FC nas Escolas
Naquela cidade foi instituído esse
programa para alunos de segundo grau, a Ficção Científica nas Escolas, depois
conhecida como Educação Ficcional ou Curso de Criatividade Literária de
Expressão Tecnocientífica, como é oficialmente conhecida.
- Professor, por quê o senhor me deu
dois?
- Bem, senhor Jinxi, afora as falhas
gritantes em sintaxe e gramática, não creio que eu poderia dar mais que isso no
seu trabalho que é, na verdade, bem fraquinho.
- Como assim, professor?
- O senhor conhece o conceito de
“fraco”, senhor Jinxi? O oposto de “forte”?
- Não precisa ironizar, mestre, é
claro que conheço. O que estou perguntando é como o senhor pode achar fraco meu
trabalho?
O professor virou-se para a turma.
- Classe, classe, faz favor... Eu tô
vendo o senhor aí, senhor Ginxa, jogando papéis nas moças, vou diminuir sua
nota de um ponto. E traga seu pai e sua mãe para falar comigo. E os irmãos
Ponxo, podem parar com a palhaçada aí nos fundos, vou adiantar a entrega dos
trabalhos dos três em dois dias.
Vendo-se ameaçada a classe silenciou
instantaneamente.
- Agora que já temos a atenção de
todos, vamos ouvir o senhor Jinxi expor os “méritos” do seu trabalho. Para
começar, senhor Jinxi, como o senhor imaginou esse planeta?
- Bem, professor, era para imaginar,
né, então imaginei, joguei com as possibilidades, procurei ser audacioso.
- Certo, mas um mundo de oxigênio? O
senhor está ciente de que tanto oxigênio na atmosfera pode provocar incêndios?
- Sim, mestre, mas pensei que não...
- Ah, pensou? Então basta pensar, é
tudo mágico assim ou é científico, é técnico? O senhor acredita que devemos
retornar ao domínio mágico-artístico?
Jinxi, vendo-se assim confrontado,
assustou-se.
- Não, professor, de jeito nenhum, que
Nosso Senhor Qua não permita. São exercícios de expansão, mestre, não foi o que
o senhor disse?
- Sim, vamos que sejam, mas pensei nas
conseqüências. O senhor colocou aqui umas coisas chamadas “árvores”. O conceito
me ultrapassa, mas o senhor diz que elas estão pregadas no chão: pregadas,
como?
- São entes enraizados, senhor, as “raízes”
extraem alimento do chão.
- Mas, como? Dei-me ao trabalho de
avançar a hipótese para a existência de milhões dessas criaturas e lembrei-me
daquele excesso de oxigênio carburante tocando fogo com raios em todo aquele
combustível, as “árvores”, com esse fogo se propagando – o senhor está ciente
do perigo disso?
A classe começou a rir, alguns
gargalhavam.
- Quietos!
- Não tinha pensado nisso, professor.
- Ah, não?
- Não, desculpe.
- E os racionais do lugar, como resistiriam
a esse fogo devastador se propagando e incendiando a atmosfera deles?
A classe ficou estarrecida com a
hipótese, alguns vomitaram.
- Nós vivemos na atmosfera,
construímos na atmosfera, extraímos da atmosfera: O SENHOR ESTÁ CIENTE, SENHOR
JINXI, DE QUE TAL FOGO SE PROPAGARIA NA ATMOSFERA?
Jinxi não sabia onde enfiar os
tentáculos, de tão constrangido.
Os colegas voavam de cá para lá dentro
da sala-esfera.
- É, professor, acho que nem dois eu
merecia, tal planeta não pode existir. Como a racionalidade evoluiria num
planeta rochoso? Como iriam construir cidades suficientemente grandes fora da
atmosfera dos gasosos? Desculpe, professor.
- Está bem, vou lhe dar nova chance,
outro trabalho para somar. Quem quer fazer quádrupla com o senhor Jinxi?
Serra, quinta-feira, 05 de julho de
2012.
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