terça-feira, 1 de novembro de 2016


Velhote

 

O velhote estava sentado no banco na orla, lá vem a moça nissei, rosto lindo, o rapaz moreno alto e alguns amigos de toda cor, mais para perto dele começou discussão marido-mulher, ela ficou exaltada, quando estava chegando ainda mais próximo falou alto, ele no ato mesmo, na presença de todo mundo, a praia cheia, deu nela um tabefe de estalar, ficou todo mundo paralisado, pasmado, mas ninguém defendeu.

VELHO              TE (fala mansa) – ê, companheiro, que é isso?

MORENO (agressivo) – que que é, hem? Vai querer encarar?

A moça, meio tonta e sem ajuda sentou-se no banco ao lado do velhote, ficou chorando.

MORENO (insinuando-se) – vai querer comer ela?

VELHOTE (sempre tranquilo) – que é isso, moço? Comporte-se.

MORENO (ainda mais nervoso) – comportar o caralho, vai tomar no cú, velhote.

O velhote levantou os dois braços, eram duas braquiorradiais, apontou com a direita o peito, uma safena.

VELHOTE – sou cardíaco, não posso ficar nervoso, risco de morte.

MORENO (soprando, vuh) – é um sopro, hem, velhote, risco de morte procê, né?

E gargalhou de jogar a cabeça para trás.

VELHOTE (levantando-se, juntando os quatro dedos e o polegar, dando uma cutilada na glote do moreno, ela afundou, ele entrou em colapso, arriou aos poucos, em segundos) – não, para você (e sentou-se).

AFUNDAMENTO DA TRAQUEIA

http://www.sobrasa.org/new_sobrasa/wp-content/uploads/2014/01/FIGIIC.gif
http://www.ipolisboa.min-saude.pt/PhotoHandler.ashx?i=4589&mw=800&mh=500

Os segundos pareceram horas.

BRANCO QUE ESTAVA JUNTO (virando a cabeça de um lado para o outro) – ouvi minha mulher me chamar, ela é braba pra cacete, gente, tô indo.

MULHER MIGNON QUE ESTAVA JUNTO – olhalá, meu marido, tô procurando ele faz um tempão (e saiu correndo).

GAROTA DE 17 ANOS (botando a boca em concha – Jaqueline, Jaqueline ...

O pessoal todo virou de costas.

O velhote e a moça continuaram conversando como se nada tivesse acontecido, passou um tempo, chegou a polícia.

POLICIAL – já perguntamos por aí, ninguém viu nada, cês estavam aqui, viram?

VELHOTE (mostrando os braços) – sou safenado, cardíaco, não posso ficar nervoso. Fui eu.

Os dois policiais riram.

POLICIAL (passando a mão na cabeça dele, afagando, ainda rindo) – tá bem, vovô ... Moça?

MOÇA (cantando da música) – Moreno alto, bonito e sensual.

POLÍCIAL (moreno, virando para o outro, negro) – aí, Zé, negão, metido a fortão, vai dar trabalho. Quer que chame reforço?

POLICIAL II – não, não, a gente dá conta (e foi sacando o cassetete).

POLICIAL – Namorado seu? Viu para onde foi, moça?

MOÇA (agarrando o braço do velhote, na maior cara de pau, aponta com o braço) – acho que vocês podem procurar pra lá.

POLICIAL II – E esse aqui?

MOÇA (chorando um pouco) – meu marido, ele deu um tapa na minha cara.

POLICIAL (sacando caderninho) – entendi, namorado estava junto, ex-marido ciumento, quis tirar farinha, levou o dele. Leve seu pai para casa, ele não pode ficar vendo essas coisas.

MOÇA (toda agarradinha com o velho herói, depois que os policiais tinham saído) – onde o senhor mora?

Serra, sábado, 06 de fevereiro de 2016.

GAVA.

