terça-feira, 7 de março de 2017


Lutzemberg e Dyson

 

                            O ecólogo brasileiro Lutzemberg que na década dos 1970 falava de uma tecnociência “popular” em gosto e aplicações, voltada para a democratização, longe do poder das grandes companhias. Era mais uma daquelas utopias da época, que eu contestava sempre, para grandes desgostos dos meus companheiros porra-louca iludidos. Tal como previ, não se deu. Não tivemos acessos aos moinhos de ventos (agora com pás de dezenas e até centenas de metros, eles custam centenas de milhares de dólares), nem aos coletores solares (que foram parar nas mãos dos ricos, ajudando-os a poupar na conta de energia de aquecimento), nem a biomassa (que necessita de geradores e conversões, só podendo ser comprados pelas grandes fazendas), etc. Qualquer análise medíocre teria mostrado a direção e sentido das energias ditas “alternativas”. Tem-se sempre que contar com o cenário das empresas gigantes, grandes, médias, pequenas e micro, todas se aproximação dos novos vetores tecnocientíficos. Se povo, lideranças, profissionais, pesquisadores, estadistas, santos/sábios e iluminados não se preparam INTENSAMENTE para a heterodoxia, ela não ocorrerá.

                            Então, veja esta passagem do livro de Freeman Dyson, O Sol, o Genoma e a Internet (ferramentas das revoluções científicas), São Paulo, Cia. Das Letras, 2001 (original americano de 1999), p. 82/3: “Um sistema de energia solar em funcionamento pode fazer uma enorme diferença para a qualidade de vida num povoado tropical. Trinta ou quarenta watts de corrente contínua são suficientes para acender um par de lâmpadas fluorescentes, um rádio ou uma pequena televisão em preto-e-branco durante várias horas toda noite. Cada cabana de uma aldeia pode ter seu próprio sistema. Nenhum gerador central, nenhuma linha de força, nenhum transformador é necessário. A luz do sol distribui a força igualmente para cada telhado. As crianças podem estudar à noite em casa. A aldeia está em contato com o mundo exterior”.

                            Oh, que bonitinho!

A LISTA DO QUE SERIA BOM PARA NÓS (segundo as consciências dos dominantes centrais):

·        Um par de lâmpadas fluorescentes;

·        Um rádio ou uma pequena televisão em preto-e-branco (durante várias horas por dia, veja que generosidade!);

·        As crianças podem ler e estudar em casa à noite.

Enfim, que coisa mais linda e tocante, A ALDEIA ESTÁ EM CONTATO COM O MUNDO EXTERIOR, que nos diz como ser, como fazer, como pensar, etc. Além da detestável e ultrapassadíssima visão colonial ser chocante depois de cinco ou seis décadas de movimento mundial de liberação, ainda se trata de dizer que as empresas médias, grandes e gigantes agirão aqui como sempre agiram em tudo, com subsídios governamentais aumentando a concentração de renda, vendendo caro aparelhos conversores obsoletos e caducos, Como temos a Psicologia (figuras ou psicanálises, objetivos ou psico-sínteses, produções ou economias, organizações ou sociologias e espaçotempos ou geo-histórias) de QUATRO MUNDOS (primeiro, segundo, terceiro e quarto), segundos os modos políticadministrativos (Escravismo, Feudalismo, Capitalismo, Socialismo, Comunismo e Anarquismo – estando o Capitalismo na terceira onda), o capitalismo de primeiro mundo dita as regras de terceira onda, e ponto final. O resto é diletantismo e floreios de teóricos que não têm um cenário ou visão ou percepção completa de mundo, desejando o miraculoso dessas soluçõesinhas a serem doadas aos antigos colonizados.

É triste.

Tanto internamente Lutzemberg, que não percebeu o alcance geral psicológico das pressões reais contra a disseminação do poder do info-controle ou comunicação, quanto externamente Dyson, que não vê estar a solução Psicológica mundial elevadíssima necessária e suficiente longe da capacidade prateórica humana atual, enveredam o primeiro pela fugaz ambição distributivista brasileira da décadas dos 1970 e o segundo pela doação carregada de remorso burguês de uns trocados desenvolvimentistas (sempre do ponto de vista de fora).

                            Isso nos diz que há inimigos e há amigos, e mesmo os amigos (entre os quais coloco os dois) podem nos oferecer soluções que mais se apresentam como problemas que como definitivos saltos libertadores.

                            Vitória, sábado, 23 de agosto de 2003.

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