sábado, 16 de dezembro de 2017


Biografias dos Desconhecidos

 

Osvaldo Bravin foi motorista do posto de gasolina da família em Linhares e ganhando o equivalente 700 ou 800 ou até 1.000 reais de agora disse um dia que “queria ser pobre só para ver como é que era”. Ele passava pelo menos uma vez por dia – às vezes até sábado e domingo, nas vésperas de alta – entre Linhares e Vitória, onde ficam as bases da Petrobrás e das companhias fornecedora, meu pai desde o início ligado à bandeira da Texaco. Às vezes eu me divertia com as coisas que dizia, morreu gordo de enfarto, creio.

A Internet não responde nada sobre ele, que é um desses do incontável contingente de desconhecidos. Mas agora existe memória nas máquinas para quase tudo, razão pela qual essa quantidade de gente que poderia se interessar estaria encarregada de mapear para o futuro as vidas de todos e cada um dos seres humanos, não só por respeito aos que viveram como porque isso pode ser útil para compor personagens variadíssimos no cinema e em toda parte. Evidentemente a vida é muito mais criativa que a arte, porque conta com o livre-querer ou livre-arbítrio de muito mais gente que o autor-artista isolado.

É como o Soldado Desconhecido, que ninguém conhece, constituindo um gesto genérico para pessoas que foram de carne e osso e não puderam ser identificadas. Todas as criaturas que passaram pela Terra com seu trabalho mereciam um pouquinho mais.

Vitória, sábado, 31 de dezembro de 2005.

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