Velho Asqueroso

 

Vendo assim de fora a moça teria 27, 28, mas por dentro ela tinha mesmo 32, encontrou na praia o coroa de uns 65 (mas quem olhasse daria assim uns 63, no máximo 64), começaram a conversar, papo vai, papo vem, ela decidiu se apoderar dele, aposentado, consultou no Portal de Transparência (eles entregam tudo, o salário da pessoa até os centavos) do GEES, ele ganhava uma baba, decidiu encostar, uns anos, passa logo, ela seria herdeira da pensão por 30, 40, 50 anos, desde que não casasse, pra que casar?

Com sorte ele estaria impotente, nessa idade, né? Ela conversou com as amigas, que estavam na mesma trilha, por sinal caçando para sobreviver no bem-bom, decidiu investir, juntou-se a ele, em dois anos estavam em situação estável.

Não é que ele não era impotente?

Não, de jeito nenhum, o escroto.

Pelo contrário, o velho asqueroso não arriava a bandeira, nem a tinha a meio pau, era pau inteiro, bandeira tremulando lá no alto do mastro (e que mastro!).

E não era uma vez por semana, não, ela tinha que aguentar várias vezes na semana, teve dia de ser duas vezes, uma vez só foi três, reclamou com as amigas, elas disseram, “poxa, Eliane, é por uma boa causa” e ela, inocentemente, “qual? ”, elas “a sua, claro”. Era mesmo.

Teve um filho, dele mesmo, o velho asqueroso não dava folga, nem tinha tempo de achar um amante, ele estava o tempo todo no pé dela, iam passear inclusive na Europa, construíram uma casa nova, ele mobiliou, saíam de carro, ela chegou aos 38 (ele, 71), outro filho, 40 (73), outro filho, 43 (76), pararam.

Aquele porco estava com quantos, agora?

Fazer as contas, 76, puta que o pariu, essa pôrra não morre!

Daí 47, 48, 51, as dores apareceram.

E ele ali, só fofando, empurrando com força, a pobre da xaninha vivia imprensada e esfolada, sem folga, sem folga, sem folga.

Ela com muito jeitinho foi conversar com a sogra quando da festa de 100 anos dela.

ELIANE – puxa, o Geni (Genivaldo) é muito intenso, né?

SOGRA (rindo muito) – hum, precisa ver o pai dele (apontou). Está vendo lá, 109 e continua querendo, aquele traste. Só pensa naquilo, você vai ter de aguentar muita trolha.

Eliane chegou aos 59, tentou dar um golpe de estado cooptando os filhos (tudo homem, tudo mulherengo, tudo safado), eles eram fãs do pai, bateram a pala para ele, que ria.

GENI – mirei direitinho. “Mulher jovem, bonita e carinhosa faz um homem gemer sem sentir dor”. Combinei com meus amigos, eles também se deram bem.

Nojento.

Serra, domingo, 31 de janeiro de 2016.

GAVA.

Uma Só

 

Carl Sagan no auge da alegria multiplicativa das ogivas nuclear publicou, et alii, com companhia, o livro Inverno Nuclear que gerou o filme O Dia Seguinte. As pessoas deveriam ler e assistir. Provaram que não precisavam de tantas dezenas de milhares que existiram, bastavam mil.

O DIA SEGUINTE AO INVERNO NUCLEAR (eles baixaram a bola e as bombas direitinho)

INVERNO NUCLEAR
O DIA SEGUINTE
http://s3.amazonaws.com/magoo/ABAAABgtsAB-0.jpg
http://www.dvdpt.com/t/the_day_after_o_dia_seguinte.jpg

Tinham acumulado 25 mil ogivas, que dariam para destruir a humanidade toda (obra final, o cristal na ponta da flecha de 4,0 bilhões de anos de montagem-evolução da Vida) VÁRIAS vezes. Não precisavam de 25 mil, só de mil. Depois disso reduziram bastante o estoque.

