terça-feira, 20 de junho de 2017


Bolha de Cristal


 

                            Diremos que a bola de cristal das lendas e da Magia era um programáquina muito especial, como vou sugerir.

                            Enquanto programa era a programação, o programa-em-ação, que fazia aparecer resultados e que estava remotamente ligado a Deus mesmo, pois Adão o havia trazido do planeta Paraíso ou Éden. Ele não precisava de um transmissor remoto, como as TV’s atuais, que tem um emissor que filma no local e remete a imagem por vários caminhos até o receptor na Rede, que o encaixa na grade de programação e o reenvia até os receptores em casa ou onde for. No caso da bola de cristal a programação enviava um módulo até o local desejado, qualquer que fosse na atmosfera, ao nível do solo, dentro d’água, dentro da terra ou no espaço exterior, até um certo limite, criando uma bolha em volta, cada ponto da superfície interna dela emitindo então para a bolha física, que mostrava as imagens em volta. Assim, a bolha de origem, qualquer que fosse seu tamanho, aparecia sempre no volume fixo da bolha material. Era o palantir de O Senhor dos Anéis e a bola de cristal dos mágicos.

                            O objeto em si mesmo era apenas uma bolha exterior que nada significava, porque era apenas a tela (na superfície esférica) do que chegava de longe e era ali depositado pelo dispositivo que estava na base. Era como uma lâmpada, um bulbo cujo significado era perto de zero, pois embora difícil de fabricar era o tubo do televisor. Enquanto o aparelho da base sim, esse era importante, fundamento de tudo, porque mais que reemitir ele era todo o processo que atualmente se divide em três partes: 1) câmara de filmagem, 2) emissora-reemissora, 3) televisor.

                            Mas o mais interessante era que ao se fixar no alvo, caso fosse um racional, reemitia as imagens que estavam fora, o que parece duplicação e é a origem desse fenômeno, o dèjá vu (já vi, do francês), em que a consciência tem certeza de ter vivido aquele momento. De fato, viveu mesmo, pois uma primeira imagem chegou e foi registrada no cérebro. Depois uma segunda imagem entrou, porque aprisionada e refletida pela bolha; e é imagem integral, pois sendo esfera vêm de todos os lados. É possível que esse mecanismo ainda esteja sendo usado pela Grande Nave, razão pela qual algumas pessoas de vez em quando sentem essa impressão funda de já terem vivido o momento. Não viveram, mas como a bolha reemite, parece ser assim. Acho que a GN está fotografando o tempo todo pessoas isoladas.

                            O mecanismo de base em si mesmo é muito compacto e poderoso, uma estação inteira de TV num espaço mínimo, a ponto de a imagem que temos nas lendas ser de bola de cristal, apenas o bulbo em cima. Quem não gostaria de colocar as mãos nela? Se pudesse ser reproduzida seria o TV tridimensional mínimo, num volume minúsculo, podendo acessar o mundo inteiro. Em compensação ninguém estaria mais tranqüilo, dado que a intimidade de todos e cada um seria violentada inapelavelmente. Os governos teriam de achar um modo de coibir as manifestações dos bisbilhoteiros. Já pensou todo mundo olhando todo mundo? E os governos teriam liberdade de xeretar os cidadãos e uns aos outros? Acho que essa coisa faria mais mal que bem.

                            Vitória, terça-feira, 18 de maio de 2004.

Nenhum comentário:

Postar um comentário