quinta-feira, 31 de agosto de 2017


Val-sim

 

E AÍ DANÇARAM TANTA TRANSA QUE A VIZINHANÇA TODA SE ASSANHOU (da música de Chico Buarque, Valsinha)

Valsinha

Chico Buarque / Vinícius de Morais
Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a de um jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto, pra seu grande espanto convidou-a pra dançar
E então ela se fez bonita com há muito tempo não queria ousar
Com seu vestido decotado cheirando a guardado de tanto esperar
Depois o dois deram-se os braços com há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça foram para a praça e começaram a se abraçar
E alí dançaram tanta dança que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade que toda cidade enfim se iluminou
E foram tantos beijos loucos, tantos gritos roucos como não se ouvia mais
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu
Em paz.

Ele deve ter sofrido um acidente qualquer que o fez, no meio da correria para ganhar o uísque nosso de cada dia, parar e pensar: a boca de cena deve ter três telões postos na vertical, um passando a vida cíclica dela, outro a vida corrida dele no escritório ou onde for, tomando condução, o terceiro as brigas dos dois, ele xingando.

Então, nesse dia em especial ele chega em casa e se põe a olhá-la, ela estranha, ele a toma para dançar, vão jantar fora, ao cinema, ao baile, “esticam a noite”, como se diz; e ao voltar transam muito.

Mas no dia seguinte é hora de acordar, há uma lista de contas a pagar passando numa das telas. As outras duas devem mostrar em azul a da mulher e em vermelho a dele desde baixo duas faixas, como se caixas d’água estivessem se enchendo.

Vitória, segunda-feira, 14 de fevereiro de 2005.

Nenhum comentário:

Postar um comentário