O TANTO QUE BAIXARAM

http://www.cartacapital.com.br/internacional/cai-o-numero-de-armas-nucleares-mas-aumenta-a-eficiencia-dos-arsenais-7347.html/armas-nucleares.jpg-701.html
http://www.defesanet.com.br/site/upload/news_image/2015/06/26120.jpg
http://www.operamundi.com.br/media/images/ArmamentosNucleares.jpg
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/b/bb/US_and_USSR_nuclear_stockpiles.svg/400px-US_and_USSR_nuclear_stockpiles.svg.png

Agora existem duas mil “prontas para uso”, podem acabar com a Vida (arquea, fungos, plantas, animais e primatas) e a Psicologia (das quatro raças) duas vezes.

Na realidade, não precisam de duas mil para iniciar o processo, podem começar com UMA SÓ, pois os EUA estão fortemente comprometidos com os judeus e Hilary Clinton disse que se mexessem com Israel levariam na cabeça ogivas nucleares.

ENTÃO, contando com isso, quem quisesse fazer poderia colocar SÓ UMA e explodir qualquer lugar de Israel.

CONSEQUÊNCIAS

1.        Israel miraria os árabes ao redor, eles não possuem ogivas, ao passo que Israel tem 80 visíveis (no total de 200 estimadas), mais que uma para cada país muçulmano:

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEirCdbRclZESVJdTkzHdXE0XdWFCE30e2ZSHcab9ouu95RHKPjzFSQI6y5AqpPHL772x-Mtj_a-r2wQSpILuyVcLZICKnLP-p5jHPr2hbvNp47GPiqxAl-yR834fbGqrJGs4YCbSr7vanQ/s1600/israel_pode.jpg
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgK3ccqPOO63ubylzXjWLmfWwIjjbFyBRAWyLkmv-5h_bXgcw0ab6QfcXGqyixm9aa-IwKRE88G33DV8udcEGqmoys6KaPHaENePFkyl8qnyLJZTTItG-RRvnvAqeumr7ZfZNfre3Xrs1A/s1600/Ogivas+chargesAUTO_dalcio%5B1%5D.JPG

2.       O Paquistão tem e, apreensivo, miraria Israel:

http://cdn2.img.br.sputniknews.com/images/304/02/3040271.jpg
http://www.defesanet.com.br/site/upload/news_image/2011/10/4247.jpg

3.      A Índia fica do lado, são inimigos históricos:

http://cdn.ruvr.ru/2012/10/12/1291489152/3highres_00000400914436.jpg
agni_v_missile_range

4.      A China fica encostado (ela não poderia deixar a Coreia do Norte escapar e esta no último suspiro miraria a Coreia do Sul) (ela pode alcançar o mundo inteiro, jogaria imediatamente na Coreia do Sul, em Taiwan, no Japão – os EUA teriam de retaliar, por conta dos tratados mútuos):

http://www.defesanet.com.br/site/upload/news_image/2011/12/4775.jpg
http://p3.trrsf.com.br/image/fget/cf/920/0/images.terra.com/2014/08/01/infoestaticomissilchinaarteterra.jpg

E segue.

Não precisa de mil.

Uma basta.

E agora elas são transportáveis de trem, de caminhão, de automóvel, de bicicleta e a pé.

Essa é a espécie que se chama de “sábia”.

Serra, domingo, 31 de janeiro de 2016.

GAVA.

Um a Mais

 

Amigos se encontraram, aquela emoção. Eu tava junto, fiquei assuntando. Se abraçaram com força, eu também, fiquei reparando a festa.

AMIGUM – Cara! Onde você estava?

DOISAMIGO – fui ao Mato Grosso.

AMIGUM – pescar? Já fiz isso uns três anos atrás. Miguel, lá realmente tem isso do folclore de peixe maior que a gente.

