terça-feira, 6 de novembro de 2018


A Família de Natália

 

Natália tinha a estranha teoria de que mais que “obras primas” os livros eram obras irmãs, irmãs dela, e até pai e mãe, tios e tias. Dizia que os livros (e os autores por trás deles) a tinham criado e que muito devia a eles. Eram seus tutores, seus companheiros, ela gostava muito de ler, era aficionada desde criancinha em família de leitores, todos gostavam de ler e ela embarcou na onda, neném ainda quando a mãe lia para ela numa época em que praticamente não havia TV.

OS LIVROS QUE POUCOS LERAM

Descrição: As Obras-primas que Poucos Leram Vol. 1 - Diversos Autores; Heloisa Seixas (850106811X)
Descrição: http://www.livrariascuritiba.com.br/Imagens%5CLivros%5CNormal%5CLV065389_N.jpg
Descrição: Obras-Primas que Poucos Leram, As - vol. 3 - HELOISA SEIXAS - Record ISBN:8501073377
Descrição: OBRAS-PRIMAS QUE POUCOS LERAM, AS - VOL 4 (2006 - Edição 1)

Com isso de gostar de ler, Natália tinha uma família muito grande, cuidadosamente guardada em estantes primorosas (diferentes das minhas). Ela os lia com todo cuidado, sem marcar como faço. E como desde criança foi levada pelo pai e pela mãe aos lançamentos das primeiras edições, nos quais pegava autógrafos e dedicatórias, acumulou primeiras edições assinadas. As estantes eram de madeira de lei com portas de vidro, pois Natália protegia essa família que a levava a passear por todo o mundo, inclusive passado e futuro, no presente a outras terras, tudo emergindo das consciências e experiências de cada um dos criadores.

Depois que ficou adulta, virou escritora e casou-se, Natália continuou a ir aos lançamentos, ouvia as palestras, consultava os bibliotecários sobre preservação, zelava pelos parentes e amigos. Durante 67 anos depois dos sete ela seguiu essa rotina, fora as da vida, filhos e marido, tarefas variadas.

Então, aos 74 anos, Natália morreu.

Morreu por assim dizer, porque Natália mesma virou livro. A Biblioteca Central fez biografia e lançou em palestra-exposição com várias fotos ampliadas dela, e da biblioteca dela, que filhos e netos trataram de preservar, não apenas como memória da mãe e avó como também porque o conjunto valia muito dinheiro, com todas aquelas primeiras edições assinadas.

Natália foi para “o céu dos livros”, onde os bons humanos são homenageados e onde de cada um que os tratou bem há estátua com pedestal. Natália é a terceira do segundo corredor da ala norte, prédio N. São muitos e muitas que amaram os livros e os respeitaram, mas os livros-pais e os livros-mães sempre levam as crianças para visitar o museu-biblioteca, dizendo, “esta aqui é a Natália”. As crianças-livros param, olham com os olhinhos brilhantes e exclamam: oh!

Serra, quarta-feira, 25 de julho de 2012.

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