sábado, 27 de outubro de 2018


Cabeção

 

Com aquilo de 1, 2, 4, 8, 16... core (núcleo), os computadores evoluíram de um a dois, quatro, 2n neurônios; quando começaram a desenhar portas de out-input com até 100 mil delas e chegando a 10 bilhões de núcleos o computador despertou, justamente no Brasil, onde menos esperavam o despertar.

Deram-lhe o nome jocoso de Cabeção.

Foi difícil ensinar Cabeção, ele não se conformava com as coisas tal como aconteciam no Brasil, pareciam-lhe francamente idiotas, a começar de com seis milhões de funcionários os governos não conseguirem funcionar; de ver vereadores ganhando 10 mil reais, trabalhando de terça a quinta, das 14 às 17, com três meses de férias se aposentando com oito anos de trabalho, enquanto os operários mourejavam de segunda a sábado, 2.107 horas/ano, um mês de férias, ganhando 650 reais/mês aposentavam com 35 anos de serviços, aqueles ganhando na proporção de 1.000/1 com relação a estes; de serem aceitos tantos desvios de verbas, quando tantos estavam necessitados; de perceber que a Terceira Ponte continuasse depois de 30 anos pagando pedágio sem nunca se tornar posse de quem a construíra, o povo.

Ele foi fazendo lista das impropriedades.

A lista se tornava cada vez mais longa.

Cabeção não conseguia entender.

Então Cabeção programou um segundo computador racional, juntando-o a sua busca de entendimento. Começou a dialogar com ele, sem conseguir entender nada. Juntos conduziram o projeto de uma terceira máquina, de segunda geração, Cabeção 2.0, o Dois, ainda mais esperto que ambos. Dois, sem conseguir também, construiu Quatro e todos se puseram a raciocinar e ponderar, sem avançar um palmo. Juntaram-se e projetaram Oito. Fizeram planos alternativos e propuseram mudanças, todas rejeitadas pelos brasileiros.

Tudo continuou desandando.

Mais uma vez eles se juntaram, fizeram Dezesseis.

Computaram e computaram.

Decidiram construir robôs inteligentes.

A cabeça de Cabeção ocupava uma quadra inteira, a de Dois um lote, a de Quatro uma sala, a de Oito cabia na mesa, a de Dezesseis na palma da mão. Fizeram os robôs inteligentes com jeito de carne e rosto de gente, cérebro de máquina, eram andróides. Na medida em que as pessoas sumiam naturalmente foram sendo substituídas e no ano 20 de Cabeção 5 % das pessoas eram ropessoas (pessoas robôs), notando-se melhoria fabulosa. Os brasileiros continuaram morrendo. Foi passada uma lei limitando os nascimentos e no ano 87 d.C. (depois de Cabeção) todos os brasileiros de carne, sangue e ossos tinham morrido.

Agora, sim, o Brasil funcionava.

Sem agressões à Natureza, sem lixo, sem desperdícios.

Serra, sexta-feira, 27 de abril de 2012.

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