quinta-feira, 7 de dezembro de 2017


Amor e Atração

 

Se você olha atentamente vê que amor não é atração somente, pois nossos pais e mães velhos, barrigudos, pelancudos, doentes continuam bonitos e até mais, quando mais passa o tempo e mais velhos vão ficando, enrugados, decadentes, débeis. Quanto menos se parecem com os retratos da atração mais vamos amando-os. O mesmo se dá com relação às pessoas com as quais vivemos, por exemplo, nossas mulheres (ou para elas os maridos), porque vamos adquirindo respeito e por vezes até proximidade indissolúvel.

Podemos dizer que atração é pela forma e amor pelo conteúdo e que para sexo o que vale é a atração, mas para permanecer o que interessa é a chamada “beleza interior”, na realidade os conteúdos ou conceitos das pessoas, o que elas pensam e como se reportam à vida, como tratam os outros e a nós mesmos, as causas que defendem, isto é, tudo que está além do primeiro instante. Não é senão por essa razão que algumas pessoas podem mimetizar e se fazer passar por alguém amável, que se pode amar, quer dizer, aparentar conteúdos ou conceitos. Travestem-se dessas profundidades inexistentes. Fingem conhecer isso e aquilo, vinhos e peças, raptam aqui e acolá uma frase ou chavão e repetem eruditamente, de memória, como se fosse próprio, desenvolvimento autêntico e sentido.

Atração não é amor. Atração é corpo, corpo é o lado de fora, a pele, a superfície que se vai.

Amor não engana.

Amor não precisa de superfície, pois superfície é embrulho, é enganação, é coisa de crianças, de jovens que não tiveram tempo de formar um conteúdo, uma identidade de propósitos.

Pode-se ensinar atração, mas não se pode imitar o amor, dado que amor é próprio da pessoa, é a doação do dentro, do “é da coisa”, como diria Clarice Lispector. Tem a coisa, o corpo, o que está por fora, e tem o dentro, o é, é mesmo, sem qualquer dúvida. Daí que enquanto puder pairar a dúvida não há amor, há é atração, venda e consumo.

Vitória, quarta-feira, 07 de dezembro de 2005.

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