800 fitas como sendo as matérias mais visadas (é preciso estudar com a Curva de Gauss – consulte-se estatísticos), 80 x 400 mil vagas (agora já são 500 mil em 2002) x 4 reais por fita = em torno de 130 milhões por ano, na mais pessimista das hipóteses. Na realidade, contando que várias pessoas estão fora das escolas e continuam tentando, que talvez 50 % das aulas interessem e em algumas cidades é mais que quatro reais, podemos ter valores razoáveis que chegariam a 20 vezes isso por ano.

                            É só uma avaliação grosseira, é preciso apurá-la.

                            Alguém faça isso.

                            E eu não sei quanto custa preparar uma fita dessas, nem os demais detalhes. Em todo caso parece um grande negócio. Sem falar que de três em três anos, como faz a Microsoft, seria possível renová-las tipo Aula 1.0, etc. Como o Colégio Vetor fez na década dos 1970 ao renovar os cursinhos, a Globo (ou outras) pode (m) transformar totalmente de agora em diante a questão do ensino em casa.

                            Pode (m) reunir os melhores especialistas, todas as tecnartes, recursos maravilhosos que não estavam disponíveis há 30 anos, uma rede de vendas em bancas de revistas, em lojas e outros lugares, os avanços pedagógicos, um suporte, expectativa de crescimento (com grande cuidado, sem começar com nada de muito aparatoso, como a segunda viagem de Colombo). É preciso prever um horizonte de quatro anos para os retornos e ganhos palpáveis a partir de dez anos.

                            Mas isso pode se espalhar no mundo inteiro, que é 40 vezes o Brasil, de modo que as rendas podem ir de cinco a 100 bilhões de reais por ano. Claro que o otimismo multiplicador não serve senão para perder os afoitos, mas que é uma mina potencial isso lá é mesmo.
                            Vitória, quarta-feira, 25 de setembro de 2002.

Programação da Dor

 

                            Entendi pelo modelo que há duas propriedades extraordinárias, a SOMA ZERO e o PRODUTO UM, que na Matemática chamaríamos de “elemento neutro da soma” (zero, 0) e de “elemento neutro da multiplicação” (um, 1), ou seja, A + 0 = A e A.1 = A.

                            Pela SZ podemos dizer que todos os ângulos são zero (a Terra seria, idealmente, uma esfera perfeita; se não é devemos contar que a soma de todas as descidas e todas as subidas, todas as reentrâncias, seja zero). A soma de todas as energias da mecânica térmica, termomecânica, deve ser zero, pelo que os terremotos podem ser somados para obter a acumulação vazante de calor, digamos assim, a energia térmica que vazará em algum ponto, rachando a superfície da Terra ou o fundo do mar.

                            Pelo PU devemos contar que se a inflação do Brasil foi durante largo tempo alta, durante um tempo ainda maior será pequena, e que se há uma tempestade muito forte ela se esgotará rapidamente, ao passo que uma chuva muito fina poderá perdurar dias.

                            Essas coisas são importantíssimas para entendermos o mundo, em particular o mundo psicológico/p.3, quer dizer, as almas humanas, porque essas duas determinações DEVEM EXISTIR EM TODA PARTE, desde a Física/Química, a Biologia/P.2, a Psicologia/p.3, a Informática/p.4, a Cosmologia/p.5 até a Dialógica/p.6, de forma que poderemos entender melhor o universo e suas construções.

                            Por exemplo, deve acontecer NECESSARIAMENTE pelo PU (produto um) que certos termos envolvidos na SZ (soma zero) da gravinércia (Gravidade – Inércia = G – I = 0) do Sistema Solar, digamos a circulação dos planetas em volta do Sol, deve ser igual a um, isto é, a fórmula F = G m1.m2/d2 deve nos proporcionar sempre produtos iguais a um, quer dizer, F(Mercúrio) = F (Vênus) = F (Terra), etc., PARA CADA OBJETO do SS. Sendo uma das massas sempre a do Sol, ficamos com d2/G.S = O/F, sendo S a massa do Sol e O a massa do objeto, o termo à esquerda sendo uma constante, pelo que a divisão à direita também será. Isso, pela própria fórmula, é sempre verdadeiro, por definição, pela presença já determinada do sinal de igualdade. Agora, na falta de alguns elementos podemos colocar outros por tentativa e erro nas supermáquinas computadoras, de tal modo que a unidade se faça. E com outras fórmulas será possível fazer muito.