MIGUEL – e eu não sei, Teto? Vi com meus olhos, embora tenha ido para caçar, outros estavam pescando, até me deram uns peixes pra trazer, trouxe, se você quiser tem muito. Cê quer, Raí?

Fiz que não.

TETO – ah, não, agradeço, cansei de tanto comer peixe feito de todo jeito, a mulher cansou de fazer, a empregada tava reclamando, as crianças nem podiam mais ver peixe. Fez o quê, então?

MIGUEL – ah, cacei, poxa, que emoção.

TETO – caçou o quê?

MIGUEL – fixei numa coisa só, queria ver até onde ia: 299 ererês. A gente paga uma grana, mais que comprando, vai para a proteção ambiental.

TETO – 299!!!??? Caramba.

MIGUEL – 299, trouxe três freezers cheios, só eu, os outros também trouxeram vários, mas com peixes misturados, foi só metade de um, daqueles que ganhei.

TETO (que era alto, à toa o apelido não seria) – 299 é coisa, hem? Para encurtar você podia dizer logo 300.

MIGUEL – porquê eu diria 300, se foram 299?

TETO – economia de palavras, 299 são cinco palavras, contado os “e”, artigo de ligação. 300 é uma só.

MIGUEL – mas aí não estaria retratada a verdade, foram 299, não foram 300, tudo contadinho e anotado, vigiado pelos colegas e amigos, ali em cima.

TETO – certo, mas lá, né, aqui ninguém tá sabendo.

MIGUEL – EU ESTOU!

TETO (percebendo a gafe, querendo escapulir) – eu também, re-re-re, mas não é isso, é a economia da fala.

MIGUEL – não estou querendo economizar a fala à custa de mentira.

TETO – queisso, Miguel? Não tou querendo chamar você de mentiroso, de jeito nenhum, longe de mim.

MIGUEL (baixinho, crescendo, empinando) – tá querendo chamar de quê, então?

TETO – de nada, Miguel, arrependi de ter falado.

MIGUEL – é, podia ter ficado calado.

TETO (saindo da postura relaxada e ficando mais alto) – também não é para isso.

MIGUEL (sentindo a barra, mas querendo manter a pose) – você tá me chamando de mentiroso.

TETO (encrespando) – vê se te manca. Nem somos tão conhecidos assim.

MIGUEL (cobrando) – pra me chamar de mentiroso nós somos bastante íntimos, né?

TETO (se aborrecendo) – olhe, sujeito, a coisa também não é assim.

MIGUEL – depois de me chamar de mentiroso agora que me bater?

TETO (um pouco arrependido) – ninguém quer bater em ninguém.

MIGUEL – você faz assim com seus outros amigos? Chama eles de mentirosos?

TETO – não te chamei de mentiroso pôrra nenhuma! Só disse para falar 300 em lugar de 299.

MIGUEL – e quando os outros ficassem sabendo? Aí, hem, aumentou um, depois vão ser quantos? 350? Daqui a 10 anos já vão chegar em 600, despovoou o Mato Grosso.

TETO – vai querer encarar, cacete?

MIGUEL – o quê o quê?

Eu tava junto, quando chegou nesse ponto chamei um guarda que ia passado: ei, seu guarda, dá uma mão aqui.

O guarda veio justo na hora que o Teto deu um tapão no Miguel, ele abaixou, acertou no quepe do policial, ele arrancou o cassetete, me afastei um pouco para sentar no banco, estava meio cansado, fiquei olhando os dois irem para a delegacia, fui atrás para telefonar para a parentada.

Serra, sexta-feira, 15 de janeiro de 2016.

GAVA.

Tutto Buona Gente, Cosa Nostra

 

Tudo gente boa, coisa nossa.

Familiares, é isso.

O sangue fala mais alto.

Coisas assim.

A jornalista foi entrevistar o chefão da Máfia na saída do tribunal.

JORNALISTA (quase colocando o microfone no nariz dele, insolente, impositiva) – o que o senhor diz desse julgamento?

