terça-feira, 7 de março de 2017


Diretor, Professor de Cinema

 

                            Quando eu era jovem, pouco mais que adolescente, há 30 anos a gente mirava os filmes olhando os diretores e não os atores e atrizes, que hoje vendem as produções. Agora os diretores pouco contam, estão mais ou menos à margem do caminho, como se na classe de aprendizado contassem os alunos e não o mestre. Estranha inversão, como em quase tudo.

                            Claro que o cinegrafista, o continuísta, todos que trabalham no filme estão ensinando e aprendendo – cada filme é por si mesmo uma escola de cinema e como tal deve ser visto, mas o principal é o professor e não os serventes.

                            Quando é que os alunos se tornaram mais importante que o mestre e a escola? É o diretor que diz quando e onde (espaçotempo), quem (figuras ou psicanálises), como (organização ou sociologia), por quê (objetivos ou psico-sínteses) e com quê (produção ou economia) deve ser feito – a partir do roteiro, que o escritor disponibilizou, seja como livro, seja como script pronto. Ele diz quanto deve ser cortado do iceberg para a parte de cima ser vista pelo público. O diretor é como o pintor, o cérebro sentimental e racional que pinta, enquanto a indústria cinematográfica e a propaganda são como a moldura e os artistas como a tela e as tintas. Claro que tudo é necessário, mas se não houver o agente que mistura as tintas e sabe onde colocá-las para produzir os efeitos desejados, teremos apenas coisas paradas ou pinturas bem horríveis ao acaso.

                            Porém, em algum momento houve uma inversão notável, uma subversão completa de valores, de tal modo que o superficial se tornou profundo e o interior deixou de valer. Tal como a coletividade que representa, o Cinema se tornou uma tintura, uma pincelada de exteriores, de plumas e paetês que escondem a profundidade do ser. Ficou pobre, miserável. Embora deva continuar sendo diversão, primordialmente, não precisa ser assim tão roscofe.

                            Já não há observação dos detalhes das pinturas, da potência expressiva da direção, da fineza. É como servir champanhes raríssimas e antigas em festas baratas de estudantes. É, como disse Jesus, servir pérolas a porcos: só um lado é que sabe apreciar o valor. Os porcos vão pensar, como pensam, que são porcarias.

                            Vitória, quinta-feira, 31 de julho de 2003.

Nenhum comentário:

Postar um comentário