                            Bom, a questão agoraqui não será essa.

                            A questão é bem outra.

                            As pessoas só estão vendo o lado bom da viagem dentro do túnel do futuro. Só vêem no futuro coisas brilhantes e maravilhosas. Acontece que 2002 é o futuro de 2001, e de todos os séculos passados; se há brilho agora, também há densas trevas, e isso continuará a acontecer sempre, em qualquer futuro, de modo que não nos devemos deixar enganar por quem quer que seja, digamos os futurologistas, que usam o futuro como um capital da burguesia, prometendo para diante o que não tivemos para trás. Quer dizer, se não tivemos antes pelo menos teremos depois.

                            Não é verdade, ou pelo menos não é verdade no sentido de termos só coisas boas. Quanto mais brilhante o futuro se tornar mais sombrio igualmente será. Se crescerem as liberdades das elites crescerão as desigualdades e se crescer a igualdade popular geral com ela diminuirá a liberdade das elites, A MENOS QUE AMBAS CRESÇAM JUNTAS.

                            Portanto, se pudermos administrar as coisas da mente humana, para proporcionar alívio a lancinantes dores psicológicas, COM CERTEZA poderemos também construir pesadelos terríveis, assombrações apavorantes. Se pudermos controlar as dores aprenderemos como fazê-las se apresentarem no corpomente humano.

                            Pois para cada órgão externo do corpo humano há uma correspondência interna na mente. Há um olho-do-corpo e um olho-da-mente. Se há um sistema auditivo externo, há um sistema auditivo interno. Dominar o SAI é poder provocar na mente sons que nunca foram gerados fora. Havendo um sistema visual externo e um sistema visual interno, dominar a este é poder construir quaisquer imagens, que nunca estiveram no mundo exterior. Como saberemos o que é real e o que é fictício?

                            As dores poderão ser construídas dentro do cérebro humano, com as tenebrosas conseqüências previsíveis. São perspectivas assombrosas mesmo.

                            Vitória, terça-feira, 24 de setembro de 2002.

Pessoas que Pensam

 

                            No livro de Angélica Sátiro e Ana Mírian Wuensch, Pensando Melhor (iniciação ao filosofar), São Paulo, Saraiva, 1977, p. 351, elas dizem: “A todo instante os meios de comunicação ressaltam a importância das pessoas que pensam”, grifo meu.

                            Quem são as pessoas que pensam?

                            Não são os fungos, nem as plantas, nem os animais, são as pessoas, pois está dito que são PESSOAS QUE PENSAM. A primeira característica é serem pessoas. São pessoas, e pensam. Mas existirão pessoas que não pensam? Mesmo os mongolóides, portadores da síndrome de Dawn, pensam. Na realidade, se virmos uma reta na horizontal e imaginarmos que ela é o conjunto de memorinteligência, a subida de um lado corresponderá à descida de outro, havendo, no entanto, retas cada vez mais altas e cada vez mais baixas a partir dessa média. SE a média for 100, ter 70 de memória significará ter 30 de inteligência, ou vice-versa; mas sempre poderemos ter alguém com uma média de 400, digamos. Há aquela gente superfocada na memória, há a gente superfocada na inteligência, e há gente que tanto possui de uma quanto de outra.

                            Mas, pelo fato de ser sempre MEMÓRIA HUMANA e INTELIGÊNCIA HUMANA, é sempre humana, característica do pensar. Então pensar, como o entendemos, é sempre humano. Como os outros seres humanos desapareceram antes de nos entendermos como tais, antes de 10 mil anos atrás, se segue que todo pensar na Terra hoje é humano. A racionalidade animal é, por definição, não-humana.

