Farmágica
Para Jack Vance,
com reverência, pelo conto Os Milagreiros, no livro Encantamentos
(Os Mundos Mágicos da Fantasia), São Paulo, Melhoramentos, 1990, original de
1985, coletânea de Isaac Asimov.
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O aprendiz de
feiticeiro foi enviado à Farmágica para comprar produtos e voltou quase sem
nada.
O patrão ficou
furioso e foi lá tomar satisfações.
PATRÃO – olhe aqui, o
Riu...
EMPREGADO DA FAMÁRCIA
– por quê ele tem esse nome? O rosto dele é bem deformado, a boca vai de uma
orelha à outra.
PATRÃO – ele riu na
hora errada. Não desvie o assunto.
EMPREGADO – o que o
senhor deseja?
PATRÃO – desejo os
produtos mais simples e nunca tem. Tem azária?
EMPREGADO (paciente)
– eu já disse pro garoto, a azária que tem é diluída, o senhor quer
concentrada, superconcentrada, essa não tem.
PATRÃO –como vou
fazer meus feitiços com azária diluída?
EMPREGADO – não sei
do que o senhor está falando.
PATRÃO – um simples
feitiço de urticária encruada com sucessivos tropeços e quebras de padrões de
qualidade?
EMPREGADO – aí vamos
ficar devendo. Encomendamos mas não chegou. Chega daqui a duas semanas.
PATRÃO – também pedi
um vidro de cagüira em pó...
EMPREGADO – tem, mas
de outra marca, o senhor não quer.
PATRÃO – essa marca
não funciona, já a denunciei no conselho, não dá pra fazer urucubaca com ela.
Pedi uma taboa de ouija e não me mandaram.
EMPREGADO – temos
seis marcas aqui, mas nenhuma servia.
PATRÃO – é lógico,
elas só alcançam o quarto nível dos espíritos comunicantes, preciso do sétimo.
Enquanto o patrão
está olhando para o outro lado, o empregado resmunga a outro que está abaixado
(“ele só pede coisa difícil”).
PATRÃO – falou algo
(o empregado faz que não com a cabeça)? E o livro de cabala?
EMPREGADO – seria
mais certo o senhor comprar em livraria, né?
PATRÃO – é que um dia
vi exposto aqui.
EMPREGADO – certo,
mas era só propaganda.
PATRÃO – milagreiro
em barra, tem?
EMPREGADO – tem, o
menino levou.
PATRÃO – nem reparei,
de tanta raiva. Posso falar com o farmágico encantador? Vocês têm um, ou não
tem?
EMPREGADO – temos, é
o patrão. (Chamando) – Patrão.
FARMÁGICO – oi, bom
dia.
PATRÃO – bom dia.
Olhe só, várias coisas que pedi não tem. Faz três semanas que encomendei mana e
não chegou.
FARMÁGICO (para o
empregado) – pode ir, eu converso com ele. Infelizmente as fontes de mana reduziram
a produção, o governo está cuidando disso.
PATRÃO – não sabia. É
grave?
FARMÁGICO – não,
parece que já estão dando jeito, pra semana chega um pouco, você terá
prioridade.
PATRÃO – parece que
te conheço. Você por acaso não estudou na SULFES?
FARMÁGICO – turma de
83.
PATRÃO – eu sabia, eu
sou da turma de 79, quando estava saindo você estava entrando, foi meu calouro.
Romildo.
FARMÁGICO – Romildo,
que prazer! Lúcio.
ROMILDO – Lúcio, o
ordinário.
LÚCIO – tempos bons.
Caramba Romildo, vou te dar atenção em dobro. Manda lá.
ROMILDO – é que estou
precisando de uma quantidade de caiporite para um programa de calamidade
pública encomendada por um deputado (depois ele se apresenta como salvador).
LÚCIO – caiporite
está supercontrolada, mas como é para você vou dar um jeito.
ROMILDO – obrigado.
Poxa, Lúcio, foi bom te ver. Se você quiser participar de umas seções vá lá em
casa.
LÚCIO – não posso,
juramento, essas coisas.
ROMILDO – até.
Serra, sábado, 21 de
abril de 2012.
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