Apagando o Passado
O Nilson teve idéia de colocar uma
empresa.
Apagamento do Passado S.A.
Os amigos riram dele pra caramba.
- Pôrra, Nilson, de onde você tirou
essa idéia?
- Cacete, Nilsinho, vô parar de andar
contigo, cara.
Mas Nilson estava firme na idéia,
ninguém conseguia tirar de cabeça. E explicava demoradamente.
- Gente, veja só, a quantidade de puta
que quer casar, todos aqueles artistas de cinema e de TV que cheiravam ou
cheiram ainda e querem passar por santos. Fiscais que roubaram pra caramba e
entraram para as igrejas pentecostais. Juízes mergulhados na merda até o nariz.
Políticos salafrários que assinaram leis canalhas.
O pessoal parou para escutar. Alguns
até se ofereceram para ficar sócios. Robinho se adiantou.
- Nilson, como você vai fazer isso?
Já havia gente espichando o pescoço.
Nilson explicou mais detidamente.
- Bem, vocês se lembram do quê do
passado?
- Como assim?
- De quantas figuras históricas vocês
lembram?
Nilson, que era historiador, foi
discorrendo em detalhes as sordidezes do passado próximo e mais distante. Abriu
o notebook e foi mostrando, as pessoas rodeando-o e ficando de queixo caído com
a quantidade de podridão de gente que passava por pura.
- E isso numa época em que as pessoas
escreviam em papel e não havia PowerPoint, agora nós podemos fazer
de tudo, mentir online, full time. Se a pessoa nos contratar podemos ficar dia
e noite apagando as notícias de toda parte, dia após dia, ano após ano até não
restar nada. Aquilo que Stalin fez, só que em grande escala. Quando mais a
apagar, mais caro.
- Podemos até inventar notícias (os
amigos até já se sentiam parte da empresa que nem existia ainda).
- Isso não! Não vamos nos prostituir,
antes de tudo honestidade na sacanagem. Honra entre bandidos: o que os bandidos
mais prezam é o que não têm.
Nilson foi incisivo, taxativo.
- E como faremos isso?
Os carinhas já estavam até tirando os
cheques na ânsia de participarem da empresa e dos lucros, que imaginavam
imensos, tantos eram os sacanas nos governos e fora deles.
- Bem, vamos contratar hackers.
- Certo, mas do outro lado também há
hackers, os governos os contrata, as grandes empresas, todo mundo.
- Merda, Manel, pensa um pouco: não
vamos aonde não pudermos ir, não é? Toda precaução é pouca; ou recuamos ou
cobramos mais e contratamos os hackers do outro lado.
- Quanto você acha que precisamos para
começar?
- Uns 10 milhões, creio.
- Só?
O pessoal já estava crescendo os
olhos.
- Bem, por enquanto. Quem tem isso?
- Ah, juntos é fácil.
Daniel, que estava calado, se meteu.
- Dou logo metade.
- Calma, gente, temos que contratar os
advogados.
Ricardo também se manifestou.
- Conheço uns filhos de puta ótimos,
aquele que ajudou o goleiro, lembram? Aquele que ajudou o pai e a mãe também é
um corno das minhas relações. E aquele que conseguiu aqueles poucos anos para o
matador da atriz, faz uns 15 anos, tão lembrados?
- Sim, claro (disseram todos). Boa
idéia. Vamos deixar com o Ricardo.
- Contamos pros velhos?
- Nossos pais? Não, deixem os velhotes
de lado. Logo estaremos mais ricos que eles e até eles vão nos contratar para
apagar as patifarias, as amantes, os desvios de dinheiro, os paraísos fiscais.
- E há a contra-informarão também. As
falsas informações plantadas com o intuito de conflitar com a verdade. Os
governos fazem muito isso. A ENRON fez isso para enganar os acionistas. Tá pra
nós. Encobertar é a ordem do dia. Corporações deitam e rolam nisso.
Daí uniram as mãos no alto. E riram
muito. Do jeito que há sacanas no mundo, pensavam eles, logos estaremos podres
de ricos e contrataremos a nós mesmos para mentir e apresentar-nos como
próceres da sociedade, como mecenas amados pelos artistas. Logo receberemos
comendas e seremos comendadores.
Serra, domingo, 25 de julho de 2010.
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