quinta-feira, 28 de dezembro de 2017


O Imenso Volume de Indiferença

 

Certa vez lá para trás falei do III (índice de importância individual) para avaliar qual seria a potência sintanalisante da presença de qualquer um, conforme sua raridade no mundo nas várias caixas onde estivesse representado. Há quase 200 presidentes a cada quatro ou cinco anos, mas só um Pelé, de forma que este tende a ser mais reconhecido.

Como as pessoas são, por natureza e definição, autocentradas em sua avaliação do universo, constituem por assim dizer uma espécie de mídia (TV, Revista, Jornal, Livro-Editoria, Rádio e Internet) de si. O tempo todo elas parecem estar no centro dos acontecimentos, mas o indivíduo é um só em 6,4 bilhões, 1/6.400.000.000. Não há modo de representar isso, exceto talvez dizendo que se cada um fosse distrito ou bairro ainda assim seria um em dois ou três milhões. Se fosse uma cidade não passaria de um popular num estádio superlotado como o Maracanã com 200 ou 300 mil espectadores, o dobro de sua capacidade.

Ninguém está olhando para nós, exceto os indivíduos próximos, a nossa família e mais algumas, talvez o grupo no qual estejamos, parte da empresa na qual trabalhamos. Em volta de nós está tremenda indiferença quanto à nossa existência. As pessoas reclamam do egoísmo, mas ele não passa de uma defesa angustiada da ausência do próximo, que está cada vez mais distante: as pessoas louvam as estátuas ideais de si como autodefesa. Se não fizessem isso enlouqueceriam quando notassem a verdade: que cada um e todos passam ao largo de si, sem qualquer comunicação. As coisas foram muito bem feitas, porque se o indivíduo notasse sua desimportância enlouqueceria fatalmente. É porisso mesmo que as pessoas se juntam em multidões em estádios, porque parece que estão juntos; é porisso que falam compulsivamente, porque a comunicação parece criar laços; é porisso que vivem e simbolizam o amor, porque ele parece fazer fluir para o outro e vice-versa. Se o indivíduo parasse para ver que todos passam por ele também iludidos desabaria em autocomiseração, que é o que acontece durante as fases de doença, quando a indiferença de todos e cada um se manifesta com agudeza e cessam as notícias de si. Só os doentes, os iluminados e os santos/sábios sabem viver solitariamente. Porisso a doença mortal é uma espécie de iluminação.

Vitória, terça-feira, 17 de janeiro de 2006.

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