CHEFÃO (tirando um caderninho e anotando com lápis de marceneiro, daqueles grossos: “insolente, impositiva”) – deu o que tinha que dar.

JORNALISTA – e o que tinha que dar?

CHEFÃO – o que deu.

JORNALISTA (irritada) – estamos dando voltas.

CHEFÃO (anotando: “metida a besta, candidata a envelope”) – qual o seu nome, minha filha?

JORNALISTA (esperta, dando o nome de uma prima) – Sueli.

CHEFÃO (olhando o crachá) – não é isso que está no crachá (anotando: “mentirosa, quer escapar, vou colocar Sueli no envelope”). De que família?

JORNALISTA (dando o sobrenome de um colega) – Honório.

CHEFÃO (olhando de novo) – não é isso que está no crachá (anotando: “colocar o nome inteiro dela, senão, não vão saber quem é quando acharem”).

JORNALISTA – vamos voltar ao assunto. O senhor achou certo seu filho ter saído impune de três assassinatos?

CHEFÃO (meditativo) – bem, as pessoas estão nervosas, armadas, são provocadas, deu no que deu.

JORNALISTA (indignada) – mas eram três pessoas comendo na mesa ao lado!

CHEFÃO (anotando: “quer implicar com o menino”) – bom, mas se elas olharam de cara feia ...

JORNALISTA – como, de cara feia? O vídeo do restaurante mostrou, estavam de cabeça baixa.

CHEFÃO – então! Estavam rindo, debochando.

JORNALISTA – eu vi o vídeo, não estavam, não, estavam rindo da piada que contaram.

CHEFÃO – e como meu filho poderia saber? Contaram para ele?

JORNALISTA (ardilosa, indecorosa) – e como é que SETE júris faltaram ao dever?

CHEFÃO (anotando: “ardilosa, indecorosa, quer saber demais”) – sei lá, ué, ninguém tem compromisso hoje em dia! Ficam dando as desculpas mais esfarrapadas.

JORNALISTA (olhando as anotações) – 12 foram atropeladas, quatro se jogaram da ponte, seis tiveram sintomas de envenenamento ...

CHEFÃO (dando de ombros) – eu tenho culpa se as pessoas se jogam na frente dos carros? As pessoas tentam brecar, mas elas se jogam debaixo dos eixos.

JORNALISTA – e as quatro que se jogaram?

CHEFÃO – três eu estava lá, subiram no parapeito ...

JORNALISTA (cruel, debochando, balançando os ombros) – claro, com armas apontadas, os transeuntes contaram.

CHEFÃO (anotando: “cruel, debochada”) – detalhes.

JORNALISTA – e o senhor pagou uma junta de advogados.

CHEFÃO – foi, como quando minha filha arrancou os bagos do namorado namorador dela com os dentes, disseram que foi crueldade, ele estava amarrado, as pessoas disseram aquilo, porém se tratava de meros jogos sexuais, brincadeira de crianças, essa coisa de algemas, nem aprovo, no meu tempo não tinha disso, o máximo que a patroa aguentava eram umas chicotadas e olhe lá.

JORNALISTA (intrusa) – e sua esposa participa disso?

CHEFÃO (anotando: “intrusa”) – hum! Ela falou comigo: “ó, se esse menino ficar preso nunca mais você vai ter aquela comida que gosta tanto”. Vou ficar sem o resto da vida?

Serra, quinta-feira, 04 de fevereiro de 2016.

GAVA.

Tutti Frutti

 

- Mãe, lá na escola estão me chamando de Tutti Frutti.

- Significa todas as frutas, meu filho.

- Por quê?

- Bem, são as misturas brasileiras. Seu trisavô era português, branco, pegou as índias, então uma de suas trisavós era índia. Outro era indiano, nem fiquei sabendo como chegou aqui. São oito. Uma era índia paraguaia, daí seu cabelo fininho e liso. Uma era negra retinta recém chegada da África, cabelo ondulado. Um era inglês, escocês, sei lá. Outro era português também, chegado na cor, pegou uma escrava, mestiça com índio, mandou bala, faz as contas.

