A Primeira Lee
Quando eu era jovem,
lá pelos 13 a 15 anos, de 1967 a 1969 virou moda ter uma Lee americana (que,
para nossa decepção, descobrimos depois ser feita lá em São Paulo mesmo – foi
uma das primeiras e mais duras mentiras com que nos deparamos, todos os daquela
idade, um descontentamento profundo), que o Cláudio Colodetti trazia depois de
viagem de uma semana. Papai pagava, mamãe aprontava na máquina de costura e era
uma felicidade poder exibir e ser aceito na comunidade como avançado, um que “tinha
uma Lee”. As calças eram feitas de brim azul, como ainda são, e vinham, o que
vim a saber depois, desde o século retrasado (século XIX, lá por 1850),
derivando de rústicas roupas feitas para mineiros. Outras vieram e foram
compradas depois, mas ninguém esquece a primeira. Depois foi a Lewis, que era
“mais avançada” e mais bonita, com certeza, com uns cortes elegantes, nada
rústicos, da burguesia mais acima.
E teve o primeiro
relógio japonês Casio de fundo azul, compacto, pequeno, que mamãe me deu e provocou
deslumbramento por meses a fio, tendo sido mais adiante roubado na UFES em 1973,
no diretório Dido Fontes, na Engenharia. A primeira bicicleta, uma Monareta, da
Monarck, que encantou anos a fio e depois não sei onde foi parar, uma pena a
sua perda, sem falar no carro que andava e dava voltas e um modelo de avião
movido também a pilhas (meu irmão mais novo ganhou na mesma época um martelo e
deu nele uma cacetada, para grande pesar meu), que meu tio e padrinho Teodomiro
(ele morava no Rio de Janeiro, terra das mais assombrosas novidades), a quem
serei sempre grato, me deu.
E assim por diante
tantas lembranças maravilhosas, não só as minhas, mas as de tanta gente, de um
tempo em que havia poucas novidades e era muito difícil importar e até comprar,
pois o dinheiro era consideravelmente mais escasso, não permitia muitos
arroubos consumistas. Agora, quando tudo é mais fácil, não se dá tanto valor.
Em todo caso, é
preciso fechar o fosso das gerações com a lembrança de coisas gostosas que
permearam os momentos de dor e pânico, dos assombros das doenças, dos
desaparecimentos súbitos de parentes e amigos. É preciso que alguém conte aos
novos, aos que estão vindo, para que eles também recordem e contem aos da
frente.
Vitória,
quarta-feira, 06 de agosto de 2003.
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