quinta-feira, 31 de maio de 2018


As Tropas de Vovô

 

MEUS AVÔS E AVÓS

ANCESTRAL
HOMENS
MULHERES
PARTE DE PAI (José Attílio Gava)
Ângelo Gava
() Costalonga
PARTE DE MÃE (Alvira Perim Gava)
Benevenuto Perim
Estefânia Grilo

Eles viviam em Burarama, distrito de Cachoeiro de Itapemirim, onde minha mãe nasceu; já meu pai é de Matilde, Alfredo Chaves. Os italianos originais subiram o rio de canoa há mais de 100 anos. Meu pai era de 1917 (morreu em 1978), minha mãe de 1924 (morreu em 2003), meus avôs e avós de pelo menos duas ou três décadas antes, não sei as datas.

MATILDE E BURARAMA


Tudo aquilo era bravio, levavam uma semana (segundo as histórias de papai e mamãe) de cavalo pelas trilhas no meio da floresta (é preciso apurar tudo isso, gostaria de poder perguntar agora, mas estão mortos ou morrendo os que sabiam ou sabem) para andar o que hoje por asfalto não passa de 40 km e se faz em uma hora, pois há muitas curvas. As matas eram realmente fechadas há 100 anos, tudo território virgem da Mata Atlântica; veja que em um século pelaram tudo até sobrarem apenas restos aqui e acolá.

Minha mãe contava que por vezes estavam almoçando 30 ou 40 indivíduos na casa grande de vovô Perim lá no que poderíamos chamar Canto dos Perim (como nos Hobbit). A casa grande foi feita toda de madeira, troncos inteiros; ainda está lá e hoje é de minha tia Antônia Perim Friço: chega-se por um pátio que dá para a cozinha, do tamanho de quatro ou cinco dessas de hoje, com uma mesa enorme de tábuas grandes onde eram colocados pães cuja receita está abaixo (o fermento parece exagerado, 150 g, não temos conseguido acertar). A sala, grande, fica à direita disso. Vendo-a de frente um quarto de filho fica à direita, o que era de vovô e vovó (onde nunca entrávamos) mais adiante, com dois quartos à esquerda, uma varandinha na frente.

Lá vinham as tropas com dezenas de mulas levando tecidos, sacos e sacos de trigo, sal, necessidades locais para a parentalha e de volta carregando os produtos de lá, café e coisas assim. Quando os tropeiros chegavam era a maior festa para as mulheres e a criançada – os avôs e avós ficavam felizes vendo todos alegres. Naturalmente eram todos bem tratados, a época era outra, os anfitriões se dedicavam aos recém-chegados.

A RECEITA DO “PÃO CASEIRO DE BURARAMA” (minha mãe ditou, eu dei o nome)

ITEM
QUANTIDADE
Açúcar
Oito colheres de sopa
Banha (ou manteiga ou óleo ou margarina, nos novos tempos)
Uma colher
Fermento
150 gramas
Leite
Um copo e meio de 150 ml
Ovo
Três
Sal
Uma pitada
Trigo
Um quilograma
MODO DE FAZER: desmanche o fermento no leite, ponha os ovos e o açúcar; misture e acrescente o trigo; ponha de parte para crescer.

Pães enormes eram feitos e cortavam-se fatias grandes de dois dedos de largura, lambuzando-se de manteiga, pois nada era regrado. Quando criança, comi disso barbaridades felizes. Eram outros tempos, as mulheres não poupavam esforços, nem os homens, Burarama era um grande parque de diversões para a garotada. As dificuldades eram imensas, mas as dimensões folgazãs também, a soma é zero tanto lá quanto com agoraqui.

O RIO BENEVENTE POR ONDE ELES SUBIRAM


Enfim, eram tempos pacatos, simples, mas tinham seus picos de felicidade e descontração, de encontro e bondade, de confraternização, que valiam por muitos meses; não era o excesso de agora em que temos demais e nem damos mais importância – tudo era concentrado em alguns dias, depois se esgotavam por meses e as pessoas viviam simploriamente.

A alegria não é coisa do futuro, é de todo o tempo e todo o espaço, pois antes de nós eles também souberam viver.

Vitória, domingo, 26 de novembro de 2006.

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