domingo, 19 de novembro de 2017


Telinha e Telona

 

                            Lá por 1975 quando nosso amigo Sebastião (Tião) Oliveira e eu andávamos juntos bebendo por aí e conversando muito ele me perguntou por que não se gosta muito de assistir as imagens pelo TV, depois chamado de telinha, por comparação com a tela do cinema, que é a telona. Respondi que era por as imagens serem pequenas, diferentes das que estávamos acostumados a ver na realidade do dia a dia. Estava certo, mas incompleto, de modo que agora dou a resposta inteira, que ficou cozinhando no fundo da minha mente essas três décadas.

A RESPOSTA MAIS COMPLETA (como sabemos que é? Só se continuarem a procurar e nunca acharem outra ainda mais geral; e mesmo assim pode não ser – só o UM poderia dizer)

1.       As imagens de cinema são mais proporcionais com os corpos que vemos na realidade, mesmo quando vistas da cadeira mais recuada em relação à tela (primeira parte da resposta);

2.       As imagens de TV financiam a individualidade e o excesso de individualidade que é o individualismo. Deve haver um programáquina capaz de medir tanto na tela do TV quanto na tela do cinema (mesmo se as imagens da TV fossem colocadas em widescreen 16:9 persistiria o fenômeno), veríamos que na do TV há muito mais presença de rostos em primeiro plano, o que levou à expressividade dos artistas brasileiros de TV; sobre-expressividade, para dizer tudo, ou seja, eles tendem a supertrabalhar o rosto, por comparação com atores de cinema, que agem num plano coletivo. Por outra, os artistas de novela tendem ao individualismo, ao passo que os de cinema tendem ao trabalho coletivo (segunda parte da resposta; só para isso demorei 30 anos – veja como sou lerdo). Por fim: não apenas os corpos são maiores na telona como os rostos são menores, por comparação com a totalidade da área.

Em resumo, na telinha os rostos ocupam mais da área e isso certamente terá forçado os artistas daqui a superdesenvolverem a individualidade, por contraste com a disposição coletiva de quadro de visão, de retângulo horizontal da telona no modo paisagem. A projeção widescreen do cinema (16:9 = 1,78, mais retangular), por comparação com a usual do TV (12:9 = 1,33, mais quadrada), leva naturalmente ao desenvolvimento coletivo, ao passo que a do TV faz convergir para o individualismo, cujo excesso fere a gente.

Vitória, agosto de 2005.

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