domingo, 5 de março de 2017


Perigosa Renúncia à Liberdade

 

                            Na seqüência dos pensamentos de nosso amigo APB podemos deduzir que a liberdade a que ele denominou GÁUCHO, que veio como pleito subindo do Rio Grande, ao atingir o Rio de Janeiro encontrou terra fértil, já de si libertária, para a assunção e expressão de um movimento que foi obstaculizado pelo escravagismo trabalhista bandeirante, que mira única e exclusivamente o trabalho, e perante o qual qualquer gênero de diversão é antagônico e daninho.

                            Disso, digo eu, veio progressivamente terem tornado o carnaval de espetacular vetor da liberdade, de explosão incomparável das dores e desacertos de um ano inteiro, numa plastificada exposição turística, toda certinha e comportada, com grupos de quesitos, com notas, com marcações superprecisas da liberdade estatuída, institucionalizada, cooptada, corrompida. Para cúmulo do abuso o símbolo da liberdade se tornou FOTOGRAFÁVEL, comportadinho, com passos milimetricamente estudados, até o cuspe eventual vindo de uma garganta comprada pela mídia e a propaganda.

                            O Rio de Janeiro se tornou o anti-Rio, o emblema da chacota, o agora batalhador incansável das rígidas posições do aço mais duro do coração ou da criação mais empedernida. Continua lindo, mas é a “lindeza” dos puritanos, dos que querem ganhar o Céu perdendo a alma, perdendo aquele bastião da independência. Lá se foi o Rio que nós amávamos, ficando em seu lugar o cover de São Paulo, a caricatura do trabalho escravista paulista. O carioca que imitávamos tornou-se de repente uma imitação chulé do paulistano superapressado que detestávamos.

                            O Rio renunciou à liberdade, vendeu-se, e com o dinheiro arrecadado no leilão de sua honra comprou a prisão que o consome em miséria e desesperança. Abandonou o seu projeto de vida por um projeto alheio que o faz rastejar. Deixou de ser o povo e a nação livre e hospitaleira que venerávamos e ficou sendo o retrato desbotado de São Paulo, uma imitação progressista das alucinações paulistas.

                            Vitória, terça-feira, 29 de julho de 2003.

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