domingo, 21 de maio de 2017


Mandragorias

 

                            Na página 43 do livro de quadrinhos Calvin e Haroldo (no original americano Calvin & Hobbes, 1993/1995, The Days Are Just Packed), de Bill Watterson, Os Dias Estão Simplesmente Lotados, volume II, São Paulo, Best News, 1995, há uma página sobre uma nave espacial que suga os oceanos da Terra e depois toda a atmosfera. Salvo engano uma tira de Mandrake (criado em 1934 por Lee Falk e excelente tema, tanto que Fellini declarou que seria o mais feliz dos homens se pudesse filmar Flash Gordon e Mandrake) de uns 30 anos antes disso falava da mesma coisa. Evidentemente Watterson não copiou, foi uma crítica àquela coisa simplória de antes.

                            Bem, a superfície da Terra tem 510 milhões de km2, dos quais 2/3 são de águas oceânicas; com cerca de três quilômetros de profundidade média, isso dá 1,02 bilhão de km3 de água. Como a fórmula para volume é 4πR3/3 = 1,02. 109 km3, teremos R de mais de 600 km, ou seja, a nave espacial teria de ser esfera de mais de 1.200 km de diâmetro e ser capaz de levantar do solo contra 1,0 G (uma gravidade) um bilhão de bilhão (mil x mil x mil metros cúbicos num km3, cada m3 de água pesando uma tonelada) de toneladas. Bastaria fazer as contas, mas, é claro, os artistas são “plásticos” e tem “liberdade poética” de serem anticientíficos. Ninguém vai fazer contas nos quadrinhos de uma revista, mas podem recorrer a matemáticos e tecnocientistas. É porisso que Watterson (americano, 1958 -, publicando CH de 1985 a 1996, 11 anos, 14 livros) zomba de algo que, como eu, deve ter lido em sua infância.

                            Embora a plasticidade dos desenhos não se perca com a revisão das antigas estórias em quadrinhos, fica o remorso de os autores delas não terem tido mais cuidado em pesquisar para dar base a elas. Neste sentido uma leitura crítica poderia ser feita como tese de mestrado ou doutorado, apontando justamente essas falhas abusivas, no sentido de tornar os futuros desenhistas mais cuidadosos contra as mandragorias, aquelas afirmações sem o mínimo sentido.

                            Vitória,

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