quinta-feira, 6 de julho de 2017


As Mandíbulas Sociais dos Sapiens e os Erros de Desmond

 

                            O zoólogo Desmond Morris nasceu na Inglaterra em 1928 e escreveu O Macaco Nu, publicado no Brasil pela Record em 1976, na língua materna em 1967.  É um livro muito interessante, mas sugere linhas erradas de busca e contém impropriedades lógicas, no meu modo de entender.

                            Na página 28 ele diz: “O físico do primata é bom para trepar, mas não está preparado para corridas de velocidade no solo, nem para proezas de longo fôlego. Trata-se mais de um corpo ágil de acrobata do que da envergadura de um atleta poderoso. As mãos são boas para agarrar, mas não para dilacerar ou para ferir. As mandíbulas e os dentes são razoavelmente fortes, mas nada que se compare com o maciço e esmagador aparelho preênsil dos carnívoros. O assassino ocasional de pequenas presas insignificantes não exige grandes esforços. Na verdade, matar não é um aspecto fundamental no modo de vida dos primatas”.

                            Vi um programa admirável passado num dos canais pagos, no qual os pesquisadores sugeriam que a adição dos cães ao círculo doméstico permitiu aos seres humanos a retração da mandíbula. Isso foi um profundo insight, mas esbarra no Modelo da Caverna, em que as mulheres (fêmeas e pseudomachos) coletoras ficavam na caverna enquanto os homens (machos e pseudofêmeas) saíam para caçar. Elas eram, com crianças, velhos e velhas, estropiados, anões e anãs, 80 a 90 % de todos, enquanto os que iam não passavam de 10 a 20 % no máximo do contingente. Os cachorros iam com os homens: como é que a mandíbula das mulheres retrairiam, se seu grupo era maioria? A tendência é, pelo sexo, a maioria sobrepujar a minoria, exceto quando a mutação for muito boa.

                            Mas a questão aqui não é essa.

                            Desmond Morris e a maioria não vê que os seres humanos puderam enfraquecer seu corpo individual porque seu corpo social foi ampliado. De fato, passamos a PESSOAS (indivíduos, famílias, grupos e empresas) e depois a AMBIENTES (municípios/cidades, estados, nações e mundo). O corpo atrofiou porque, também, a mente foi ampliada desmesuradamente. O corpo dilatou-se nos objetos, além disso; por exemplo, nas lanças, nos arcos-e-flechas, nas armadilhas, nas catapultas. Nenhum macaco ou leão têm canhões, nem foguetes, nem destróieres. Não caçamos mais com as mãos, CAÇAMOS COM A LÍNGUA, que acumula fora de nós. Não a língua biológica, mas a língua-razão, que amplia nossas possibilidades ao infinito. Não caçamos sozinhos, um a um, ou num grupo pequeno. Matamos POR DIA centenas de milhares de reses num país pequeno e milhões de aves. Cultivamos milhões de km2 todos os anos, quando um indivíduo não poderia amanhar, com seus parcos recursos, mais que alguns metros quadrados.

                            As lanças são nossos dentes de dois metros de comprimento, maior que qualquer uma que já houve na Natureza. As ogivas termonucleares são dentes de 10 mil km de comprimento, rasgando não um animal de cada vez mas milhões. Não há nenhum animal, com “maciço e esmagador aparelho preênsil” que se compare nem de longe ao que mesmo os seres humanos mais atrasados de nossos dias podem fazer.

                            Morris, com sua formação de zoólogo ainda vê a Natureza Um, biológica/p.2, enquanto já estamos muito adiantados na Natureza Dois, psicológica/p.3, quase entrando na Natureza Três. Então, erra, como quase todos os outros, igualmente. É que os seres humanos não têm mais mandíbulas biológicas, têm mandíbulas sociais, psicológicas, racionais – têm mandíbulas coletivas.
                            Vitória, domingo, 25 de julho de 2004.

Nenhum comentário:

Postar um comentário