Paiaço
e Mãezona
Meu filho insistiu seis anos em ter um
cachorro em apartamento, pegou logo um labrador que com 12 meses estava com 45
kg; e Pink nose, nariz rosa recessivo, dá um trabalhão de doido. Já contei as
peripécias dele e os custos do amor em cifrões brasileiros, uns 400 por mês com
ração especial hipoalergênica de R$ 350 que dura mês e meio, fora as outras
comidas, remédios somados, vacinas, intervenções (o amigo PACOS e a esposa K
gastaram 3,0 mil com a cadela, para ela morrer no dia seguinte, era muito
nobre) – e TODO DIA tem de tratar, escovar ou coçar, colocar semanalmente
remédio na orelha e nas feridas, colocar o anti-carrapato (teve infestação que
durou dois meses, quase ficamos loucos). Ele pisa nos meus pés (como é que
consegue isso, andando paralelo, é algo a pensar), rodeia por trás (tenho de
virar para ficar certo), a porta do elevador mordeu o rabo dele - que sangrou
na casa. Há os banhos, uma vez só por mês, demora quase uma hora para secar as
três camadas de pelo. Estou com ele há 10,5 anos, o filho foi e o Silas ficou,
já disse quanto sou apaixonado por esses quatro filhos, uma menina e um menino
humanos, uma gata persa e um cachorro labrador. Aprendi à bessa observando
Silas e Yuki, mudei minhas concepções, meu programa exponencializou.
Supondo pela ordem de grandeza os 100 bilhões
estimados nascidos humanos, metade dos quais tendo tido tempo de casar, metade
dos quais tendo tido filhos (redução drástica que conserta as possíveis
superestimativas), ficamos com 12,5 bilhões de pares, vamos arredondar para 10
bilhões de casais com filhos.
Vendo o trabalho que genericamente os filhos
dão (os meus deram relativamente pouco), podemos pensar na pressão exercida
pela Natureza para implantar em nós a necessidade de tê-los. Ninguém investigou
isso, nem os biólogos-p.2, nem os psicólogos-p.3, nem em pensamento nem em
testes de campo. Por que os paiaços e as mãezonas se candidatam a isso? Alguém
vai dizer que foi a necessidade sexual, mas o ser humano já encontrou solução
para muitos problemas, não seria a gravidez potencial que nos deteria, se
tivéssemos empenho. Dizer que foi somente a perpetuação da espécie é coisa de
agora.
Enfim, Deus-i-Natureza colocou as travas, uma
infinidade delas, que nos subjugam e submetem.
Por que N, a moça que trabalha comigo há
treze anos pelo salário mínimo (com facilidades características que dou) e
vantagens, aceita (dois ônibus na vinda, dois na volta) vir limpar a casa,
passar roupa, raramente fazer comida, arrumar os livros quando das mudanças e
tudo que ela faz? Não é só a sobrevivência física, poderíamos ter desenvolvido
os seres humanos que vivessem com bem pouco ou vidas mais longas.
Em resumo, acho que maiormente é isto:
inquietação prospectiva [um cérebro grande demais; nos da Vida geral (arquea,
fungos, plantas, animais e primatas) há menos capacidade de contestação
racional], língua, falar (até mesmo através da mídia toda e das tecnartes),
comunicar percepções (inclusive rir), a razão é a grande armadilha. E são
crianças tolas-espertas, são controláveis (se elas nascessem adultas seriam
rapidamente hostilizadas).
São dependências amplamente não explicadas.
Vitória, sexta-feira, 24 de junho de 2016.
GAVA.
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