domingo, 9 de abril de 2017


O Homem Novo

 

                            Quando eu era adolescente li sobre, e acreditei nisso do “homem novo”, um novo ser humano que deveria nascer em substituição do suposto “homem velho”; quando ele nascesse já não haveria mentiras, nem traições, nem perfídia, nem insídia, nem nada do lado ruim do dicionário – só as coisas boas iriam estar presentes, como a bondade, a generosidade, a confiança, a pureza, tudo isso.

                            Eu acreditei.

                            Marx e outros falavam disso, ou se não eles diretamente, pelo menos se supunha ser a pregação de toda a Esquerda.

                            Nunca vai acontecer de desaparecer a maldade, porque isso está plantado no Desenho de Mundo ou Plano da Criação, como dizem os religiosos. Sempre vão existir preguiçosos, não se pode acabar com a pobreza, porque ela é estatística (classes ABCDE sempre vão haver no Gabão, no Brasil, na Noruega – assim sendo, se um político prometer acabar com a pobreza está desde a origem mentindo), não há jeito de suprimir a imperícia, nem nada do lado bom ou ruim do dicionário.

                            Não vai aparecer nenhum Humano Novo que não traga consigo os vícios do Humano Velho. É sempre novelho ou velhonovo ou como o queiramos chamar, pois sempre o que nasce traz algo do que morre, ou seja, o que nasce não nasce totalmente nem o que morre está desaparecendo de todo.

                            O modelo trouxe essas reflexões, de que não há jeito de sermos pregadores (exceto iludidos, ingênuos, tolos) da pureza. Essa desilusão talvez seja, ela mesma, revolucionária, e possa nos trazer novos e mais úteis pensamentos. Se pelo menos não nos iludimos nem temos intenção de iludir ninguém, nem todos nem sequer um, então pode ser que estejamos no caminho certo.

                            Acho que estamos entrando num tempo novo, isso sim, em que algumas das coisas que afirmávamos poder fazer já sabemos ser inútil tentar. Esse tempo novo traz algo do velho: nós não desistiremos da garra que devemos ter.

                            Vitória, sábado, 29 de novembro de 2003.

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