                            Todos os seres humanos pensam, e dizer-se humano é dizer-se pensador. A característica central é esta. Poderíamos dizer de um corpo que não tivesse um cérebro humano, mas sim as conformações gerais, que é um corpo humano, porque serviria para integrar a formestrutura completa de um corpomente humano. A característica central, não obstante, estaria excluída. Não compreendemos uma criança como plenamente humana até que ela fale, que é uma característica fundamental, a de poder linguajar, falar.

                           Para resumir, todos os seres humanos pensam, de alguma maneira. Essa é a definição de humanidade, o pensar.

                            O que quereríamos dizer com “pessoas que pensam”? Uma vez, na Fazenda Clube Santa Tereza, na cidade de mesmo nome no ES, um conhecido, meu xará, se dirigiu a mim dizendo: “Nós, as cabeças pensantes...”. É assim que as elites agem, com o objetivo de excluir o povo, dizendo que o povo não pensa. O povo pensa, só não o faz com os detalhes que o ócio possibilita às elites. O povo deve carregar o mundo às costas, razão pela qual não pode parar para pensar.

                            Entretanto, lembremos que as pessoas (indivíduos, famílias, grupos e empresas) e os ambientes (municípios/cidades, estados, nações e mundo) são aglomerações crescentes de poder de raciocínio. Nenhum ser humano pode pensar tanto quanto ou mais que uma nação, e esta é tanto composta de povo quanto de elites.

                            Por “pessoas que pensam” as autoras certamente querem dizer as pessoas que pensam com mais afinco, com mais vigor, com mais atenção, com mais constância, com mais determinação. Mas que pode haver de tão maravilhoso nisso? Há pessoas que correm mais que eu, que saltam mais, que mergulham durante mais tempo e mais fundo, que arremessam lanças e que fazem tantas outras coisas de que não sou capaz, e eu não sinto admiração nenhuma por isso. Por quê o contrário deveria ser verdadeiro, excepcionalmente? É maravilhoso, sim, o que algumas pessoas fizeram, mas não por outros não terem feito, e sim como anúncio de avanço. Uns têm umas tarefas, outros, tarefas distintas, vivemos todo do conjunto dos fazeres.

                            Então essa frase, “pessoas que pensam”, não passa de segregação, de afastamento, de desautorização para o pensar. Por princípio, como vimos, pensar é de todo ser humano, é a própria definição de ser humano. Pensam negros africanos, brancos europeus, vermelhos americanos e amarelos asiáticos. Pensam mulheres e homens, altos e baixos, crianças e adultos, velhos e novos, ricos e pobres – todos pensam.

                            Daí que, se é chamada atenção para as “pessoas que pensam”, é para dizer que há quem “não pense”, que supostamente teria perdido sua humanidade. É uma declaração fortíssima, embutida numa passagem aparentemente simplória. Quem não pensa? Como sabemos que não pensam? Quais são os critérios para identificarmos os que não pensam? Quem atribuirá as notas dos quesitos? Com quais interesses? Para favorecer a quem?

                            Muitas perguntas deveríamos fazer.

                            É inquietante que de alguns seja tirado o que define a humanidade. Dizia-se outrora que as mulheres não pensavam, os negros, os bárbaros, os estrangeiros, estes e aqueles, todo tipo de afastamento.

                            É surpreendente que num livro editado por uma grande editora, a Saraiva, em 1997, quase no limiar do século XXI, algo assim seja dito. Pior ainda, logo abaixo elas acrescentam: “Hoje em dia, as empresas começam a divulgar a necessidade de trabalhadores capazes de pensar por si mesmos”.

                            Por quê, antes os trabalhadores não pensavam? Pensavam, sim, claro, só que o pensamento deles não era respeitado. E, pelo que vejo, continua sem ser. O que a pressa de dizer as coisas e a falta de amor pelo próximo podem fazer! Haja Deus para nos salvar da perdição.

                            Vitória, terça-feira, 24 de setembro de 2002.