A Tensão das
Pré-Cidades na Criação das Ruas
Veja que nas
pós-cavernas, antes mesmo das pré-cidades, quando as cavernas cresceram tanto
internamente que borbulharam para fora e foram crescendo com bolhas-quarto
subindo umas sobre as outras (isso terá acontecido durante largo tempo, de modo
que nas primeiras cidades, mesmo em Jericó, deve se apresentar esse tipo de
conformação). Espalharam-se por toda parte, um amontoado tremendo, como uma
colméia, só que desorganizada pelas vontades neandertais (sapiens N) e sapiens
(S sapiens). Em algum momento o emaranhado tornou-se tão denso que a memória
humana não podia mais dar conta, custando muito tempo e esforço chegar à
residência do par fundamental, algo de especialmente difícil para as crianças
pequenas e mais ainda para os homens, porque as mulheres, por natureza, têm
boas memórias.
A solução do
confronto memória x desconforto psicológico foi que em algum momento a memória
foi ultrapassada (sabemos disso porque temos ruas). As ruas não são “naturais”,
são inventadas; são artificiais, separam as pessoas. São antagônicas, adversas,
conflitantes e opõe as pessoas. Essa separação ou disjunção não era entendida,
a defesa da tribo esteve sempre em sua união permanente – e foi isso que nos
tornou humanos e vitoriosos. Separação era índice de loucura e debilitação. O
ostracismo, ser expulso da tribo, equivalia à morte (no Aurélio Século XXI digital: S. m. 1 Em Atenas e outras cidades da Grécia
antiga, desterro temporário determinado em plebiscito contra um cidadão. [Cf.
óstraco.] . 2 P. ext. Afastamento (imposto ou voluntário) das funções
políticas. 3 Exclusão, proscrição, banimento; exílio. 4 Repúdio, repulsa). Era a negação de pertencer ao
grupão, ao CORPO DA TRIBO, e conseqüentemente à sua mente; não comungava mais,
não pertencia ao conjunto dos vivos.
Assim, separar um
grupo de casas de outro grupo deve ter sido horrível, tremendamente destrutivo,
violência inaudita. Como isso aconteceu? Parece tão simples, pois temos ruas em
toda parte e não saberíamos mais viver sem elas - por sua inacreditável
utilidade como passeio de gente e de veículos –, ficando até difícil imaginar
como é que as pessoas desgostaram de sua introdução remota, bem lá para trás
tantos milênios, nas pós-cavernas (pois a sua introdução equivaleu à invenção
das pré-cidades, das quais evoluíram plenamente as cidades, outro nome de
POPULAÇÃO COM RUAS).
Sendo assim, a
pré-cidade, evolução ou adiantamento (no sentido de ser futuro) da pós-caverna,
deve ter gerado uma tensão enorme no espírito de todos, passando-se milênios
antes que as pessoas se acostumassem com aquela novidade não heterodoxa, índice
de hostilidade. Quem foi morar pela primeira vez nas casas-separadas? Quem foi
o aventureiro, o temerário, o enlouquecido, o imponderado, o demente, o corajoso
que se projetou?
Pois somos todos
descendentes desses loucos.
A SEQUÊNCIA DAS LOUCURAS
·
O
primeiro que entrou na caverna;
·
A
primeira (foi mulher? - pois elas inventaram quase tudo nos primórdios) que
criou dentro um separador, o quarto;
·
A
primeira bolha-quarto a sair e se candidatar aos perigos externos;
·
A
primeira rua criada;
·
A
primeira pré-cidade com várias ruas;
·
A
primeira cidade e assim por diante.
Somos filhos e filhas de patentes, de
inventividades, de coragens de sair, de criatividades, de heterodoxias, de
descontentamentos com o passado e a ortodoxia.
E essa heterodoxia, a rua, foi uma das
mais tensas de todas.
Vitória, domingo, 28 de novembro de
2004.
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