Superpopulação e a
Frente TC
No livro de Johannes
Brondsted, Os Vikings (História de
uma fascinante civilização), São Paulo, Hemus, s/d, p. 20, o autor diz: “(...)
no começo da Era Viking (lá por 800, JAG), as terras escandinavas eram
superpovoadas (...)”.
Depois de Thomas
Malthus (economista e demógrafo britânico, 1766 a 1834, 68 anos entre datas),
com suas crenças de que não seria possível fazer crescer a produção tão rápido
quando aumentava a população, os neomalthusianos contemporâneos e pós-contemporâneos
sempre usam esse desvio socioeconômico contracionista e débil para colocar suas
posições. De vez em quando volto a essa questão, reargumentando no sentido de
uma racionalidade que pondere os dois lados.
O que seria
superpopulação?
População é “o
conjunto dos habitantes de um território” e super é “excesso, aumento,
sobrecarga”, segundo o Aurélio Século XXI eletrônico; portanto superpopulação é
o excesso, o aumento, a sobrecarga de população.
Não chamamos o mero
crescimento da população de superpopulação. Por exemplo, a taxa de crescimento
populacional no Brasil já foi de 3,2 % na década dos 1970, caiu para 1,9 % na
dos 1980 e na dos 1990 baixou a 1,6 %. Em nenhuma ocasião chamamos a esse
crescimento superpopulação. Então, não é o simples aumento.
Diz-se que existe um
excesso de população na Cidade do México, com seus 16,9 milhões em 1996, mas
ninguém fala nada dos 27,2 milhões no aglomerado de Tóquio, Japão, que comporta
uns 25 % da gente do país, enquanto no México a relação é de uns 18 %. Isso
porque o Japão é superdesenvolvido e o México não. O mesmo se dá com relação à
área metropolitana de Nova Iorque, com 16,3 milhões, uns 6 % dos EUA. Não é a
relação percentual que importa, nem a quantidade de gente ali presente, mas sim
se há demasiados pobres e miseráveis em relação ao todo. Ora, ninguém
investigou quantos nos EUA e no Japão seriam considerados pobres e miseráveis
em relação à presença de ricos e médios-altos, pois o modelo diz que os há como
definição percentual em toda parte em todos os tempos. Se segue que “excesso” é
julgamento de valor, relativamente à potência socioeconômica do país sede.
Isso leva à
sobrecarga, que é carga acima do que o conjunto foi projetado para suportar.
Ninguém afirma que
Portugal, em 2001 com 10 milhões de habitantes, esteja sobrecarregado, embora
se diga isso de Cuba, com 11,2 milhões, ainda que tenham áreas muito
semelhantes (Cuba 110.922 km2 e Portugal 91.985 km2,
densidades habitacionais respectivas de 101 e 109 hab/km2). Cuba,
cercada pelas sanções e bloqueios dos EUA, arrasta-se há 40 anos sem ajuda
quase nenhuma do mundo, enquanto Portugal desde a saída de Salazar (Antônio de
Oliveira, general, 1889 a 1970, 81 anos entre datas, ditador de 1933 até sua
morte) e do regime que se segurou até 1975, especialmente depois de ingressar
na Comunidade Européia, da qual tem recebido maciços investimentos, vem prosperando
aceleradamente.
Não é questão de
gente nem de território, é de saber se o território comporta a gente, pois
Portugal tinha dois milhões de habitantes em 1500, na época dos descobrimentos,
e era julgado superpopuloso, enquanto agora com o mesmo território e cinco
vezes aquela quantidade de gente não o é. Vê-se que depende do DOMÍNIO DA
FRENTE DE CONHECIMENTO (Magia/Arte, Teologia/Religião, Filosofia/Ideologia,
Ciência/Técnica e Matemática) geral, isto é, se ele consegue prover sustento em
todos os sentidos. Especialmente de domínio da frente tecnocientífica, se ela
consegue ou não suprir os elementos de subsistência. De fato, os EUA estão com
290 milhões de habitantes, quando há menos de 100 anos estavam com uns 130
milhões, vá conseguir os dados, e ninguém ousaria dizer que os Estados Unidos
são superpopulosos. O Brasil tem agora 175 milhões, com área continental até
maior, mas se aqueles 120 milhões fossem transferidos para cá já seria
considerado o contingente superpopulacional.
Enfim, a questão da
superpopulação e da explosão demográfica não é racional, é emotiva, é questão
de julgamento de valor dos “superiores” sobre os “inferiores”, ou seja, é
restrição dos que têm sobre os que não têm, negando a estes futuros, ou
pretendendo negar.
A Escandinávia não
era superpopulosa, era deficiente em tecnociência e em Conhecimento geral.
Houve um retardamento interno que não permitia a sustentação de populações que
seriam perfeitamente aceitáveis com tecnociências mais avançadas. Hoje as
populações somadas da Dinamarca, da Suécia, da Finlândia e da Noruega, para não
falar da Estônia, da Letônia e da Lituânia, que lhe são aparentadas, por serem
antigas colônias suas, são várias vezes aquelas de 1200 anos atrás, e não
obstante a Noruega é considerada a nação mais avançada do planeta.
Se for assim, por
quê os geo-historiadores (especialmente os super-ideologizados neomalthusianos)
não são capazes de reconhecer a racionalidade e apelam constantemente à falsa
questão da superpopulação? Certamente porque lhes interessa, pois as pessoas só
são movidas pelos interesses próprios, mesmo quando alegam o altruísmo (que é a
satisfação de ajudar os outros). Que interesse pode ser esse senão a
justificação, a racionalização de algum impulso? “Fui obrigado a ir”, “fiz
contra a vontade”, “fui empurrado pelas circunstâncias”, esse monte de
desculpas.
Nenhum país é
superpopuloso, as elites atrasaram-se internamente na solução dos problemas e
empurram as soluções para fora, culpam as pessoas (indivíduos, famílias, grupos
e empresas) e ambientes (municípios/cidades, estados, nações de mundos) de fora
por seus atrapalhamentos. As elites endógenas bobearam feio, foram incompetentes,
estúpidas, não resolveram os problemas apresentados pela Natureza –deixaram-se
ficar deitadas confortavelmente em berço esplêndido, superexplorando o povo, e
com isso os problemas acumularam-se a ponto de ruptura. O que Malthus estava verdadeiramente
mostrando era um metro da incompetência das elites de todos os tempos e lugares.
Pois hoje já há alimento para todos (está sobrando, dá para todos, mesmo se as
pessoas dos países centrais e dos imitadores da periferia não pararem de se
sobrealimentarem – 56 % de OBESOS nos EUA, quer dizer, gordos mórbidos).
Vitória,
terça-feira, 18 de março de 2003.