quinta-feira, 1 de setembro de 2016


Hipersuperultra


 

Era uma sociedade muito superlativa, hiperlativa, ultralativa.

Tudo era super, hiper, ultra. Até os menores mercadinhos de bairros roscofinhos e superultrahiperdiminutos, verdadeiros cocozinhos, tinham supermercado.

Era espantoso, mesmo.

Tudo era supermercado e hipermercado. Hiper era mais que super, passava bastante. Enquanto super podia ter 200 metros quadrados, hiper chega fácil a mil, talvez dois mil. Ultra era ainda mais, tanto que ninguém vira ainda um ultramercado. Possivelmente ocuparia a área de uma cidade inteira, com umas casinhas em volta. Acho que super era de bairro, hiper de cidade e ultra de estado (ninguém falava ainda em algo que servisse à nação inteira).

Talvez megamercado.

Era uma coletividade com problema de identidade, de autoestima, tanto que usava tanto as línguas estrangeiras (primeiro o francês, depois o inglês, sem falar por rápidas incursões no espanhol pouco valorizado, no latim antigamente e no grego para formar prefixos e sufixos) que se envergonhava da própria língua.

Eles se tinham mesmo em baixa conta, se você desse um real para compra-los ainda receberia troco.

Aí passaram a usar os prefixos gregos e latinos com os aumentativos e os superlativos, por exemplo, megamercadão ou ultramercadão (em projeto para a nação, liderado pelo ultragrupo megapoderoso hiperavançado). Ultramercadíssimo era mais para as vedetes.

Eles se sentiam pequenos, porisso queriam tudo grande.

Superusinas, megaindústrias, hiperestradas de 64 pistas de cada lado, era fogo pensar onde colocar tudo isso. Não satisfeitos de ter dívidas pequenas, assumiram logo hiperdívidas interna e externa ultrapesadíssimas.

Hipermeu Deusíssimo do Megacéu, onde iria parar aquela gente do superpaís da presidanta? Difícil dizer. Os literatos consultados pelos empresários e pelos governos inventavam palavras novas, cada qual querendo ultra-passar, hiper-passar, mega-passar, super-passar o outro.

Vixe Maria! A competição estava acirrada. Aliás, hipercompetição, supercompetição, ultracompetição, megacompetição – hiperíssima ativa, ultríssima (nem se sabia o que isso significava, mas o importante era competir).

A excitação era grande (só menor que a fase áurea do uso do gerúndio ou quando se imaginava que o PT seria diferente).

Como disse Fernando Pessoa: “tudo é grande quando a alma não é pequena”. E, correlativamente, se a alma é pequena nada é grande. Como almas não crescem, isso é um problema.

Serra, sábado, 11 de fevereiro de 2012.

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