- Entendi.

- Dos avôs e avós, um era o Ajax, o Marciano.

- É porisso que quando ficou com raiva fico verdinho, o pessoal me chama de Hulk, pensei que era parente.

- A sua tia-avó era a Mulher Maravilha.

- Mas isso não interfere.

- Certo, mas ela era irmã de sua avó, minha mãe, elas só têm duas filhas, duas filhas cada, uma sou eu.

- Se elas só têm filhas você também é Mulher Maravilha?

- Vai falar isso pro seu pai, aquele inútil.

- Mas se elas só têm filhas, como é que você me teve?

- Tive que renunciar à imortalidade, veja como gosto de você. Outro avô era negociante americano, daí a metideza de nossa família. Lá, toda aquela pureza racial, aqui casou com uma mulher azul lá de Pandora, daí suas orelhas pontudas.

- Aí chegou em mim. Se você é mulher maravilha, papai é homem maravilha?

- Ele que pensa, né? Mamãe bem que me preveniu: minha filha, você vai se arrepender! Não de você, querido, claro que não.

- Mãe, nesse verão vamos para Temiscira ver vovó?

- Se ela mandar nos buscar, sim, claro.

Serra, sexta-feira, 08 de janeiro de 2016.

GAVA.

Tuquinumsei

 

Sou físico pós-doutor e falo cinco línguas.

Um dia me peguei pensando na trajetória da melancia até a minha mesa e fiquei espantadíssimo com a quantidade de passos. Como sou pesquisador, não deixei por menos, fui investigar, perguntei aos granjeiros, eles compravam ou plantavam, tem também o supermercadista, tem os produtores de sementes, tem os plantadores em si, o pessoal do adubo, a compra e a escolha da terra, a análise do solo, o laboratório que faz, enfim, era um mundo.

A MELANCIA É TÃO BOBA

http://www.comoplantar.net/wp-content/uploads/2012/12/cultivo-melancia.jpg
Como plantar.
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O agricultor.
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Transporte.
http://www.viladoartesao.com.br/blog/wp-content/uploads/2013/05/melancia_pinterest.jpg
Pego assim.

Fiquei chocado!

Puta merda, quanta gente no meu apoio.

Nos dias seguintes dei aula com mais gosto.

E aquilo era só a melancia. Fiz uma lista aproximada do que consumo: supermercado, padaria, farmácia, transporte, telefonia, mídia (Rádio, Jornal, Livro, Cinema, TV, Internet, Revista), educação (estou aprendendo outra língua pela Internet, agora oferecem gratuitamente dúzias delas), estrutura governamental, era gigantesca a lista, nos detalhes usei dois cadernos (não muito grandes, daqueles pequenos de arame, porque não dava para esgotar). E os desdobramentos?

Pôrra!

Que que é isso, meu irmão?

Na realidade, perante a coletividade o que faço é quase nada. Claro, é importante, importantíssimo, não dou só aulas, pesquiso, faço parte do CERN, pesquisador agregado, etc.

Fui seguindo: farmácia. Farmacêuticos atendentes, atendentes, farmacêuticos pesquisadores, biólogos, bioquímicos, transportadores, empresas, pesquisa verdadeira e maquiladora para aumentar preços, embalagens, desenho de embalagens, isso estava tomando um tempo filho da puta.

Como dizem os mineiros, tuquinumsei, tudo-que-não-sei é muito, sou um ignorante quase total! Fiquei desconsolado, comprei livros, tentei mostrar para as pessoas, mas elas não queriam saber, se soubessem parariam um pouco de reclamar ou focariam nas coisas verdadeiramente ruins.

Serra, terça-feira, 9 de fevereiro de 2016.

GAVA.